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    Em diário, FHC diz que Cunha grampeou o BNDES no seu governo

    MARIO CESAR CARVALHO
    DE SÃO PAULO

    14/05/2016 17h53

    Eduardo Anizelli - 25.abr.2016/Folhapress
    Fernando Henrique Cardoso na sede de seu instituto, em SP
    Fernando Henrique Cardoso na sede de seu instituto, em São Paulo

    O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso conta no segundo volume de seus diários que ouviu do empresário que Sérgio Andrade, da Andrade Gutierrez, que foi Eduardo Cunha quem mandou instalar um grampo ilegal na presidência do BNDES em 1998, quando o governo privatizou as empresas de telefonia do país.

    À época, Cunha era só o ex-presidente da Telerj, a companhia telefônica do Rio de janeiro. No último dia 5, o Supremo afastou o deputado da presidência da Câmara e suspendeu o seu mandato.

    O episódio dos grampos foi um dos maiores escândalos do governo FHC e resultou na queda do ministro das Comunicações (Luiz Carlos Mendonça de Barros) e do presidente do BNDES (André Lara Resende).

    Os grampos ilegais apontam que os dois articularam para que o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, o Previ, participasse de um consórcio encabeçado pelo Banco Opportunity, de Daniel Dantas, e por uma empresa da Telecom Itália.

    A manobra deu certo, mas o resultado foi diferente daquele esperado pelo governo: outro consórcio, chamado Telemar, ganhou a área leiloada pela Telebras. Realizado em julho de 1998, o leilão das teles resultou na maior privatização da história brasileira, com arrecadação de R$ 22 bilhões, em valores da época.

    NÃO TEM NADA

    FHC relata que soube dos grampos por meio de Jorge Serpa, tido como um dos maiores lobistas do país na época. O mantra que o governo repetiria sobre os diálogos já aparece nos diários, que devem chegar às livrarias no próxima dia 23: "Não tem nada de comprometedor", anota. "São simplesmente a tentativa do Mendonça e do André de criarem um consórcio para competir na disputa do leilão de privatização".

    Há um senão, como nota o próprio FHC: "Acontece que, por mais ingênuas que sejam as conversas, a depender do contexto em que apareçam, podem dar a sensação de manipulação", escreve. "O pior é que pode aparecer como gato o que é sapato".

    De ingênua as conversas não tinham nada. O tucano não comenta nos diários um dos pontos mais controversos dos grampos: o diálogo em que FHC autoriza Lara Rezende a usar o nome do presidente para pressionar o fundo de pensão a se compor com o Opportunity. A conversa foi revelada pela Folha em 1999.

    FHC trata o caso do grampo como chantagem, sem jamais explicitar quem estaria chantageando quem. O tucano tenta escapar da controvérsia: "Não devemos entrar na discussão do grampo. Grampo é porcaria. Quando se destampa a lata de lixo aparece podridão", escreve em 17 de novembro de 1998.

    LULA ME TELEFONOU

    A sobreposição de dois escândalos, o do grampo e o do dossiê falso que dizia que FHC e outros dirigentes tucanos tinham uma conta nas Ilhas Cayman, fez com que Lula, que perdera duas eleições para ele, o procurasse. "Tive uma grande satisfação. O Lula me telefonou. Eu tinha telefonado para a casa dele uma duas ou três vezes, não o encontrei (...). Tivemos uma conversa simpática. Eu disse que fazia muito tempo que eu queria falar com ele, ele disse que também queria, que tínhamos de dar um basta nessas confusões, que essas investigações têm que ir para o lado certo, que é em cima do [Paulo] Maluf e não em cima de nós".

    O tucano afirma que ficou grato a Lula: "disse que seu comportamento era muito digno".

    A estratégia de tentar minimizar o escândalo dos grampos não vai dar certo, como o então senador, Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA), aponta a FHC: "Algum sangue vai ter de ser vertido", teria dito o baiano em conversa registrada em 21 de novembro de 1998.

    Um dia depois, o ministro das Comunicações e o presidente do BNDES se demitem do cargo. Foram investigados sob suspeita de manipular o leilão, mas a apuração não deu em nada.

    OUTRO LADO

    O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) não quis se pronunciar sobre o relato de FHC: " Não vou comentar loucuras e aleivosias. Daqui a pouco serei acusado de detonar a bomba de Hiroshima".

    Sérgio Andrade, da Andrade Gutierrez, também não quis falar sobre o episódio descrito pelo ex-presidente.

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