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    Lava Jato

    Após pressão de Loures sobre Cade, dona da JBS fez acerto com Petrobras

    JULIO WIZIACK
    CAMILA MATTOSO
    DE BRASÍLIA

    27/06/2017 12h48

    Mastrangelo Reino - 13.ago.2009/Folhapress
    Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), ex-deputado federal e ex-assessor de Temer
    Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), ex-deputado federal e ex-assessor de Temer

    Depois de entregar a mala com R$ 500 mil para Rodrigo Rocha Loures, ex-assessor do presidente Michel Temer, a J&F, holding que controla a JBS, conseguiu melhorar sua situação numa disputa com a Petrobras.

    Loures, que está preso desde o dia 3 de junho, foi filmado pela Polícia Federal com a mala de dinheiro, que seria pagamento para influenciar no caso. O episódio é uma das bases da denúncia apresentada pela PGR (Procuradoria-Geral da República) contra Loures e Temer, acusados de corrupção passiva.

    A empresa de Joesley Batista relatou à Superintendência-Geral do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) suposto abuso de poder econômico por parte da estatal no fornecimento de gás para usinas da Âmbar, braço de energia do grupo J&F.

    O Cade é o órgão de defesa da concorrência e, antes de qualquer julgamento seguir para o tribunal administrativo, os casos passam pela superintendência, que é responsável pela instrução dos processos.

    Em abril de 2016, a superintendência acatou as reclamações da Âmbar e abriu um inquérito administrativo contra a Petrobras. Em 13 de março deste ano, Joesley Batista se encontrou com Rocha Loures e pediu que ele intercedesse junto ao Cade em troca de dinheiro.

    Loures ligou na mesma hora para o então presidente do conselho, Gilvandro Vasconcelos, que repassou o pedido para Eduardo Frade, o superintendente-geral. A conversa foi realizada em sistema de viva-voz para que Joesley pudesse acompanhar. Rocha Loures chamou os servidores do Cade de "nossos meninos".

    Na mira da JBS

    Uma semana depois disso, a Âmbar entrou com um pedido de medida preventiva solicitando que a superintendência do conselho forçasse a Petrobras a entregar o gás fornecido pela Bolívia por US$ 4,40 por milhão de BTU, 2,5% acima do preço de custo da Petrobras.

    Poucos dias depois, em 3 de abril, a superintendência promoveu uma reunião com representantes das duas empresas.

    Transcorridos dez dias, a Petrobras e a Âmbar assinaram um contrato de fornecimento válido até dezembro deste ano. Pelo novo acerto, a petroleira cobrou US$ 6,07 por milhão de BTU de gás.

    Embora ainda acuse a Petrobras de praticar preços elevados, a Âmbar considerou o contrato melhor. Rocha Loures recebeu o pagamento combinado com Joesley Batista (R$ 500 mil) em 28 de abril.

    Em 4 de maio, a superintendência realizou outra reunião somente com a Âmbar para saber se poderia cancelar o inquérito. Os representantes da Âmbar estranharam o pedido. Em geral, a empresa é que pede pelo cancelamento de um inquérito ou de um processo em andamento.

    A empresa do grupo J&F se negou a encerrar o caso, o processo tramita até hoje.

    No início deste mês, a Petrobras rescindiu o contrato de forma unilateral depois de virem a público as delações dos irmãos Batista.

    Veja o vídeo

    PF é flagrado correndo com mala de dinheiro da JBS

    OUTRO LADO

    As duas empresas negaram qualquer tipo de interferência da superintendência do Cade para que o novo contrato fosse fechado.

    A Âmbar afirmou ter total desconhecimento da pressão feita por "executivos da J&F" junto ao Cade para que o negócio com a Petrobras fosse resolvido.

    Segundo a empresa, o pagamento de propina foi algo confessado e documentado pela J&F e, por isso, não comentou o caso.

    A Petrobras informou que, nas reuniões iniciais ocorridas no Cade, apresentou documentos mostrando que o pedido da Âmbar era impraticável. Por isso, não chegaram a um acordo.

    A estatal confirmou que a empresa de Joesley Batista pedia, via Cade, preços de custo "acrescido de 2,5% de margem" ou restrições de retirada do gás pela estatal em seu fornecedor na Bolívia para que a usina pudesse comprá-lo diretamente daquele país.

    O acordo só saiu depois, quando a Âmbar aceitou as condições da Petrobras, e não o contrário, diz a estatal.

    A assessoria do Cade disse que não há irregularidade na atuação da superintendência, que pode marcar reuniões por conta própria ou a pedido dos interessados.

    A Superintendência-Geral afirmou ser comum estimular que as empresas em disputas entrem em acordos mas informou que, no caso, o contrato foi fechado sem qualquer interferência do órgão, que recebeu a comunicação no dia 13 de abril.

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    CRONOLOGIA

    O passo a passo do lobby de Loures e das medidas do Cade

    SET.2015
    Âmbar vai ao Cade* denunciar suposto abuso por prática anticoncorrencial da Petrobras no mercado de gás. Nesse meio tempo, a Âmbar consegue dois pequenos contratos, de cerca de 40 dias, com a estatal

    ABR.2016
    A denúncia vira um inquérito administrativo na Superintendência-Geral do Cade

    7.MAR.2017
    Joesley Batista, dono do grupo J&F, que controla a Âmbar, vai ao Palácio do Jaburu e grava Michel Temer. Na conversa, o presidente afirma que seu assessor Rodrigo Rocha Loures pode ser procurado para tratar do assunto

    13.MAR.2017
    Joesley Batista se encontra com Rocha Loures e oferece dinheiro em troca de uma ajuda junto ao Cade

    3.ABR.2017
    Superintendência promoveu uma reunião com representantes das duas empresas

    13.ABR.2017
    A Petrobras e a Âmbar assinam um contrato de fornecimento válido até dezembro deste ano. Pelo novo acerto, a petroleira cobrou US$ 6,07 por milhão de BTU de gás. É o contrato mais longo assinado pelas duas

    28.ABR.2017
    Rocha Loures recebe o pagamento combinado com Joesley (R$ 500 mil) em uma mala em uma pizzaria em São Paulo - ele é filmado pela PF correndo com a mala para pegar um táxi

    4.MAI.2017
    A superintendência do Cade realiza outra reunião somente com a Âmbar para saber se poderia cancelar o inquérito. Os representantes da Âmbar - que disseram à PF não terem participado da pressão política - estranharam o pedido

    17.MAI.2017
    "O Globo" revela acordo de delação premiada da JBS e gravações feitas com Temer

    18.MAI.2017
    PF deflagra operação Patmos e faz busca e apreensão na casa de Rocha Loures, que estava em viagem nos Estados Unidos

    3.JUN.2017
    Rocha Loures é preso pela PF em Brasília -ele prestou depoimento dias depois mas decidiu se manter em silêncio

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