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    Análise

    Norma para estatais traz avanços e retrocessos

    SÉRGIO LAZZARINI
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    28/06/2016 02h00

    Em uma tramitação relativamente rápida para os padrões brasileiros, o Senado aprovou a versão final da chamada Lei de Responsabilidade das Estatais, retornando alguns pontos originais que foram modificados pela Câmara dos Deputados.

    O projeto agora segue para sanção do presidente interino, Michel Temer. Afinal, esse projeto ajudará a aumentar a eficiência do sistema estatal brasileiro?

    Vale notar que o que levou as estatais à atual situação não deriva apenas dos monumentais esquemas de corrupção envolvendo essas empresas. Nos últimos anos, as grandes estatais foram usadas como veículos de intervenção direta nos mercados, com consequências desastrosas para a sua capacidade de se financiar e investir. Foi o caso, por exemplo, dos desmandos do governo Dilma na Petrobras para congelar os preços da gasolina.

    Nesse sentido, a nova lei tem o grande mérito de não apenas limitar a indicação de políticos e seus compadres como diretores e conselheiros nas estatais –há agora regras mais duras de qualificação profissional– como também proibir a participação de ministros e secretários de governo. Aqui, o conflito de interesses é muito grande, uma vez que os governos têm a tendência de usar as estatais para colher dividendos políticos. Ao final, quebram as estatais e não resolvem o problema da economia.

    RETROCESSO

    Mas a lei traz também alguns retrocessos. O principal deles é que estabelece um marco jurídico duplo para diversas empresas estatais. Várias delas são sociedades anônimas e até negociadas na Bolsa. Nesse caso, já se submetem ao marco da Lei das Sociedades Anônimas, considerada de boa qualidade pelos participantes do mercado.

    Melhor seria obrigar as estatais a se tornarem sociedades anônimas, o que já automaticamente as enquadraria na lei existente. Essa proposta estava na tramitação inicial no Senado, mas foi combatida por políticos com o esdrúxulo argumento de que seria um primeiro passo para a privatização das estatais.

    A vantagem dessa medida seria alinhar as estatais a uma lei que já vale para empresas controladas por entes públicos ou privados. Por várias vezes, havíamos sugerido que a Lei das Estatais deveria ter um caráter minimalista, atuando de forma muito sinérgica com as Lei das Sociedades Anônimas e apenas clarificando pontos aplicáveis às estatais.

    Com dois marcos paralelos, aumenta a complexidade regulatória das estatais e há o risco de surgirem conflitos de enquadramento legal. Se uma estatal negociada em Bolsa tiver problemas de governança, qual lei deverá ser acionada? Além disso, a lei é apenas uma das várias outras medidas que devem ser tomadas para isolar o sistema estatal da mão política. Por exemplo, é preciso reforçar as agências reguladoras no Brasil para que elas, também, sirvam de anteparo a governos intervencionistas.

    Os problemas, infelizmente, não param por aqui.

    SÉRGIO LAZZARINI é professor titular do Insper, autor de "Capitalismo de Laços" e "Reinventando o Capitalismo de Estado".

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