• Poder

    Thursday, 02-May-2024 16:34:17 -03

    Após ação contra Raupp no Supremo, Congresso articula anistia ao caixa 2

    MARINA DIAS
    RANIER BRAGON
    DE BRASÍLIA

    10/03/2017 02h00

    Beto Barata - 16.abr.2015/Folhapress
    BRASÍLIA, DF, 16.04.2015: ÍNDIOS-DF - O senador Valdir Raupp durante sessão em homenagem aos povos indígenas no plenário do Senado Federal, em Brasília (DF).(Foto: Beto Barata/Folhapress)LEGENDA DO JORNALValdir Raupp (PMDB-RO) em sessão no plenário do Senado
    O senador Valdir Raupp (PMDB-RO), que se tornou réu na Lava Jato

    O medo pautará o Congresso enquanto houver Lava Jato. Essa é a avaliação de integrantes do Judiciário diante da forte reação de parte da classe política, que acusa o Supremo Tribunal Federal de criminalizar doações legais.

    Ministros de tribunais superiores que assistiram à grita de congressistas após a corte tornar réu o senador e ex-presidente do PMDB Valdir Raupp (RO) apostam, em conversas reservadas, que deputados e senadores votarão neste ano somente medidas "para que não sejam presos".

    Segundo a Folha apurou, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), têm se reunido com líderes de todos os partidos para discutir a melhor maneira de aprovar não só a anistia ao caixa dois, mas também um pacote mais amplo, incluindo anistia a doações oficiais nos casos em que o dinheiro for considerado de fonte ilícita.

    No ano passado, a Casa tentou –por duas vezes e sem sucesso– aprovar a anistia ao caixa dois e livrar de punições todos aqueles que haviam recebido dinheiro para campanha eleitoral sem conhecimento da Justiça.

    Agora, dizem deputados e senadores, é preciso delimitar uma linha divisória entre o que é caixa um, caixa dois e propina e evitar que todos fiquem no "mesmo bolo".

    A interpretação do STF sobre Raupp –réu por corrupção passiva e lavagem de dinheiro– foi a mesma do juiz Sergio Moro, responsável pela Lava Jato no Paraná: apesar de declarada oficialmente à Justiça Eleitoral, a doação de R$ 500 mil da empreiteira Queiroz Galvão à campanha do peemedebista em 2010 seria "propina disfarçada", com origem no esquema de corrupção da Petrobras.

    Essa foi a primeira vez, em um caso referente à Lava Jato, que o Supremo admitiu que doações oficiais podem ser consideradas propina, o que acendeu os ânimos de grande parte dos políticos.

    "Acho que se colocou pimenta no tabuleiro e realçou-se uma preocupação: como fica a política a partir daqui? O Legislativo é o Poder que pode anistiar, cassar, então vai ter que tomar medidas para recolocar as coisas no lugar", disse o deputado Vicente Cândido (PT-SP), relator da reforma política na comissão especial da Câmara.

    Segundo ele, a Casa precisa votar pelo menos três medidas: a nova lei de leniência, a legalização do lobby e uma lei diferenciando doação legal e caixa dois.

    "Financiamento de campanha era assim, poucas pessoas davam dinheiro apenas pela ideologia, daí é fácil fazer confusão sobre o que foi favor, o que foi doação, o que foi caixa dois."

    Como revelou a Folha, horas depois de Raupp virar réu, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), também defendeu a tese de que não se pode criminalizar doações eleitorais. O tucano estava num jantar em Brasília e foi corroborado, inclusive, por um deputado de oposição, Chico Alencar (PSOL-RJ).

    O discurso de Aécio fazia eco à recente nota do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que disse ser preciso fazer "distinções" entre quem recebeu recursos de caixa dois e quem obteve dinheiro para enriquecer.
    Era a senha para que políticos de todos os matizes passassem a defender publicamente a tese de que caixa dois não é crime e que não se pode criminalizar o caixa um.

    JURÍDICO

    Ministros do Judiciário ouvidos pela Folha ponderam que cada caso deverá ser analisado separadamente, visto que será preciso "provar" que houve contrapartida para a doação legal à campanha e, com isso, tentar diferir o que é caixa um, caixa dois e caixa um travestido de propina.

    Advogados e juízes ouvidos pela reportagem consideram que a tentativa para aprovar a anistia ao caixa dois ou até mesmo um pacote mais amplo é uma forma de conseguir um benefício ao acusado. Por exemplo: caso haja condenação por outros crimes, o caixa dois não ajudaria a agravar a pena.

    Além disso, dizem, os políticos querem tratar o caixa dois como "mera irregularidade", o que não é admissível no caso de corrupção, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, e, dessa forma, conseguir certo alívio diante da opinião pública.

    -

    PROPINA OFICIAL

    Doação declarada pode ter origem ilícita

    ACUSAÇÃO
    > Em set.2016, a Procuradoria-Geral da República denunciou o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) sob acusação de corrupção e lavagem de dinheiro
    > Segundo investigação decorrente da Lava Jato, ele recebeu R$ 500 mil em 2010 da Queiroz Galvão para sua campanha. O valor foi pago por meio de doação eleitoral declarada oficialmente
    > Delatores dizem que o dinheiro era, na verdade, propina. A empresa teria desviado recursos de obras da Petrobras
    > Ao menos três delatores imputaram ilegalidades ao senador: Paulo Roberto Costa (ex-diretor da Petrobras), Alberto Youssef (doleiro) e Fernando Baiano (operador)

    COMO VOTARAM
    > Relator da Lava Jato no STF, Edson Fachin votou pelo recebimento integral da denúncia. Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Gilmar Mendes acompanharam. Dias Toffoli discordou quanto à lavagem

    O QUE DIZ A DEFESA
    > "Contribuição oficial de campanha devidamente declarada não pode ser considerada como indício e/ou prova de ilicitude" e contas foram aprovadas, afirma Raupp

    IMPLICAÇÕES
    > A interpretação do STF é a mesma do juiz Sergio Moro. É a primeira vez, na Lava Jato, que o Supremo admite que doações oficiais podem ser consideradas propina
    > Decisão derruba o argumento de vários acusados de que não sabem a origem da doação

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024