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    Camaleão, Geddel tem trajetória marcada por alianças com adversários

    THAIS BILENKY
    DE SÃO PAULO

    26/11/2016 02h00

    Paffaro/Folhapress

    Até de fiéis escudeiros Geddel Vieira Lima escuta que as comparações com o seu grande desafeto na política, Antônio Carlos Magalhães (1927-2007), são irresistíveis.

    "Ele não gosta, não, mas sempre digo que é o filho mais parecido de ACM, o original", disse Mário Kértesz, ex-prefeito de Salvador e amigo do mais recente ministro de Michel Temer a cair.

    Segundo o penúltimo ministro a deixar o governo, Marcelo Calero (Cultura), a agressividade de Geddel na defesa de seus interesses pessoais o forçou a sair.

    Essa atitude marcou a trajetória do peemedebista, descrito como um "trator" e "autoritário" pelos críticos, e "homem de palavra" e "ativo" pelos aliados.

    Em casos notórios, o peemedebista superou o rancor, se havia algum, e se aproximou de pessoas de quem antes divergia para depois eventualmente se afastar de novo.

    O histórico com ACM (PFL-DEM) é exemplar. O ex-governador da Bahia e ex-presidente do Senado era próximo do pai de Geddel, o ex-deputado Afrisio Vieira Lima, morto no início deste ano.

    Briguentos ambos, eles se defendiam na política, mas se enfrentavam em particular, inclusive fisicamente, segundo contou Kértesz.

    Geddel nunca se deu bem com ACM, mas tinha amizade com o filho dele, Luís Eduardo Magalhães. Quando o então deputado morreu, em 1998, a relação degringolou.

    Entre outras ofensas, ACM chegou a chamar Geddel de "pigmeu que posa de gigante" e foi tachado por ele de "morto" e "sem alma".

    Em um vídeo que intitulou "Geddel vai às compras", ACM o acusou de enriquecimento ilícito. Nunca se provou irregularidade, mas de fato o ex-deputado expandiu o patrimônio durante a passagem pela Câmara dos Deputados.

    Em 1994, aos 34 anos, no primeiro mandato, ele declarou possuir uma linha telefônica, 120 hectares de terra na Bahia, uma Parati 89 e o título do Iate Clube.

    Em 2010, aos 51 e no quinto mandato, declarou o título do Iate Clube no valor de R$ 4.000, 8.900 hectares de terra e outros bens que somavam R$ 3,8 milhões.

    NOVOS TEMPOS

    Em 2006, ao apoiar o petista Jaques Wagner ao governo da Bahia, Geddel foi fundamental para acabar com décadas de carlismo. Seis anos depois, porém, ele retornou ao clã.

    Em 2012, Kértesz, então no PMDB, perdeu a disputa pela Prefeitura de Salvador a ACM Neto (DEM). No segundo turno, Geddel apoiou o herdeiro de seu rival.

    "As diferenças políticas no Brasil não são capitanias hereditárias", justificou o peemedebista à época. "Ninguém me patrulha!"

    ACM Neto disse que as circunstâncias tinham mudado e, "além do mais, muitos dos antigos amigos do meu avô estão com o PT".

    Com o passado para trás, a aliança se mostrou profícua e, na eleição de 2016, Geddel emplacou o vice na chapa de Neto, que se reelegeu.

    "Esse papo de fisiologismo é besteira. Geddel tem imensa capacidade política, experiência. O gênio dele que às vezes pode atrapalhar", disse Kértesz.

    "Lamento profundamente o presidente ter perdido um excelente articulador politico e bom conselheiro."

    Também com o PT de Wagner, a relação foi e voltou, conforme o vento político.

    Em 2001, Geddel brigou com meia Brasília em defesa da candidatura de José Serra (PSDB) à Presidência.

    Após a derrota do tucano, ele fez oposição ao então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no primeiro mandato. Com a reeleição, contudo, a maré virou, e Geddel se tornou ministro da Integração Nacional.

    O namoro acabou quando o peemedebista deixou a Esplanada para disputar o governo da Bahia, em 2010, com Wagner, que o havia indicado ao cargo.

    O petista, então, também o comparou a ACM.

    "São métodos que se assemelham muito [com o carlismo]. É uma forma de política mais do constrangimento", disse o petista, durante a campanha.

    Geddel rebateu com uma caracterização frequentemente usada para descrever ele próprio. "Wagner é um camaleão, que vai mudando de posição de acordo com suas conveniências", criticou.

    O peemedebista acabou perdendo a eleição, mas não o acesso ao Plano Piloto.

    Dilma Rousseff, ao se eleger, o nomeou vice-presidente da Caixa Econômica Federal. Geddel se aquietaria no cargo por dois anos.

    Em 2013, após comunicar que sairia, ele não aguentou esperar Dilma exonerá-lo e a cobrou em uma rede social.

    Desincompatibilizado, disputou uma vaga no Senado, mas perdeu para o candidato apoiado pelo PT.

    Em 2015, Geddel seria um dos primeiros peemedebistas a defender o desembarque do partido do governo Dilma. No ano seguinte, tornou-se homem-forte do presidente, fase que se encerrou prematuramente nesta sexta (25).

    O episódio com Calero "expressa uma forma de fazer política antiga, da interferência do interesse privado", afirmou a senadora baiana Lidice da Mata (PSB). "O Brasil está passando esse tipo de comportamento a limpo."

    A conferir se até 2018 Geddel terá conseguido viabilizar sua dobradinha com o PSDB para disputar o Senado.

    AS IDAS E VINDAS DE GEDDEL
    Ministro passou de aliado a desafeto de repetidos personagens ao longo de sua trajetória política

    CLÃ MAGALHÃES
    1. Pai de Geddel, o ex-deputado Afrísio Vieira Lima era próximo de ACM, embora tenham tido brigas até mesmo físicas, segundo relatos
    2. Seus filhos Geddel e Luís Eduardo Magalhães, colegas na Câmara dos Deputados, eram aliados
    3. Após a morte de Luís Eduardo, em 1998, ACM e Geddel rompem e as trocas de ofensas públicas se estendem por anos
    4. Em 2012, Geddel apoia ACM Neto no segundo turno da eleição municipal em Salvador
    5. Em 2016, Geddel emplaca o vice-prefeito na chapa de ACM Neto, reeleito

    PT
    1. Crítico ferrenho de Lula no primeiro mandato, Geddel mudou de lado e em 2007 foi nomeado ministro da Integração Nacional pelo petista
    2. Em 2010, deixa a Esplanada e disputa com o petista Jaques Wagner o governo da Bahia
    3. Derrotado na eleição, ele retoma com o PT, nomeado por Dilma Rousseff vice-presidente da Caixa Econômica Federal, em 2011
    4. Em 2013, porém, movimentando-se para a eleição na Bahia, ele pede demissão do governo Dilma pelo Twitter
    5. Em 2015, foi um dos primeiros peemedebistas a defender o desembarque do partido da gestão petista

    PSDB
    1. Em 1999, segundo "O Globo", Geddel disse que FHC "ou é um frouxou ou um bosta". Ele negou
    2. Às vésperas da eleição presidencial de 2002, Geddel chamou José Serra de "mulher de malandro, que gosta de apanhar", pelo fato de o então candidato ter ido a ato de ACM
    3. No ano eleitoral, Geddel se destaca como um dos principais apoiadores do PMDB a Serra
    4. Naquele ano, em nome da candidatura tucana, Geddel enfrenta o ex-presidente Itamar Franco, então seu correligionário, que queria disputar o Planalto pelo PMDB e ouve que era "vendedor de sigla"

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