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    Lava Jato

    Andrade Gutierrez diz que subornou o Tribunal de Contas de SP

    BELA MEGALE
    DE BRASÍLIA
    MARIO CESAR CARVALHO
    DE SÃO PAULO

    12/03/2017 02h00

    Ricardo Nogueira -23.jun.2016/Folhapress
    SAO PAULO, SP, BRASIL, 23-06-2016, 16H00, OBRAS MONOTRILHO LINHA 15, COTIDIANO: Funcionarios trabalham na linha 15 do Monotrilho, na estacao Tolstoi, na zona leste da capital. Corrego que havia sido descoberto impedia a continuidade da obra. (Foto: Ricardo Nogueira/Folhapress) ***exclusivo Folha***
    Obras na linha 15 do monotrilho, na zona leste da capital

    Um executivo e um ex-diretor da Andrade Gutierrez afirmaram, em negociação de acordo de delação com a Operação Lava Jato, que a empreiteira pagava propina para que o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo não apontasse problemas em licitações e contratos de obras, sobretudo os do Metrô.

    O órgão é responsável por decidir se as licitações e contratos do governo paulista são regulares ou não.

    Um dos relatos diz que a empresa pagava o correspondente a 1% do valor do contrato que estava sob análise do tribunal para Eduardo Bittencourt Carvalho, ex-conselheiro do órgão.

    O valor era entregue em dinheiro vivo para representantes do conselheiro, segundo um candidato a delator.

    Bittencourt foi afastado do tribunal pela Justiça no final de 2011 sob a acusação de enriquecimento ilícito: ele acumulou um patrimônio de R$ 50 milhões quando era conselheiro, incompatível com o salário que recebia, segundo a acusação do Ministério Público aceita pela Justiça.

    Ele conseguiu voltar ao cargo em 2012 por decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e aposentou-se em seguida.

    DIVISÃO DO SUBORNO

    Segundo o relato de um dos candidatos a delator nas novas negociações da Andrade com o Ministério Público Federal, Bittencourt afirmava que o dinheiro era dividido com os outros conselheiros, com uma exceção: Antonio Claudio Alvarenga.

    No entanto um ex-diretor do grupo que também negocia delação relata que todos os sete conselheiros teriam recebido suborno.

    A lista do ex-diretor tem os nomes dos seguintes conselheiros: Antonio Claudio Alvarenga, Antonio Roque Citadini, Edgard Camargo Rodrigues, Fulvio Julião Biazzi, Renato Martins Costa e Robson Marinho.

    Bittencourt refutou, por meio de seu advogado, Paulo Sérgio Santo André, que tenha recebido qualquer recurso ilícito. Segundo o advogado, as decisões eram colegiadas, e o conselheiro votou contra os interesses de grandes empreiteiras em vários julgamentos.

    A lista traz o quadro do TCE dos anos 1990 até 2012, quando houve mudanças na composição. Desses conselheiros, Citadini, Costa e Rodrigues continuam no tribunal.

    Robson Marinho foi afastado do cargo pela Justiça em agosto de 2014, sob acusação de ter recebido um suborno de cerca de US$ 3 milhões, em valores de 2013, da Alstom em conta na Suíça.

    A Andrade Gutierrez fez em maio do ano passado um acordo de leniência, uma espécie de delação para empresas, relatou uma série de crimes e aceitou pagar uma multa de R$ 1 bilhão, a segunda maior da Operação Lava Jato.

    Com a delação de outras empreiteiras, os procuradores descobriram que havia omissões e convocaram a empresa para fazer um complemento, chamado por eles de "recall". É esse complemento que está sob negociação.

    ATRÁS DA PROPINA

    A Andrade Gutierrez fez uma auditoria para checar o caminho do dinheiro que foi distribuído como propina e descobriu que os valores entregues a Bittencourt foram repassados a um operador financeiro. A auditoria, no entanto, não encontrou rastros de pagamentos que cheguem até os outros conselheiros.

    A Polícia Federal já apontou que a Andrade Gutierrez fez pagamentos suspeitos a empresas de fachada, usadas para repassar propina.

    O Tribunal de Contas paulista, formado por sete conselheiros nomeados pelo governador, é o segundo mais importante do país, só atrás do Tribunal de Contas da União.

    Não se sabe detalhes do suposto acordo entre a Andrade Gutierrez e Bittencourt, mas o fato é que o tribunal apontou problemas em obras da empresa para o Metrô. O TCE, porém, nunca provou o que era a maior preocupação das empreiteiras: a divisão das obras por meio de cartel.

    Citadini, por exemplo, acusou problemas em obras da linha 5 - lilás e no monotrilho. O preço da linha 5 teve um aumento de R$ 1,05 bilhão. O trecho feito pela Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa foi o que sofreu a maior elevação: passou de R$ 862 milhões para R$ 1,15 bilhão, aumento de R$ 284,4 milhões.

    Citadini pediu que a obra do monotrilho fosse paralisada porque não havia projeto básico, detalhamento de custos, e a concorrência feria a Lei das Licitações.

    Em janeiro do ano passado, o governo rompeu o contrato do monotrilho alegando que as empresas abandonaram a obra. Já a Andrade Gutierrez dizia que o governo atrasava pagamentos.

    O conselheiro Renato Martins Costa apontou problemas de suspeita de cartel no trecho da linha 2 feito pela Andrade, mas o contrato acabou sendo aprovado. No caso da linha 5, também há suspeita de cartel. A Folha registrou antes o resultado da licitação, e o Ministério Público aponta em ação que corre na Justiça um prejuízo de R$ 329 milhões causado pelo cartel.

    Editoria de Arte/Folhapress
    A ANDRADE E O METRÔ Empresa deve delatar propina a conselheiros

    OUTRO LADO

    Os conselheiros do Tribunal de Contas do Estado citados pelo executivo e pelo ex-diretor da Andrade Gutierrez que negociam delação negam que tenham recebido recursos ilícitos da empresa.

    O advogado de Eduardo Bittencourt Carvalho, Paulo Sérgio Santo André, diz que o nome de seu cliente foi citado "indevidamente", já que ele sempre se pautou pela lei. Segundo ele, os julgamentos do Tribunal de Contas são colegiados, feitos por vários conselheiros, e há inúmeros votos de Bittencourt "contrários a interesses de grandes empreiteiras".

    Santo André diz em nota que "lamenta-se, apenas, que esse tipo de questionamento surja por meio de conduta criminosa de agentes que desrespeitam o dever de sigilo".

    Antonio Claudio Alvarenga, 74, que se aposentou do tribunal em 2012, diz que a menção a seu nome "é uma mentira deslavada":

    "Eu nunca participei de nada disso e jamais ninguém teria coragem de falar em meu nome. Fui do Ministério Público por quase 30 anos. Isso [propina] nunca chega nem perto de mim".

    De acordo com Alvarenga, "Bittencourt nunca teve liberdade para falar essas coisas comigo".

    Fulvio Julião Biazzi, que deixou o tribunal, também repudia a citação a seu nome: "Nunca tratei de assuntos não republicanos nem dentro e nem fora do tribunal. Tenho 49 anos de serviço, cinco de aposentado, minha vida é um livro aberto".

    O ex-conselheiro disse ainda que está "tranquilo e sereno" sobre o assunto. "Alguém deve ter usado os nomes dos conselheiros para se acobertar".

    Edgard Camargo Rodrigues, licenciado do tribunal por motivos de saúde, disse por meio da assessoria do órgão que nunca recebeu dinheiro de origem ilícita nem conhece os fatos narrados na proposta de delação.

    Renato Martins Costa, que continua no tribunal, diz ter ficado "indignado" com a associação de seu nome a suborno: "Isso é um arrematado absurdo. Não sei nada disso aí! Isso é inconcebível para alguém que tem 45 anos de vida pública. Fico absolutamente revoltado com esse tipo de menção. O pessoal das empreiteiras está jogando pessoas inocentes na lama".

    Antonio Roque Citadini e Robson Marinho não quiseram se pronunciar.

    O TCE afirmou o seguinte por meio de nota: "O Tribunal de Contas do Estado de São Paulo desconhece o teor das declarações e está à disposição para prestar quaisquer informações que possam contribuir para o esclarecimento dos fatos".

    A Andrade Gutierrez diz que não comenta o teor da proposta de delação porque não teve acesso ao conteúdo de ex-executivos.

    Procurado, o Metrô não quis comentar as suspeitas.

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