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    Após 3 meses, investigações sobre delação da Odebrecht emperram

    CAMILA MATTOSO
    LETICIA CASADO
    DE BRASÍLIA

    10/07/2017 02h00

    Rodrigo Félix Leal - 1º.set.2015/Futura Press/Folhapress
    Marcelo Odebrecht, em depoimento na CPI da Petrobras, na sede da Justiça Federal, em Curitiba (PR)
    Marcelo Odebrecht, em depoimento à CPI da Petrobras, na sede da Justiça Federal, em Curitiba (PR)

    Três meses depois de o STF (Supremo Tribunal Federal) autorizar a abertura de inquéritos, as investigações envolvendo a delação de executivos da Odebrecht não avançam.

    O caso da empreiteira chegou a ser chamado de "delação do fim do mundo" por envolver políticos de todos os partidos e tendências.

    Uma análise feita pela Folha aponta que tem sido difícil para os investigadores comprovar os relatos feitos pelos delatores à PGR (Procuradoria-Geral da República).

    Há outro fator que coloca uma incógnita sobre o futuro das investigações: 24 dos 77 inquéritos abertos desde abril saíram das mãos de Edson Fachin, relator original, e foram para outros ministros. E esse número aumenta a cada dia.

    Nenhuma denúncia foi apresentada até agora em relação a esses inquéritos. A delação da JBS, homologada em maio –quase quatro meses após a da Odebrecht–, já virou base para três acusações da Procuradoria, uma delas tendo como alvo o presidente Michel Temer.

    Após abertos, os inquéritos da Odebrecht foram enviados para a Polícia Federal, com prazo fixado de 30 dias para cumprimento de diligências. A PF, no entanto, não conseguiu realizar todas as medidas e solicitou mais tempo em cada uma das investigações.

    PROVAS

    Pela leitura dos andamentos dos inquéritos, que são públicos, é possível verificar que a maior dificuldade tem sido de buscar provas sobre os pagamentos realizados.

    Mais de 40 pessoas foram à PF prestar depoimento. Uma série de pesquisas foi solicitada, como a evolução patrimonial dos investigados, acesso e destino de pessoas no Congresso e prestações de contas em eleições.

    Todos os políticos ouvidos negaram as acusações. Oito ministros, 39 deputados e 24 senadores foram delatados.

    Aos delatores, que também foram chamados a depor novamente, a PF pediu mais detalhes dos repasses, mas em geral teve respostas vazias.

    Em alguns casos, a polícia identificou contradições. O ex-diretor de Relações Institucionais Alexandrino Alencar, por exemplo, afirmou ter feito uma reunião com a deputada Maria do Rosário (PT-RS) em 2010 para tratar de doação de campanha.

    Ele disse que o encontro foi no escritório da então candidata, em Porto Alegre.

    Em seu depoimento, a petista afirmou que só alugou a sala mencionada em 2014, levando como prova seu contrato com a imobiliária.

    RELATORIA

    Fachin é, desde a morte de Teori Zavascki, em janeiro, o relator da Lava Jato na corte.

    A distribuição dos casos para outros ministros ocorre porque, na visão do STF, há nessas investigações falta de conexão com o tema principal da Lava Jato, o desvio de dinheiro da Petrobras.

    Com as mudanças, 10 dos 11 ministros decidirão sobre suspeitas referentes à empreiteira, o que deve gerar conflitos, com definições e interpretações diferentes para situações semelhantes, além de debates entre as duas turmas do tribunal.

    "Esse é o sistema regimental e não se pode ver nisso qualquer insegurança. O inverso é que fugiria à organicidade do direito", diz o ministro Marco Aurélio Mello.

    "Isso não atrapalha o andamento. A demora se dá mais pelo tempo das investigações", afirma Gilmar Mendes.

    Ministros, investigadores e advogados afirmam que a redistribuição é importante para a celeridade dos processos, mas se dizem preocupados com a possível desigualdade nas decisões.

    "É natural que os juízes tenham entendimentos diferentes. Mas o STF, que é a corte suprema, deveria se pautar por uniformizar os tribunais. E eles vão fazer justamente o contrário. Isso vai gerar tratamento desigual para os réus e já esta gerando", afirma o advogado Leonardo Sica, doutor em direito penal.

    Advogados discordam sobre a existência de critérios para a distribuição.

    Para Gustavo Badaró, professor de direito da USP, "não tem havido critério seguro para determinar quando um inquérito é conexo com a Lava Jato". "O STF deveria ser o guardião, mas a gente vê que a conveniência é o que está dando o tom", diz.

    "Acho que o Supremo está observando o critério de forma bastante técnica", disse o advogado Luis Henrique Machado, que defende Renan Calheiros (PMDB- AL) e outros políticos.

    OUTRO LADO

    A PGR (Procuradoria-Geral da República) informou que as investigações e a coleta de provas relativas à delação da Odebrecht ainda estão em curso. "Como em qualquer outro acordo estão sendo realizadas investigações complementares dentro dos inquéritos instaurados", disse a instituição à Folha.

    A Procuradoria ressalta que os desdobramentos da delação "ocorreram em várias instâncias por todo o país, não se esgotando no STF". Sobre a comparação entre delações, a PGR afirma que "cada colaboração tem suas particularidades quanto a extensão e conteúdo".

    Em relação ao ritmo da Lava Jato, a PGR destaca que apresentou até o momento 24 denúncias ao STF, "sendo que cinco já foram convertidas em ações penais".

    A Procuradoria afirma que o cumprimento de prazos processuais depende de diversos fatores, como diligências e juntada de documentação, além de informações de outros órgãos.

    O gabinete do ministro Edson Fachin diz que "não se pode falar em insegurança jurídica", pois a redistribuição segue como critério a conexão com desvios da Petrobras. "Se houver alguma dúvida em relação à redistribuição, tanto as defesas como o Ministério Público podem questionar, e o pleno reexaminará a questão."

    Sobre os casos considerados conexos com a Lava Jato no início e depois separados, o gabinete afirma que as decisões de Fachin são sujeitas a "constante reavaliação, a partir do panorama de provas que vai se modificando".

    A PF não se manifestou.

    Editoria de Arte/Folhapress
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