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    o impeachment

    Para Cardozo, relatório contra Dilma é 'peça de absolvição' da presidente

    ISABEL FLECK
    RANIER BRAGON
    RUBENS VALENTE
    DE BRASÍLIA

    11/04/2016 13h29

    O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, responsável pela defesa da presidente Dilma Rousseff disse, horas antes da votação do relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO), que o parecer apresentado pelo parlamentar é a "peça de absolvição histórica da presidente".

    Segundo Cardozo, o que Arantes expressou no relatório é que "o que se quer é o impeachment, pouco importa se eu rasgo a Constituição ou se eu violento a democracia".

    "Por isso eu digo que esse relatório é uma peça de absolvição histórica da presidente. Ele demonstra que não há dolo, ele demonstra que não há crime, demonstra que há apenas a vontade política", disse o advogado-geral da União.

    Cardozo afirmou que gostaria de ter a oratória de um dos principais escritores franceses, Émile Zola (1840-1902), para repetir, no Brasil de 2016, a França do século 19 e defender a presidente com o relatório de Arantes. "Infelizmente não tenho [o talento], então eu defendo", disse, referindo-se ao célebre "J'Accuse!" (eu acuso), carta aberta de Zola contra a condenação do capitão judeu Alfred Dreyfus, acusado de espionagem.

    Segundo Cardozo, o "fio condutor" de todo o relatório do deputado é "na dúvida, que se afaste a presidente". "Na dúvida, deve se investigar. Na dúvida, se apura. Na dúvida, não se abre um processo que tem como resultante uma sanção gravíssima que é afastar um presidente da República legitimamente eleito", disse.

    A votação do relatório, que estava prevista para iniciar às 17h, deve atrasar em mais de duas horas. Antes da votação, todos os 25 líderes de partidos e os dois da minoria e do governo terão dez minutos para discursar –o que levará, pelo menos, quatro horas e meia.

    Além disso, quatro deputados –dois a favor e dois contrários ao impeachment– poderão falar por até cinco minutos antes dos líderes. Esses discursos não tinham começado até as 14h20.

    O presidente da comissão, Rogério Rosso (PSD-DF), confirmou, logo após a fala de Cardozo, que a votação será nominal pelo painel eletrônico. Neste caso, todos votam ao mesmo tempo e a lista aparece no painel, com todos os nomes e votos.

    'GOLPE DE ABRIL'

    Cardozo centrou seus 40 minutos de fala em tentar convencer os deputados que "não há base legal" no relatório de Arantes e em menções contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Segundo o advogado-geral da União, se o processo de impeachment passar, com base no relatório da comissão, será consumado o "golpe de abril de 2016".

    "Se consumado, esse processo não deve ser chamado de impeachment, mas de golpe. O golpe de abril de 2016", afirmou, acrescentando que "a história não perdoa as violências contra a democracia".

    "A história registra e não perdoa autores e coautores de violações do Estado de Direito. A história não perdoa e não perdoará no Brasil que uma senhora presidente da República seja afastada por um relatório que não se sustenta minimamente."

    Cardozo usou o processo de Cunha que corre no Conselho de Ética para afirmar que a defesa da presidente não teve tanta oportunidade de fala na comissão. Segundo ele, o advogado de Cunha sempre que pede, tem a fala concedida no conselho.

    Na última sexta-feira (8), deputados governistas tentaram fazer com que o advogado-geral da União substituto, Fernando Luiz Albuquerque Faria, falasse em nome da defesa –o que causou tumulto. O presidente da Comissão, Rogério Rosso (PSD-DF), disse que Albuquerque Faria poderia permanecer na comissão, mas não falar.

    "Por que o que vale para cassar o mandato de um parlamentar não serve para cassar o mandato da presidente?", questionou Cardozo, em relação ao tempo de defesa. Além de falar por 40 minutos nesta segunda, o advogado-geral da União fez a sustentação oral de sua defesa na última segunda (4) por uma hora e 38 minutos.

    Cardozo falou menos desta vez sobre os argumentos da defesa em relação às denúncias contra a presidente de pedaladas fiscais e de assinatura de decretos não autorizados pelo Congresso em 2015.

    KAKFA

    Após sua fala na comissão, Cardozo disse, em entrevista coletiva na sala da liderança do governo na Câmara, que é "perfeitamente possível" discutir no Judiciário o relatório da Câmara que pede o impeachment da presidente. O ministro afirmou, porém, que a decisão ainda não foi tomada pelo governo.

    "Essa decisão [sobre judicializar o processo] é uma decisão que tem que ser avaliada a cada passo, a cada momento. É perfeitamente possível discutir essa questão no Judiciário. No entanto é uma decisão que terá que ser tomada no momento certo, na hora certa."

    Indagado se a decisão ocorreria antes ou depois da votação do impeachment, que deverá ocorrer no próximo final de semana, o ministro repetiu: "[Será] no momento certo, na hora certa".

    Falando como hipótese, Cardozo disse que uma eventual ação judicial poderia levantar que "houve cerceamento de defesa", dentre outros pontos. "O relator faz considerações que não fazem parte da denúncia, faz imputações sem citar quais são os fatos, fala que a presidente é responsável pela Lava Jato e não diz por quê. Isso ofende o devido processo legal. Como é que alguém, pode exercer uma defesa se não sabe qual é a acusação?", indagou Cardozo.

    O ministro citou o livro "O processo", de Franz Kafka (1883-1924), que narra a história de um homem que tenta entender do que está sendo acusado em um processo judicial.

    "[O impeachment] é um processo kafkiano. O relator transformou esse processo em um processo kafkiano, quando permitiu a juntada da delação premiada de Delcídio do Amaral, quando [os deputados] chamaram os denunciantes para falar sobre tudo, inclusive o que não era recebido pelo Eduardo Cunha", disse o ministro.

    Cardozo disse que a defesa da presidente não intimada a participar dos pronunciamentos de dois dos advogados autores do pedido de impeachment, Miguel Reale Júnior e Janaína Paschoal, que foram ouvidos na comissão de impeachment.

    "A defesa não foi intimada. Eu queria fazer perguntas. Eu tenho que estar presente em todos os atos do processo. Eu teria feito perguntas aos subscritores da denúncias sobre as quais eu queria resposta", disse o ministro.

    CONFUSÃO

    A sessão da comissão foi suspensa por alguns minutos após uma confusão entre parlamentares. Tudo começou após Cardozo dizer que o raciocínio usado por Arantes em seu relatório seria: "não sei se alguém morreu, vamos apurar mais tarde; mas como eu não posso afastar a possibilidade de aquele cidadão ter cometido homicídio, processe-se".

    Parlamentares começaram então a gritar o nome de Celso Daniel, o prefeito petista de Santo André assassinado em 2002.

    Deputados governistas e da oposição se levantaram. Henrique Fontana (PT-RS) teve que ser acalmado pelos colegas após ser provocado por deputados da oposição. "Eu sou centrado mas não vou ser ofendido", disse.

    Parlamentares contrários ao impeachment apresentaram quatro votos em separado –textos que poderiam ser submetidos ao plenário caso o relatório de Arantes seja rejeitado na votação desta segunda (11). Os votos foram apresentados por deputados do PCdoB, do PT, do PSOL e do PDT.

    Contudo, como no caso desta comissão o relatório de Arantes será analisado pelo plenário mesmo se perder a votação, Rosso decidiu registrar os votos apenas como manifestação e não colocá-los em votação caso a maioria seja contrária ao parecer do relator.

    JOVAIR

    Mais cedo na sessão, durante discurso em que rebateu as críticas ao seu relatório, o deputado Jovair Arantes (PTB-GO) ressaltou o caráter político do processo de impeachment e disse não haver mais clima para a continuidade de Dilma Rousseff no poder.

    Segundo o deputado do PTB, a presidente comanda um governo "autoritário", "arrogante" e "falido".

    Jovair reafirmou ver "sérios indícios de cometimento de crime pela presidente da República" e "graves e sistemáticos atentados" cometidos por ela contra a Constituição na liberação de créditos suplementares sem autorização do Congresso e nas chamadas "pedaladas fiscais", que são empréstimos feitos por bancos federais para cobrir despesas do Tesouro Nacional.

    A fala de Jovair foi aplaudida em pé pela oposição, ao final. Representando Dilma, o advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, acompanhou a fala a poucas cadeiras de distância.

    ROSSO

    Ao iniciar a sessão da comissão do impeachment da Câmara, na qual será votado o parecer do relator -favorável ao afastamento de Dilma Rousseff-, o presidente da comissão, deputado Rogério Rosso (PSD-DF) disse que "qualquer previsão de resultado é futurologia".

    "Hoje qualquer previsão de resultado é futurologia. Naquele momento [do impeachment de Fernando Collor] de 1992, era difícil de errar o resultado", disse Rosso.

    Rosso também usou seu discurso de abertura para criticar a instalação de uma cerca na Esplanada dos Ministérios, da frente do Congresso até a rodoviária. Ela servirá para separar manifestantes contrários e a favor do impeachment nos dias de votação.

    O presidente da comissão terminou citando a Oração de São Francisco de Assis, que diz, entre seus versos: "onde houver discórdia, que eu leve a união".

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