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    Lava Jato

    Ação de ex-senador foi corrupção para encobrir corrupção, afirma procurador

    JULIANA COISSI
    DE CURITIBA
    FELIPE BÄCHTOLD
    DE SÃO PAULO

    12/04/2016 13h43

    Integrantes da Lava Jato definiram como uma "corrupção ao quadrado" a ação do ex-senador Gim Argello (PTB-DF), preso preventivamente nesta terça-feira (12) na 28ª fase da Operação Lava Jato, de receber propina de empreiteiras investigadas por desvio de recursos em contratos com a Petrobras para obstruir a comissão no Congresso que investigava justamente a corrupção na estatal.

    "É uma corrupção ao quadrado, uma corrupção qualificada", disse o procurador Athayde Ribeiro da Costa. "Foi de um inusitado atrevimento, porque foi uma corrupção para encobrir corrupção realizada mesmo depois da deflagração da operação Lava Jato", completou ele sobre o ex-senador Jorge Afonso Argello, conhecido como Gim Argello.

    O delator Ricardo Pessoa, dono da UTC Engenharia, contou em delação como negociou o pagamento de propina com Argello para se livrar da convocação para depor na CPI mista da Petrobras, na qual o ex-senador era vice-presidente.

    Diego Padgurschi/Folhapress
    O ex-senador Gim Argello (PTB) é detido por agentes da PF, em Brasília (DF)

    A pedido de Argello, foram R$ 5 milhões pagos pela UTC a quatro partidos que o apoiaram nas eleições de 2014 para o Senado, todos no Distrito Federal: DEM, PR, PMN e PRTB. Outros R$ 350 mil foram depositados pela OAS na conta de uma paróquia em Taguatinga (DF) por indicação do ex-senador, que era frequentador desta igreja.

    Para o Ministério Público Federal, os pagamentos pelas empreiteiras investigadas ocorridos entre julho e outubro de 2014, já com a Lava Jato em curso, "mostram a gravidade e audácia" do senador em cometer os crimes.

    'LAVA JATO SUPRAPARTIDÁRIA'

    Na semana em que o Congresso define pela abertura ou não de processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima aproveitou a entrevista coletiva nesta terça para dizer que a Lava Jato é suprapartidária.

    Segundo ele, a atual fase ao revelar um esquema de propina também com partidos da oposição ao governo federal, como o DEM, mostra que a corrupção atinge a todas as legendas.

    "O exercício do poder, seja por qual partido for, tem gerado corrupção. E essa corrupção ela tem como finalidade suprir caixa de campanhas políticas", disse Lima. "A conclusão que chegamos é que o sistema político partidário do país está apodrecido pelo abuso do poder econômico. Essa é a mensagem que gostaríamos de deixar nesta operação de hoje."

    OUTRAS AÇÕES

    Além da detenção do ex-senador, também foram presos de forma temporária Paulo César Roxo Ramos e Valério Neves Campos, dois assessores ligados ao parlamentar que, pelas investigações, ajudaram a intermediar os pagamentos.

    Também foram conduzidos coercitivamente à delegacia Jorge Argello Junior, filho do ex-parlamentar e quatro executivos e funcionários da empreiteira OAS.

    A delação de Pessoa, da UTC, foi o principal caminho para se investigar o ex-senador. A partir dela, segundo integrantes da Lava Jato, a investigação colheu mensagens de celular, reuniões entre o ex-senador e executivos das empreiteiras investigadas, registros de ligações telefônicas.

    A partir do material reunido, segundo os investigadores, é possível ver, como efeito, por que os pagamentos foram efetivados aos partidos. Assim, Pessoa sequer teve apreciado os requerimentos para que fosse ouvido na CPI da Petrobras no Senado e na CPMI da estatal.

    O envolvimento de Gim Argello já havia sido citado no decorrer de fases anteriores da Lava Jato, mas, segundo o delegado Igor Romário de Paula, que coordena a investigação da Lava Jato na Polícia Federal, as últimas provas justificam a prisão terminaram de ser colhidas há 20 dias.

    Em relação à OAS, os R$ 350 mil depositados na conta bancária da paróquia São Pedro, em Taguatinga, foram identificados graças a mensagens no celular de José Adelmário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, então presidente da empreiteira, em fases anteriores da operação.

    Em mensagem a executivos da OAS de maio de 2014, justamente quando foi instalada a CPI da Petrobras no Senado, Pinheiro pede que seja pago R$ 350 mil à paróquia, apontando que o dinheiro deveria sair do centro de custo "Obra da Renest", uma referência à RNEST, refinaria da Petrobras.

    Nas mensagens, o pagamento é associado a "Alcoólico", possivelmente apelido para Gim Argello, em uma referência com a bebida gim.

    Segundo os investigadores, a princípio não há nenhum outro político além de Argello envolvido na apuração e que teria influenciado no resultado da CPI ou da CPMI.

    O Ministério Público Federal já oficiou a paróquia para que responda o que foi feito com os R$ 350 mil –a suspeita da polícia é que a igreja tenha servido apenas de canal para o destinatário final. Quanto aos quatro partidos, segundo o delegado, como foram doações oficiais de campanha pela UTC, é possível que a direção das legendas não tenham conhecimento do esquema.

    VITÓRIA DE PIRRO

    A nova fase da Lava Jato, Vitória de Pirro, alude à noção clássica de triunfos militares que acabam por exaurir os recursos e derrotar os vencedores.

    O objeto da operação é, segundo a PF, referência à suposta compra de proteção por parte de empreiteiras na CPI da Petrobras de 2014, tornada inútil com a Lava Jato.

    O título surge na semana em que o governo faz de tudo para evitar a abertura do processo de impeachment contra Dilma Rousseff pela Câmara, oferecendo cargos e verbas a aliados.

    O nome vem de Pirro de Épiro (319/318 a.C.-272 a.C), rei grego que dedicou sua carreira a embates sangrentos com Roma -com o desfecho conhecido.

    Segundo a crônica clássica de Plutarco, durante uma de suas campanhas no sul da Itália, Pirro comentou com quem lhe congratulou pelo sucesso em Ásculo (279 a.C): "Outra vitória como esta vai me destruir para sempre".

    28ª fase da Lava Jato - Operação Vitoria de Pirro

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