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    Dois sem-terra morrem durante confronto com a PM no Paraná

    JULIANA COISSI
    DE CURITIBA
    LUIZ CARLOS DA CRUZ
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM CASCAVEL

    07/04/2016 18h15

    Dois trabalhadores sem-terra morreram e ao menos outras seis pessoas ficaram feridas durante confronto entre integrantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra) e policiais na tarde desta quinta-feira (7) em um acampamento em Quedas do Iguaçu (447 km de Curitiba).

    A área é alvo de conflito há duas décadas. Os sem-terra montaram acampamento em julho de 2014 na fazenda onde funciona a empresa Araupel, de reflorestamento e beneficiamento em madeira.

    Tanto o MST quanto a Polícia Militar do Paraná usam o termo "emboscada" para explicar o que ocorreu nesta tarde -cada um dizendo-se vítima do outro.

    O tenente-coronel Washington Lee Abe, comandante do 5º Comando Regional Militar, afirmou que a polícia não vai tolerar represálias e está preparada para agir, caso seja necessário.

    "Só pedimos aos inocentes que se encontram lá nesse movimento que se intitula movimento social, que se afastem. A Policia Militar do Paraná não vai se curvar, não vai tolerar nenhum tipo de represália, não vai tolerar nenhum tipo de infração às leis, nós estamos lá exatamente para manter a lei e a ordem", destacou.

    Pela versão da PM, policiais em dois carros da Rotam (Rondas Ostensivas Tático Móvel) com uma brigada de incêndio formada por funcionários da Araupel foram ao local para combater chamas de um incêndio em uma área próxima, quando cerca de 20 sem-terra começaram a disparar contra as equipes, que reagiram ao ataque. Ainda segundo a PM, eram seis policiais (4 da Rotam e 2 da polícia ambiental).

    Na ação, ainda segundo a versão da PM, dois sem-terra morreram e outros seis ficaram feridos. A polícia afirmou que foram recolhidos com o grupo uma pistola 9 milímetros e uma espingarda calibre 12. "O restante do grupo se embrenhou na mata", diz nota da Secretaria da Segurança Pública do Paraná.

    Ainda segundo a nota, a PM enviou ao local equipes para resgatar as vítimas e um helicóptero para remover os feridos, e também foram deslocados PMs para a região a fim de reforçar a segurança. A Polícia Civil abriu inquérito para apurar os fatos.

    Já segundo o MST, foram na verdade os sem-terra os alvos "de uma emboscada da PM com a ajuda de jagunços" –termo que o MST usou para chamar funcionários da Araupel. O MST diz ainda que mais de 20 pessoas ficaram feridas.

    O movimento negou, ainda, que havia pessoas armadas e que os sem-terra tenham provocado a PM para então gerar o confronto.

    O nome dos mortos não foi divulgado. Os corpos já foram retirados e estão em frente à delegacia da cidade. Dois feridos mais graves, baleados, foram levados para Cascavel, e outros dois para o hospital de Quedas do Iguaçu.

    Sobre as críticas do MST, a Secretaria da Segurança Pública diz que a remoção dos feridos foi ágil, com ajuda de helicóptero.

    O conflito na área onde está Araupel divide a cidade de Quedas do Iguaçu, município de cerca de 32 mil habitantes. A empresa emprega 1.200 funcionários.

    Em outubro do ano passado, o comércio fechou as portas e houve uma manifestação com cerca de 10 mil pessoas, segundo a PM, contrários à presença do MST na área.

    Segundo funcionários, havia na época equipes paradas por falta de matéria-prima, já que os trabalhadores não conseguiam chegar até o local para o corte de madeira. A associação comercial da cidade reclamava, na ocasião, de queda nas vendas nas lojas.

    A reportagem procurou a Araupel, mas a assessoria de imprensa afirmou que a empresa não se pronunciaria sobre a versão apresentada pelo MST.

    A AGU (Advocacia-Geral da União) e o Incra (órgão federal que responde pelo processo de reforma agrária) haviam entrado na Justiça com pedido de nulidade dos títulos que a empresa Araupel tem sobre a área. Uma das ações foi julgada procedente pela Justiça Federal, mas a empresa recorreu e a sentença de primeira instância tornou-se sem valor até que recursos sejam julgados em esferas superiores.

    Segundo o advogado da Araupel, Leandro Salomão, no mês passado o TRF-4ª região (Tribunal Regional Federal), órgão de segunda instância, suspendeu os efeitos da primeira decisão, apontando que os títulos são válidos e que a propriedade pertence à Araupel. AGU e Incra, então, recorreram e o último recurso está ainda para ser julgado pelo mesmo TRF, possivelmente até o final deste mês.

    O conflito na área ganhou destaque nacional em março, quando, segundo a Araupel, 1,2 milhão de mudas de pinos foram destruídas por mulheres integrantes do MST, em ato do Dia Internacional da Mulher. O prejuízo estimado pela empresa foi de R$ 5 milhões. A Araupel calcula já ter prejuízos de R$ 35 milhões desde que o acampamento do MST foi montado.

    Sobre o processo judicial em curso, a AGU disse que só poderia se pronunciar nesta sexta-feira (8). Procurado, o Incra não se manifestou.

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