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    CPI da Merenda em SP tem ameaça de prisão, acareação e contradições

    REYNALDO TUROLLO JR.
    DE SÃO PAULO

    01/09/2016 01h00

    A sessão da CPI da Merenda na Assembleia Legislativa de São Paulo nesta quarta-feira (31) teve acusação de cobrança de propina, ameaça de prisão de testemunha e acareação entre dois ex-funcionários da Coaf, a cooperativa suspeita de fraudar a merenda. Eles deram versões conflitantes sobre o envolvimento de uma servidora da Secretaria Estadual da Educação no caso.

    O primeiro a depor foi o ex-vendedor da Coaf César Bertholino, que transportava dinheiro vivo para pagar "comissões". Ele acusou Jéter Rodrigues Pereira, ex-assessor do presidente da Assembleia, Fernando Capez (PSDB), de ter feito ameaças para receber propina.

    "[Pereira] Ligava, fazia ameaças. Ele ameaçava o senhor Cássio [Chebabi, ex-presidente da Coaf,] que iria cancelar o contrato com o governo do Estado. Ele estava desesperado atrás de dinheiro", disse o ex-vendedor.

    A Coaf tinha dois contratos com o governo Geraldo Alckmin (PSDB) para fornecer suco de laranja às escolas em 2015, num total de R$ 11,4 milhões.

    Bertholino confirmou que Pereira –assessor de Capez até dezembro de 2014– recebeu ao menos um cheque de R$ 50 mil da Coaf. O cheque foi depositado por outro ex-assessor do tucano, José Merivaldo dos Santos, mas voltou por falta de fundos.

    Ainda segundo Bertholino, também Merivaldo –funcionário de carreira da Assembleia que atuou na campanha de Capez em 2014– telefonou para ele cobrando os R$ 50 mil após o cheque voltar.

    O ex-vendedor, porém, atribuiu o esquema exclusivamente a Pereira e ao lobista Marcel Ferreira Julio, que atuou em favor da Coaf junto ao governo do Estado.

    Bertholino disse acreditar que Marcel mentia quando dizia que repassaria propina a políticos como o deputado Capez. Em sua opinião, o dinheiro ficava com o lobista. "Isso é uma convicção minha com base no que o Marcel falava", declarou.

    Ao mesmo tempo, contudo, o ex-vendedor admitiu que o contrato com o governo estadual só vingou após a suposta intermediação de Marcel, no final de 2014.

    MÁFIA DA MERENDA - Sem registro, cooperativa não podia disputar concorrência

    Questionado sobre o teor da delação premiada de outro ex-vendedor da cooperativa, Emerson Girardi, que afirmou ao Ministério Público que viu uma servidora estadual em Bebedouro (SP) cobrando dinheiro dele, Bertholino negou o episódio.

    A servidora citada no acordo de delação é Dione Di Pietro, ex-chefe da coordenadoria à qual está vinculado o setor de compra de merenda da Secretaria Estadual da Educação. Bebedouro é a cidade onde fica a sede da Coaf.

    PRISÃO E ACAREAÇÃO

    Girardi, o outro ex-vendedor da cooperativa, depôs à CPI em seguida. Inicialmente, optou por ficar em silêncio, sob a justificativa de ter fechado acordo de delação, o que exige confidencialidade.

    O deputado Alencar Santana Braga (PT) propôs, então, que a comissão votasse sua prisão –a CPI tem poder de polícia. O argumento era que Girardi prestou depoimento à Corregedoria do Estado em junho, após fechar o acordo de delação, e que, se não falasse à CPI, estaria omitindo informações, o que poderia ser enquadrado no crime de falso testemunho.

    Com a concordância de deputados da base do governo, como Barros Munhoz (PSDB), sobre mandar prendê-lo, Girardi mudou de ideia e decidiu responder a algumas perguntas, desde que elas não o incriminassem.

    O ex-vendedor reafirmou o que disse ao Ministério Público: viu a servidora Dione Di Pietro em Bebedouro conversando com Bertholino. Disse que descarregava produtos na rua quando Dione saiu do escritório da Coaf e foi seguida por Bertholino.

    "Ela saiu do escritório e ele saiu atrás. Foram para um canto. Os dois se aproximaram e conversaram, do outro lado da rua", disse.

    Diferentemente do que declarou em sua delação, porém, Girardi disse que não ouviu o que conversaram. Ao Ministério Público ele havia dito que ouviu Dione dizer que tinha ido a Bebedouro receber dinheiro.

    Os deputados fizeram, então, uma acareação entre os dois ex-vendedores da Coaf. Cada um manteve sua versão. Já há requerimentos para que Dione seja ouvida na CPI.

    BALANÇO

    "Foi um festival de mentiras cuja única conclusão é a seguinte: todos estão mentindo. Achei frustrante [a acareação]. Cada um falou uma coisa e continuou zero a zero. Um dos dois mentiu, ou até os dois mentiram", afirmou Barros Munhoz.

    Na opinião de Alencar Santana Braga, a principal informação obtida na sessão foi a confirmação de que um ex-assessor de Capez cobrou propina e fez ameaças.

    Para o petista, há indícios de que Bertholino tentou proteger servidores públicos e políticos ao isentá-los de envolvimento no escândalo.

    "Tem um jogo combinado, alguns vão pagar o preço. Parece que estão focando no Jéter, no Marcel e no Chebabi para que não se avance. Há contradições com os depoimentos anteriores [prestados à polícia], o que demonstra mentira."

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