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O advogado René Ariel Dotti em seu escritório, no centro de Curitiba (PR); ele critica Fachin e Janot |
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Poder
Sunday, 05-May-2024 23:46:29 -03Cogitar diretas é 'surrealismo político', diz coautor de impeachment de Collor
RAFAEL GREGORIO
DE SÃO PAULO02/06/2017 02h00
A abertura de inquérito sobre Michel Temer foi açodamento por parte do procurador-geral da República e do Supremo Tribunal Federal, diz o advogado René Ariel Dotti, 82.
Para o criminalista, o ministro Edson Fachin e o procurador-geral Rodrigo Janot "atropelaram o processo penal" e falta "corpo de delito" ao inquérito.
Ele diz ainda que "falar em eleições diretas agora é absolutamente anárquico, um surrealismo político".
Conhecido pela defesa do Partido Comunista e de jornalistas durante a ditadura, Dotti ajudou a formular as leis de imprensa e eleitoral e o pedido de impeachment de Fernando Collor. Hoje, é advogado da Petrobras nos processos da Operação Lava Jato em que a empresa é assistente de acusação.
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Folha - Como vê a atual crise política após a delação da JBS?
René Ariel Dotti - Um teatro do absurdo. Nunca vi tantas contradições e falta de bom senso. A Constituição prevê eleição indireta pelo Congresso Nacional em caso de renúncia ou afastamento do presidente nos últimos dois anos. As manifestações por eleições diretas são absolutamente anárquicas. É uma questão até de civismo.É o caso de impedimento de Michel Temer?
Não. Está havendo um açodamento muito grande. Não é possível abrir inquérito sem ter comprovação do corpo de delito. Não se investiga homicídio sem um cadáver. No caso, o corpo de delito é a gravação, sobre a qual há dúvidas.Há excesso do procurador?
Não só dele. O ministro Fachin não podia ter aberto inquérito sem levar o caso ao plenário do STF. Outra inversão é o procurador querer ouvir o presidente agora. O Código de Processo Penal prevê o interrogatório como último ato, depois de colhidas provas, ouvidas testemunhas.Fui um dos que lutou para que Fachin fosse aprovado no STF. Há manifestações minhas no Senado, estive na sabatina, conheço e admiro o ministro, mas ele errou. Trouxe atropelo e vantagem para delinquentes. Sou 100% favorável a que o episódio não vire espetáculo.
Como vê a decisão da OAB de pedir o impeachment?
Precipitada. Deveria ter sido mais discutida, e não só pelo Conselho Federal, mas junto às seccionais. No impeachment de Collor, após o primeiro telefonema do Miguel Reale Júnior me convidando para uma reunião, passaram-se semanas até que a OAB entendesse por apoiar.Politicamente é possível a Temer superar este momento?
Creio que sim. A possibilidade de reformas que surgiu é uma esperança. Não sou político, minhas convicções vêm da condição de cidadão, advogado e professor. Entendo que devemos sair desse túnel.Como o sr. analisa a divulgação de áudio envolvendo o jornalista Reinaldo Azevedo?
Uma negligência de extrema gravidade. A PF e o Ministério Público Federal dizem não ter nada a ver, e o ministro Fachin até agora não se explicou. Não havia indícios de crime a justificar a liberação do áudio. Está qualificado um abuso, um dano material e moral. Se o jornalista puder ter descobertas suas fontes, ninguém dará informação em off, e ficaremos sem saber.O sr. já disse considerar "inadmissível" que promotor ou juiz deem entrevistas e que isso os torna "irremediavelmente suspeitos". Hoje, vemos alguns deles opinando até em redes sociais. Como vê isso?
Poderiam ser menos ostensivos. Por outro lado, a presença do juiz [Sergio] Moro é absolutamente necessária para que a ideia da luta contra a corrupção permaneça. Há o exemplo da Itália, onde juízes processaram corruptos, mas depois novas leis vieram e muitos ficaram anos se defendendo de acusações.Aliás, o Código Penal já prevê crimes para a má atuação de juízes, o momento não é adequado para que partidos desgastados por investigações votem nova lei de abuso de autoridade. Por isso a juventude não crê na política.
Essa descrença pode estimular a ascensão de radicais?
Sim, uma onda generalizadora de crítica à política em si que tem sido utilizada pelo candidato [Jair] Bolsonaro. Os programas eleitorais dispensam a participação do cidadão e os partidos políticos hoje lamentavelmente são feudos de determinadas pessoas.O que pode ser feito?
Nos anos 1980, a partir do fim da censura prévia em 1978 e de experiências em Portugal e na Espanha, formou-se uma consciência popular de proteção individual do ambiente e do direito do consumidor. A Lei da Ficha Limpa também surgiu de iniciativa popular, assim como a atual onda de proteção à mulher. Uma mudança nos costumes políticos virá não do Congresso, que legisla em causa própria, mas da sociedade.Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br
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