O ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) fez 24 viagens internacionais de turismo durante o mandato, que corresponderam a 126 dias fora do país.

Somados aos compromissos oficiais no exterior, o peemedebista ficou ao menos 343 dias, quase um ano, fora do país entre janeiro de 2007 e março de 2014, quando esteve à frente do Estado.

As informações fazem parte da investigação da Operação Calicute, que culminou em novembro na sua prisão sob acusação de obter propinas em obras públicas.

Procuradores suspeitam que a frequente saída do país de Cabral e a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo tenha relação com eventuais contas no exterior.

Viagens do ex-governador Sérgio Cabral

O volume de entradas e saídas no país identificadas pela Polícia Federal no Sistema de Tráfego Internacional foi revelado pelo jornal "O Estado de S. Paulo" em dezembro.

A Folha cruzou as informações do mesmo documento com relatórios de viagens oficiais de Cabral, do governo.

O sistema não mostrou todas as saídas e entradas de Cabral e a mulher no país. Há casos de viagens oficiais nem sequer listadas. Em outros casos, apenas uma das passagens pelo controle da PF foi listado –nesses a reportagem considerou três dias no exterior, menor período registrado nas viagens. O registro só passou a ser mais regular em 2011.

O cruzamento das informações feito pela reportagem mostra que o ex-governador fez 71 viagens, sendo 40 oficiais como governador, 24 a turismo durante o mandato e sete após o fim do mandato.

Um volume maior de viagens foi realizado pela ex-primeira-dama. Os dados indicam que foi 85 vezes para o exterior, sendo 43 desacompanhada do marido.

Procurada, a defesa de Cabral e da ex-primeira-dama não comentaram os dados até a conclusão desta edição.

PRINCIPAIS ROTAS

O principal destino dos voos a turismo de Cabral durante o mandato foram os Estados Unidos, seguido de Inglaterra e França. O relatório, porém, não determina o local final da viagem –Londres e Paris são os principais pontos de conexão a outras cidades europeias.

Em muitos casos, Adriana Ancelmo e Cabral embarcaram em voos separados, com poucos dias de diferença, retornando juntos. Isso ocorreu, por exemplo, em maio de 2011, quando a ex-primeira-dama embarcou para Zurique (Suíça) uma semana antes de uma viagem oficial do ex-governador para Paris. Os dois retornaram juntos ao Brasil saindo da capital francesa.

Cabral é acusado de comandar um esquema de cobrança de 6% de propina sobre contratos de obras públicas no Estado.

Ao longo do mandato, o peemedebista sempre foi criticado pelo excesso de viagens ao exterior. Elas se acirraram após a divulgação das fotos ao lado do empreiteiro Fernando Cavendish, dono da Delta, em Paris.

A Folha revelou em 2013 que o ex-governador omitiu dias no exterior. Mostrou também que ele recebeu diárias do Estado por dias sem compromissos oficiais.

Cabral nunca divulgou suas viagens a lazer. Os dados mostram que ele costumava ficar de cinco a nove dias no exterior a turismo. Uma delas foi quatro dias após ser reeleito, em 2010, quando foi para Paris.

Os dados mostram que os protestos de 2013 interromperam a rotina de viagem ao exterior do peemedebista. A última ainda no cargo foi em abril, para Londres, antes das manifestações em junho.

Seis dias após renunciar ao cargo, em 31 de março de 2014, o ex-governador embarcou para Londres. Ele ficou 22 dias fora, acompanhado de Adriana Ancelmo. Ele chegou no dia 28 de abril e embarcou de novo para a capital britânica no dia 30, retornando uma semana depois.

Foram no total seis viagens internacionais em 2014 de Cabral, sempre acompanhado da mulher. A última foi em agosto, um mês antes de ter o nome citado pela primeira vez na Operação Lava Jato, pelo ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa.

Ele só voltou a embarcar num voo internacional, segundo o relatório da PF, em janeiro de 2016, rumo Londres.

Rotina distinta manteve a ex-primeira-dama após o mandato. Em 2015, enquanto o marido não saiu do país, Adriana Ancelmo foi 11 vezes ao exterior. No ano seguinte, outras dez viagens internacionais.

De acordo com o Ministério Público Federal, parte do dinheiro era lavado por meio de transferências para o escritório de advocacia de Adriana Ancelmo.

Depoimentos de funcionários da banca da ex-primeira-dama indicam que a advogada recebeu dinheiro vivo de Luiz Carlos Bezerra, apontado como operador da propina, dentro do escritório.

De acordo com o relato da gerente financeira, Michelle Tomaz Pinto, entre 2014 e 2015 ele entregava semanalmente R$ 300 mil em espécie, levados numa mochila.