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    Análise

    Após meses de discussões, reforma política se resumirá a remendo eleitoral

    RANIER BRAGON
    DE BRASÍLIA

    21/09/2017 12h27

    Pedro Ladeira - 13.ago.2017/Folhapress
    BRASILIA, DF, BRASIL, 09-08-2017, 21h00: Sessão da Comissão da Reforma Política deve votar hoje relatório do deputado Vicente Cândido (PT-SP). A comissão, presidida pelo deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), discute alterações nas regras eleitorais. (Foto: Pedro Ladeira/Folhapress, PODER)
    Uma das sessões da comissão que discute a reforma política na Câmara

    Desde a Constituição de 1988, o Congresso tem sido campo fértil de tentativas de reforma política. Neste ano, lançou-se uma cruzada por mais uma.

    Bem no início dos debates, o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), veterano de outras empreitadas que falharam, afirmou em um tom não muito otimista que se resignava a embarcar em mais uma. "Vai que cola."

    Após incontáveis reuniões, conchavos, audiências públicas, debates, análises, bate-bocas, adiamentos e tentativas frustradas de votação, a resposta é: não colou.

    A duas semanas do prazo final para que tudo seja aprovado pelo Congresso e promulgado ou sancionado –caso contrário não vai valer nas eleições de 2018–, o balanço é decepcionante.

    Se muito, deputados e senadores conseguirão emplacar apenas três mudanças de algum relevo:

    1) Uma regra para tentar barrar a proliferação de legendas nanicas, mas que foi bastante amenizada em relação à proposta original e que terá o efeito desejado por alguns, o de reduzir as atuais 35 legendas do país para menos da metade, lá pela década de 2030 em diante.

    2) A proibição da coligação entre partidos (excrescência que une legendas sem nenhuma identidade ideológica ou pragmática, apenas para fins eleitorais) nas eleições de deputados e vereadores. Mas só para valer a partir da disputa de 2020. Ou seja, o atual Congresso considera a medida válida, mas só nos olhos dos outros –no caso, dos vereadores, que terão que implantar o modelo na disputa municipal de 2020.

    3) A criação de mais um fundo público de campanha para abastecer os candidatos. Real motivação da atual reforma, já que políticos ficaram sem saber como conseguir dinheiro após o Supremo Tribunal Federal proibir em 2015 que as empresas, as grandes financiadoras do mundo político, continuassem a abastecer as campanhas. Coisa de R$ 3,5 bilhões, sob a autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado.

    Aliado a isso, trama-se passar uma série de penduricalhos com o objetivo de beneficiar candidatos e partidos, como regras mais do que generosas para pagamento de multas eleitorais, e medidas polêmicas, como a proibição de divulgação de pesquisas eleitorais na semana anterior à eleição, medida que já foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em 2006.

    Temas de maior relevo na opinião de especialistas passaram ao largo dos debates ou foram derrotados. Como o fim da obrigatoriedade do voto e a instituição do modelo eleitoral distrital misto (em que metade das cadeiras do Legislativo é ocupada pelos mais votados nos distritos eleitorais em que os Estados e cidades seriam divididos, e a outra metade, por meio do atual modelo ou por lista de candidatos pré-ordenada pelos partidos).

    Em todas as tentativas de reforma política das últimas décadas prevaleceu sempre o improviso, a falta de entendimento mínimo, e tentativas de amenizar as regras de fiscalização e de controle de partidos e candidatos.

    Em várias das ocasiões coube ao Judiciário, para o bem ou para o mal, realizar mudanças de mais vulto, como a já citada proibição do financiamento empresarial das campanhas e as regras de fidelidade partidária, em 2008 –que foram abrandadas pela própria Justiça posteriormente.

    Uma das explicações dadas para os sucessivos fracassos legislativos nas tentativas de reforma política é a tendência de os congressistas resistirem a mudar um modelo que lhes garantiu o cargo.

    Muitos, como o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), defendem uma Constituinte exclusiva para debater a mudança do sistema político. Ou seja, formada por gente que em tese não será afetada pelas mudanças.

    Uma coisa é certa: apesar de todo o improviso, amadorismo e falta de objetivos nobres na atual discussão sob o abrigo do Congresso, outras tentativas virão. Vai que cola.

    *

    REFORMA POLÍTICA EM CAPÍTULOS
    Aprovado em comissão e em discussão

    COLIGAÇÃO

    Como é hoje
    Partidos podem se unir para que os votos dados a todos os integrantes da aliança sejam contabilizados juntos para definir número de deputados eleitos. Assim, se o partido A estiver coligado ao partido B, os votos dados ao primeiro também ajudam a eleger candidatos do segundo

    Aprovado em comissão
    Deixa de existir nas eleições proporcionais de 2018

    CLÁUSULA DE BARREIRA

    Como é hoje
    Já há regras que restringem o financiamento e o tempo de propaganda na TV para legendas com baixo desempenho nas urnas

    Aprovado em comissão
    > 2018: Terão acesso ao fundo partidário e à propaganda gratuita os partidos que obtiverem na Câmara 1,5% dos votos válidos em ao menos nove Estados, com mínimo de 1% em cada ou que tiverem elegido ao menos nove deputados em nove Estados
    > 2022: Percentual sobe para 2% dos votos válidos em nove Estados com um mínimo de 1% em cada Estado ou 11 deputados eleitos em nove Estados. E assim progressivamente até 2030

    FEDERAÇÃO

    Como é hoje
    Não existe

    Aprovado em comissão
    Partidos com "afinidade ideológica e programática" podem se unir em federações, com direito a acessar recursos do fundo partidário e tempo de rádio e televisão. Nos Estados, é possível fazer subfederações para as eleições

    FUNDO ELEITORAL

    Divisão do fundo eleitoral

    Como é hoje
    Existe o fundo partidário, que deve direcionar cerca de R$ 1 bilhão às legendas em 2017

    Em discussão
    Criação de mais um fundo público, cujo valor seria definido a cada eleição

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