• Poder

    Wednesday, 01-May-2024 05:16:17 -03

    Fragilizado, dom Paulo discursou com dificuldade em evento em outubro

    ANGELA BOLDRINI
    DE SÃO PAULO

    15/12/2016 08h53

    "É a hora de eu dizer a palavra mais querida do povo brasileiro: 'obrigado'." Assim dom Paulo Evaristo Arns, cardeal e arcebispo emérito de São Paulo, encerrou discurso público, em 24 de outubro deste ano, no teatro Tucarena, em Perdizes.

    Foi internado pouco mais de um mês depois, em 28 de novembro, com broncopneumonia, e morreu nesta quarta-feira (14), aos 95 anos.

    O ícone progressista da Igreja Católica, conhecido por afrontar a ditadura militar e lutar contra a tortura que ocorria nos porões da repressão, apareceu bastante fragilizado pela idade.

    Apesar de recluso nos últimos anos de vida, decidiu tomar parte das comemorações de seus 95 anos, completados em 14 de setembro. Em 2011, aos 90 anos, não quis participar dos festejos de aniversário, preferindo não deixar o retiro em Taboão da Serra.

    À época, dizia estar "preparado" para a morte: "Não tenho medo, mas também não tenho pressa."

    Cinco anos depois, trêmulo, precisou do amparo dos outros membros da mesa para se manter de pé. Fez uma fala curta e, na saída, foi guiado até a porta do auditório.

    Antes, recebeu homenagens de coletivos de esquerda. Da Democracia Corinthiana o religioso, grande torcedor do Corinthians, ganhou uma camiseta. Também posou para fotos com um boné do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra) e acenava constantemente para a plateia.

    Não tratou, como outros componentes da mesa, da crise política atual, num evento marcado por gritos de "fora, Temer". Em vez disso, lembrou o líder operário Santo Dias, cujo assassinato —foi morto pela polícia enquanto participava de uma greve de metalúrgicos, em 1979— completou 37 anos em 30 de outubro.

    "Há anos eu falei com o papa mais célebre do nosso tempo, Paulo 6º [1897-1978], e disse: 'O senhor pode e deve canonizar alguém'. Ele respondeu: 'Quem?'. E eu disse: 'Santo Dias'", afirmou o religioso. "E ele, o mais sábio papa dos tempos modernos, respondeu: 'Não dá, porque ele já é santo, já funciona santo."

    "E a mulher dele diz que ele é santo, o que é um milagre", brincou. Ana Dias, viúva de Santo, estava na plateia, bem como Clarice Herzog, viúva do jornalista Vladimir Herzog, também morto pela ditadura, em homenagem de quem dom Paulo celebrou culto ecumênico na Catedral da Sé, em 1975, que se tornou o maior ato público contra o regime desde 1964, reunindo 8.000 pessoas.

    É na mesma catedral que o religioso está sendo velado e onde seu corpo será enterrado, na sexta-feira (16).

    Dom Paulo participou ainda de uma última agenda pública, um dia antes de sua internação derradeira: celebrou em 27 de novembro uma missa na Catedral da Sé, por ocasião de seus 71 anos de ordenação sacerdotal.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024