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    Lava Jato

    Medo de grampos leva políticos a esconder celulares e tirar ternos

    DANIELA LIMA
    DE BRASÍLIA

    05/06/2016 02h00

    O ministro abriu a porta do gabinete e, antes mesmo de dar bom dia, perguntou: "O que é que você quer ouvir?". Não esperou a resposta. Colocou jazz para tocar no aparelho de som. Mas a música não importava. Também ligou a TV e se certificou de que as cortinas estavam fechadas.

    "Criminalizaram a conversa em Brasília. Agora, só recebo gente assim." A cena, presenciada pela reportagem da Folha, é um reflexo do estado permanente de tensão em que vivem autoridades de todas as esferas do poder de Brasília, do Executivo, do Legislativo e do Judiciário.

    Diego Padgurschi - 13.abr.16/Folhapress
    "BASTIDORES DO IMPEACHMENT" : Corredor dos plenários na Câmara dos Deputados.
    Corredor dos plenários na Câmara dos Deputados, em Brasília

    A situação se agravou nas últimas semanas, após gravações que o ex-diretor da Transpetro Sérgio Machado fez em conversas com caciques do PMDB virem à tona e causarem a primeira grande crise do governo interino de Michel Temer.

    Telefones celulares, por sinal, ficam do lado de fora do gabinete presidencial. As visitas devem guardar os aparelhos em uma caixinha e só os recebem de volta na saída.

    Na residência oficial do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), palco de algumas das mais rumorosas gravações feitas por Machado, o sentimento de vigilância permanente foi extravasado em forma de piada.

    Reunido com aliados na última semana, Renan soltou um "bem-vindo ao Big Brother Brasil" quando um senador chegou. Amigos dizem que ele está mais desconfiado e opta pelo silêncio diante de questões polêmicas.

    Machado era considerado um amigo por Renan e costumava ir à casa do senador de táxi para não chamar a atenção. Hoje visto como o "homem-bomba do PMDB", o ex-presidente da Transpetro era antes considerado como alguém "da família" pelo ex-presidente José Sarney.

    Senadores comentavam que Sarney está abatido com a "traição" de Machado -ele o conhece desde a infância.

    Segundo aliados, Sarney contou que o antigo afilhado chegava em sua casa dando lições de precaução e afirmando que os celulares, mesmo desligados, podiam ser usados como gravadores.

    Recomendava ao ex-presidente que os aparelhos ficassem longe de onde aconteceriam as reuniões. Daí a surpresa de Sarney ao descobrir ter sido grampeado.

    Agora, na casa de um senador peemedebista, os aparelhos são desligados logo na entrada e colocados dentro de uma almofada do sofá.

    O "protocolo da Lava Jato" também indica que é de bom tom tirar o paletó sempre que possível em reuniões mais fechadas -resultado das especulações de que Machado teria usado um ponto no terno para fazer gravações.

    Os telefones, aliás, têm sido cada vez mais evitados pelas autoridades. Amigos de um ministro do Superior Tribunal de Justiça relatam que ele chegou a pedir a um colega a quem daria carona a gentileza de guardar os celulares no porta-malas do carro.

    O medo de gravações e monitoramento de atividades também mudou o conteúdo das conversas dos políticos.

    Debate-se, por exemplo, se vale a pena desativar o sistema de GPS do celular para evitar o rastreamento das movimentações, além da existência de novos sistemas de escuta acionados à distância.

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