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    OPINIÃO

    Skidmore é leitura obrigatória sobre como os EUA viam o Brasil

    JAMES N. GREEN
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    13/06/2016 02h00

    Lucas Ferraz - 14.set.2012/Folhapress
    WESTERLY, ESTADOS UNIDOS, 14-09-2012: O brasilianista, Thomas Skidmore, durante entrevista exclusiva a Folha de S.Paulo, em um quarto de Asilo, em Westerly (EUA). Skidmore faz balanço de sua carreira e faz um balaço sobre o momento em que o brasil vive. Com Alzheimer em estágio inicial ele vive em quarto de asilo e evita contato com demais hóspdes, além de se manter estudanto sobre o Brasil. (Foto: Lucas Ferraz/Folhapress)
    O brasilianista Thomas Skidmore, durante entrevista à Folha no asilo onde morava nos EUA, em 2012

    Thomas E. Skidmore (1932-2016) representava uma geração de estudiosos dos Estados Unidos que descobriram a América Latina no período após a Revolução Cubana e dedicaram as suas vidas acadêmicas analisando e interpretando as complexidades do continente para um público norte-americano.

    Depois de terminar o doutorado em história sobre Alemanha bismarckiana na Universidade Harvard em 1960, Skidmore recebeu a oferta de uma bolsa para pesquisar um país da América Latina durante três anos.

    Gostava de contar, no seu estilo de brincalhão, que as aulas de espanhol na Harvard começavam cedo, às 8h, e as de português, às 11h. Por isso, ele optou pelo Brasil.

    Comentou uma vez, falando com o apresentador Jô Soares, que ele e seus colegas eram filhos de Fidel Castro, pois a Guerra Fria e as preocupações de Washington sobre possíveis outras revoluções ao sul do rio Grande (na fronteira entre os Estados Unidos e o México) haviam motivado um grande interesse na região.

    Skidmore passou três anos no Brasil durante o governo de João Goulart (1961-1964), tentando entender o processo que levou ao golpe de 1964.

    Resolveu estudar as origens da ditadura, examinando populismo, nacionalismo e política brasileira, o que resultou no clássico "Brasil: De Getúlio a Castello (1930-64)", recentemente reeditado pela Companhia das Letras.

    Esse best-seller tornou-se leitura obrigatória para qualquer pessoa que quisesse entender como os americanos viam o Brasil.

    Skidmore virou o clássico brasilianista. Tinha um talento especial para comentar a situação política com ironia e humor. Suas opiniões sobre fatos contemporâneos sempre continham uma crítica velada ao regime militar.

    Em 1970, juntou-se à campanha de denúncia da tortura e repressão no Brasil, apresentando uma resolução no 2º Congresso da Associação de Estudos Latino-Americanos, em Washington, criticando o apoio norte-americano aos generais no poder.

    Por isso, o Itamaraty vetou uma viagem que ele faria ao Brasil, para dar um curso na Unicamp.

    A sua segunda obra-prima, "Brasil: De Castelo a Tancredo", ofereceu um estudo detalhado sobre a situação política e econômica do país durante o regime autoritário.

    A sua qualidade de analise só foi superada nos últimos anos por uma nova geração de historiadores brasileiros.

    Tive a honra de assumir a cátedra do professor Skidmore na Universidade Brown depois da sua aposentadoria, em 1999.

    Skidmore doou uma coleção fabulosa de 6.000 livros sobre o Brasil à biblioteca universitária. Eu o visitava uma vez por mês para conversar sobre o seu país adotivo. Ele conseguiu acompanhar a política brasileira até a sua morte.

    Brasil: De Getúlio a Castello
    Thomas E. Skidmore
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    No ano passado, escreveu uma série de pequenos retratos sobre figuras brasileiras –de Juscelino Kubitschek a Celso Furtado– que ele conheceu em suas viagens ao Brasil. Estão publicados no site da Skidmore Collection da Universidade Brown.

    Amava o Brasil e tinha uma capacidade única de entender as complexidades políticas, sociais e culturais do país. Deixou um grande legado, que seus alunos e seguidores intelectuais vão continuar. Respeitava profundamente o Brasil e o seu povo, apesar de tudo.

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