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    Lava Jato

    Operadores geriam recursos para família de Sérgio Cabral

    LUCAS VETTORAZZO
    ITALO NOGUEIRA
    DO RIO
    ESTELITA HASS CARAZZAI
    DE CURITIBA

    19/11/2016 02h00

    Divulgação
    O grupo brinda com Cabral; o braço de Cavendish é o primeiro à esquerda, com camisa azul clara
    Grupo brinda com Cabral; à esq., de óculos, Luiz Carlos Bezerra

    Os operadores da propina da quadrilha comandada por Sérgio Cabral, preso na quinta-feira (17), também eram responsáveis, segundo o Ministério Público Federal, pela gestão financeira do ex-governador e seus parentes.

    Carlos Emanuel Miranda e Luiz Carlos Bezerra, também presos na operação Calicute, pagavam contas, geriam investimentos e faziam a declaração de renda de Cabral e de sua mãe, irmão, mulher, ex-mulher, tia e filho.

    Os dois são apontados pelo Ministério Público Federal como os operadores financeiros do esquema de propina liderado por Cabral. Segundo as investigações, cabia à dupla cobrar, recolher e distribuir a propina paga, em dinheiro vivo, por empresas com contratos com o Estado.

    Antes da distribuição, no entanto, a dupla lavava o dinheiro, por meio de contratos fictícios de prestação de serviços. Os dois atuavam uma espécie de contadores informais da família Cabral. A procuradoria, contudo, não inclui todos parentes entre os investigados no caso –apenas a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo.

    Saiu do computador de Miranda as declarações de Imposto de Renda de 2012 a 2016 do ex-governador, de seu irmão Maurício, sua mãe, Magali, e sua ex-mulher Simone.

    No e-mail de Bezerra, foram encontrados boleto bancário da conta de gás da primeira-dama e o comprovante de pagamento da empresa que forneceu cachorro quente à festa de um filho do ex-governador.

    Há ainda registro de depósito de Bezerra à Regina Cabral, tia do governador, no valor de R$ 6.000, em 2015.

    Para o MPF, Miranda era não só o "gestor de propina" do governador, mas a pessoa que controlava os investimentos da família.

    Numa troca de e-mails, ele envia ao filho de Cabral, João Pedro, um extrato financeiro do ex-governador, com R$ 674 mil aplicados em ações e títulos de renda fixa. "Mas ele tem só isso!?", questiona o filho.

    Tanto Miranda quanto Bezerra são amigos de longa data de Sérgio Cabral. Miranda, que é conhecido como "Carlinhos", foi casado com uma prima do ex-governador. Ele também foi sócio do político e "teve sua carreira desenvolvida na íntegra como funcionário público comissionado, por indicação política do amigo", segundo o MPF.

    Já Bezerra, conhecido como "Betegão", é amigo de Cabral dos tempos de juventude. Os dois se conheceram, no fim dos anos 1970, em um time de futebol de praia, em Copacabana. Costumavam sair para balada e paquerar juntos.

    Durante o governo de Cabral, ocupou cargo em comissão de assessor especial da secretaria da Casa Civil. Bezerra aparece, na companhia da mulher, em dois registros da viagem que Cabral fez à Europa com secretários e o empreiteiro Fernando Cavendish, dono da Delta. À época, ocupava o cargo no gabinete do então presidente da Alerj, Paulo Melo (PMDB).

    A dupla criou codinomes para se referir aos beneficiários. "Big" ou "Big Asshole" (grande babaca, numa tradução livre do inglês) eram os apelidos do chefe Cabral.

    A advogada Adriana Ancelmo, mulher de Cabral, era referida como "Dri" ou "Adri". Suzana Neves, ex-mulher, era "Susi". "Magal", a mãe do governador, Magali, e "Cavitch", o apelido do irmão Maurício.

    Bezerra mantinha contato frequente com o governador. Segundo a investigação, ele fez, entre 2011 e 2016, 1.138 ligações para o assessor pessoal de Cabral, Pedro Ramos Miranda.

    Cabia à dupla dar ares de legalidade às propinas ao ex-governador. Bezerra possui uma empresa de consultoria em informática, a CSMB, que nunca contratou um funcionário sequer.

    Miranda abriu a Gralc Consultoria logo depois da primeira eleição de Cabral como governador, em 2006.
    Com um empregado, faturou em média R$ 2 milhões por ano ao longo dos dois mandatos do político. Em 2015, com Cabral fora do governo, o faturamento caiu para R$ 7.508.

    A maior parte das receitas veio de concessionárias de carro do Rio de Janeiro, que pagaram juntas R$ 10 milhões por consultorias. As revendedoras receberam isenções fiscais de Cabral e também figuram entre suas maiores doadoras de campanha.

    "Não há nenhum vestígio de prestação de serviços, o que, a todas as luzes, demonstra que tais pagamentos, objeto de lavagem de dinheiro, tinham por origem fatos criminosos", dizem os procuradores.
    A Folha não conseguiu contato com a defesa de Miranda, que ainda não constituiu advogado nos autos. A defesa de Bezerra não foi localizada.

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