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    ANÁLISE

    Escolha de Moraes só possui semelhança com a de Nelson Jobim em 1997

    DIMITRI DIMOULIS
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    07/02/2017 02h00

    Sérgio Lima - 15.dez.2009/Folhapress
    Texto: BRASÍLIA, DF, BRASIL, 15-12-2009, 17h30: O ministro da Defesa, Nelson Jobim, na Comissão Especial da Copa do Mundo de 2014, na Câmara dos Deputados, onde falou sobre transporte aéreo e segurança para o evento. (Foto: Sérgio Lima/Folhapress, POLÍTICA)
    Nelson Jobim, que foi ministro do Supremo Tribunal Federal de 1997 a 2006

    Ao regulamentar os critérios para escolha de ministros do Supremo Tribunal Federal, a Constituição foi complacente. Qual o significado do "notável saber jurídico" e da "reputação ilibada"? Os minimalistas dizem que é suficiente o candidato ter sido aprovado no exame da Ordem dos Advogados.

    Quem pode patrocinar qualquer causa perante qualquer tribunal possui o necessário "saber". O mesmo afirmam os minimalistas em relação à "reputação ilibada". Bastaria que o candidato não tivesse grave defeito de caráter ou desvio de conduta para ser considerado livre de "manchas morais".

    Essa interpretação recai no fatalismo do jogo político. Não interessa o que o candidato "é". Interessa o fato que foi escolhido pelo Presidente da República e não incomodou a maioria partidária do Senado. O respaldo político se sobrepõe ao saber e à conduta. Eis um fatalismo que se apresenta como realismo.

    Para os que acreditam na força normativa da Constituição, a perspectiva deve diferente. O notável saber jurídico deve ser verificado minuciosamente.

    Se o direito exige comprovação documental para quem pede gratuidade no transporte ou meia-entrada no cinema, porque os cidadãos deveriam se contentar com a palavra dos políticos, sem exigir comprovação de que o candidato tenha as virtudes que a Constituição exige? Havendo mais de 1 milhão de operadores do direito, mas apenas 11 ministros do STF, a comprovação de suas virtudes deve ser "maximalista".

    Alexandre de Moraes recebeu fortes críticas sobre a qualidade de suas publicações acadêmicas, avaliadas negativamente em concursos e tidas como interessantes para alunos de cursinhos e não para estudiosos do direito constitucional. É uma questão difícil, que não exclui subjetivismos, mas que deve ser seriamente debatida.

    Maior preocupação gera o segundo requisito. Abandonando a versão minimalista, a "reputação ilibada" indica as virtudes que deve ter quem exercerá o mais alto cargo judicial. Reúne os requisitos da imparcialidade, da moderação e da serenidade uma pessoa que durante anos foi político profissional, sempre com filiação partidária e opções ideológicas conservadoras?

    Ainda mais pensando em sua atuação repressiva e controvertida como secretário de segurança pública em São Paulo, no momento do despertar democrático do Brasil.

    Essa é a característica que diferencia Moraes de todos os ministros do STF nomeados em duas décadas. As 15 últimas indicações recaíram sobre mulheres e homens com atuação jurídica, sem vínculos com a política partidária. A indicação do atual ministro da Justiça só possui semelhança com a de Nelson Jobim, em 1997, que foi filiado ao PMDB e vinha de longa carreira política.

    Está na hora de pensarmos não somente na reforma de um sistema de nomeações centralista e herdado do direito estadunidense do século 18, mas também na revitalização dos requisitos do saber e da reputação para integrantes do Supremo Tribunal Federal.

    DIMITRI DIMOULIS é professor de direito constitucional da Escola de Direito de São Paulo da FGV

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