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    novo governo

    Habilidoso e onipresente, Jucá foi de Fernando Henrique a Temer

    LEANDRO COLON
    DE BRASÍLIA

    19/05/2016 02h00

    Ueslei Marcelino - 12.mai.16/Reuters
    Senator Romero Juca speaks during a voting session on the impeachment of President Dilma Rousseff in Brasilia, Brazil, May 12, 2016. REUTERS/Ueslei Marcelino ORG XMIT: BSB211
    Romero Jucá fala durante votação do impeachment no Senado

    Romerinho era um estudante aplicado de estatística no curso de economia da Universidade Católica de Pernambuco em meados dos anos 70.

    O professor José Jorge decidiu apostar no aluno e o levou para trabalhar com ele na secretaria de Habitação do governo de Moura Cavalcanti, em Pernambuco.

    "Um professor só chama os bons. Ele era um dos melhores. Estudioso, dinâmico", conta José Jorge.

    Quando o patrão tornou-se secretário de Educação do governo de Marco Maciel, Romerinho virou seu chefe de gabinete.

    De Pernambuco para Brasília, foi rápido. No começo dos anos 80, José Jorge elegeu-se deputado federal e Romerinho virou Romero Jucá.

    O resto é sabido: Jucá foi presidente da Funai, governador de Roraima nomeado por José Sarney, senador e líder no Senado dos governos de Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.

    Ao mesmo tempo, de lá para cá, se viu citado em acusações embaraçosas, de uso de fazenda fantasmas como garantia de empréstimo a recebimento de propinas, todas sempre negadas por ele.

    José Jorge, que fez carreira no antigo PFL, e Jucá se reencontraram como colegas de Senado. "Às vezes o aluno supera o mestre. Ninguém descobre ninguém. O talento aparece", diz o ex-senador, que se aposentou em 2014 como ministro do TCU (Tribunal de Contas da União).

    Natural de Recife, casado pela terceira vez, pai de dois filhos, Jucá, 61, foi tucano e hoje está no PMDB de Roraima. É senador desde 1994.

    Carrega a fama de ser onipresente no Congresso e de ter uma atração pelo governismo, não importa o inquilino do Palácio do Planalto.

    Tem habilidade política, com trânsito entre governo e oposição, facilidade em rabiscar e memorizar números complicados e chatos do Orçamento e disponibilidade para falar com jornalistas a qualquer hora.

    Na madrugada da votação do impeachment no plenário, Jucá passou horas no cafezinho à espera de discursar.

    Sentado à mesa com a reportagem da Folha, rabiscou números do rombo na Previdência num guardanapo e falou do roteiro para tirá-la do buraco. Parecia saber tudo de cabeça. E nem havia como confrontá-lo: ele picotou o papel logo depois.

    ECLÉTICO

    Não à toa, trabalhou para os três últimos presidentes e agora foi requisitado por Michel Temer para ser ministro do Planejamento.

    "Jucá é eclético. Entende de tudo", afirma, sorrindo, seu colega Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN).

    No dia da votação do impeachment na comissão especial, Jucá pediu a assessores a lista completa dos seus membros.

    De posse dela, foi à sessão e cumprimentou um por um (inclusive governistas), e cochichou no ouvido de alguns.

    É onipresente no Congresso, mas também tem sido onipresente nos atuais escândalos. Talvez seja, entre os ministros, o que mais pode causar problemas para Temer.

    Jucá é alvo de inquéritos no STF (Supremo Tribunal Federal) em razão de investigações das operações Lava Jato e Zelotes.

    Em delações premiadas da Lava Jato, empreiteiros da UTC e da Andrade Gutierrez, por exemplo, relataram que Jucá recebeu propina de desvios do setor elétrico.

    Na Zelotes, o ex-servidor da Receita Federal João Gruginski contou que participou de reunião na qual o lobista Alexandre Paes dos Santos, o APS, teria falado sobre o pagamento a Jucá, ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e ao ex-senador -hoje preso pela Lava Jato- Gim Argello (PTB-DF).

    Uma anotação de APS indica que, de R$ 45 milhões, R$ 15 milhões seriam destinados a "RJ" (Romero Jucá). O dinheiro teria ligação com esquema de vendas de medidas provisórias. Jucá nega as acusações, e o próprio APS afirmou que o pagamento aos senadores era um boato.

    Jucá já protagonizou escândalos no passado, como o episódio das fazendas fantasmas dadas, nos anos 90, como garantia de empréstimo milionário do Basa (Banco da Amazônia).

    O caso o desgastou na breve passagem como ministro da Previdência do governo Lula em 2005.

    Três anos depois, a Procuradoria-Geral da República apontou irregularidades, mas pediu arquivamento por causa da prescrição.

    Na terça (17), o ministro do Planejamento afirmou estar "tranquilo" em relação às suspeitas, sobretudo na Lava Jato, e à chance de virar réu.

    Repetiu o argumento de que não teria assumido a presidência do PMDB (no lugar de Temer) se fosse culpado.

    "Se eu tivesse algum medo, se tivesse algum receio, não teria comprado as brigas que eu comprei. Estou muito tranquilo. Espero que o Ministério Público faça todas as investigações", disse.

    Entre as "brigas" está sua articulação para que o PMDB rompesse com Dilma para abraçar o impeachment.

    Temer sabe que deve muito a Jucá pela abertura do processo de afastamento da petista.

    Mas também sabe do desgaste em tê-lo na equipe ministerial e da pressão que sofrerá para demiti-lo se novas denúncias surgirem ou se o ministro virar réu no STF. O presidente interino optou pagar a fatura e correr o risco.

    Carlinhos Müller/Editoria de Arte/Folhapress
    Edição impressa
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