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    Lava Jato

    Camping reúne tietes de Moro e passaporte da 'República de Curitiba'

    ANNA VIRGINIA BALLOUSSIER
    ENVIADA ESPECIAL A CURITIBA

    02/05/2017 02h00

    Em agosto, Sergio Moro levou o bolo. Era de abacaxi e coco e tinha seu rosto desenhado na cobertura de glacê.

    Uma assistente do juiz responsável pela Lava Jato jurou que entregaria o primeiro pedaço ao aniversariante, lembra a aposentada Miriam Oliveira, 59, parte da turma que encomendou a guloseima para comemorar os 44 anos de seu "herói".

    Sete meses depois, em 28/3, o grupo celebrou outro aniversário: um ano antes, inauguravam acampamento fixo em apoio à Lava Jato numa praça em frente à 13ª Vara Federal de Curitiba, onde Moro atua. Construíram uma plataforma de madeira e lá colocaram mesa, cartazes ("Continuamos aqui!!! Apoiando Moro") e um container com frigobar coberto de bandeiras brasileiras e um casaco pró-Exército.

    Revezam-se por lá, de tarde e à noite, dez pessoas. Os custos são rachados entre simpatizantes (há patrocínio de empresas locais). Engorda o caixa a venda de camisetas com o rosto do magistrado (R$ 40) e réplicas de passaportes, só que com "República de Curitiba" em vez de Brasil (R$ 10).

    Em fevereiro, a Prefeitura curitibana desmontou parte do camping, por ver desrespeito a regras de urbanismo. Combinaram assim: para continuar, o grupo precisava tirar cartazes das árvores.

    Questionada sobre o uso do espaço público, a administração diz que conversa com os acampados sobre "código de posturas da cidade no que diz respeito a ocupação irregular, depredação do logradouro, entre outros. As tratativas pressupõem o respeito da Prefeitura por posições políticas e pelo direito de manifestação dos cidadãos".

    O "Acampamento Lava Jato" também ocupa a arena virtual. Em perfil no Facebook, compartilham fotos como a da camisa de um senhor: "Na próxima eleição, vote nas putas, porque nos filhos delas não está dando certo!!!".

    O que dá certo por ali: falar mal de Lula. Naquele dia, Moro decidiu adiar o depoimento do ex-presidente na 13ª Vara. A advogada Paula Milani (que não diz a idade) torcia por isso, por crer que a decisão esvaziará caravanas pró-PT na cidade, de grupos como MST. "A gente pelo menos é limpinho."

    "Delícia!", diz. "Quero muito quebrar a perna dos vermelhos."

    Há um ano, conta, foi "atacada com uma chave de fenda". "Cheguei no posto à 1h. Tinha um petista que saiu gritando 'fascista'."

    Deu três golpes na cabeça de um amigo dela. "Fui pra cima ou ele ia matar." Mostra fotos dos ferimentos. "Usei maquiagem por um mês."

    Uma ferida aberta: a maioria votou em Aécio Neves em 2014, e agora o tucano aparece na delação da Odebrecht. Por ora, "a tendência aqui é Jair Bolsonaro", diz Paula sobre a eleição de 2018.

    A aposentada Narli Resende, 59, pede a palavra para rechaçar a ideia de que os "verde-amarelos" são elitistas.

    Com doença degenerativa, ela trocou a cadeira de rodas por um andador, para poder pegar um transporte comum, pois custa caro bancar o táxi adaptado para deficientes. "Não tenho 'narlicínio', não."

    Sua camisa brinca com estereótipos: na estampa, uma coxinha (eles) de óculos escuros coloniza um sanduíche de mortadela (os "vermelhos"). Cobra mais ativismo pró-Lava Jato: o impeachment de Dilma não bastaria para ajeitar o país. "Pessoal achou que seria igual Nescau: bateu, tomou."

    Nos dois anos de Lava Jato, Narli distribuiu 24 rosas a quem passava, uma para cada mês da operação. Um botão foi parar no gabinete de Moro. Também em 2016, os acampados conheceram o "mito". "Lá pelas 20h, passou um carro preto e baixou vidro. Achei que queria um adesivo ['Lava Jato: eu apoio']. Aí vejo o juiz."

    O conselho que ele teria dado a seu fã-clube: "Não fiquem aí se sacrificando muito, viu?".

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