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    ANÁLISE

    Reforma política se resume a remendo eleitoral

    RANIER BRAGON
    DE BRASÍLIA

    22/09/2017 02h00

    Pedro Ladeira/Folhapress
    Sessão no plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília (DF) referente a votação da PEC da reforma política
    Plenário da Câmara dos Deputados em sessão da reforma política

    Desde a Constituição de 1988, o Congresso tem sido campo fértil de tentativas de reforma política. Neste ano, lançou-se uma cruzada por mais uma.

    Bem no início dos debates, o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), veterano de outras empreitadas que falharam, afirmou em um tom não muito otimista que se resignava a embarcar em mais uma. "Vai que cola."

    Após incontáveis reuniões, conchavos, audiências públicas, debates, análises, bate-bocas, adiamentos e tentativas frustradas de votação, a resposta é: não colou.

    A duas semanas do prazo final para que tudo seja aprovado pelo Congresso e promulgado ou sancionado –caso contrário não vai valer nas eleições de 2018–, o balanço é decepcionante.

    Se muito, deputados e senadores conseguirão emplacar apenas três mudanças de algum relevo:

    1) Uma regra para tentar barrar a proliferação de legendas nanicas, mas que foi bastante amenizada em relação à proposta original e que terá o efeito desejado por alguns, o de reduzir as atuais 35 legendas do país para menos da metade, lá pela década de 2030 em diante.

    2) A proibição da coligação entre partidos (excrescência que une legendas sem nenhuma identidade ideológica ou pragmática, apenas para fins eleitorais) nas eleições de deputados e vereadores. Mas só para valer a partir da disputa de 2020. Ou seja, o atual Congresso considera a medida válida, mas só nos olhos dos outros –no caso, dos vereadores, que terão que implantar o modelo na disputa municipal de 2020.

    3) A criação de mais um fundo público de campanha para abastecer os candidatos. Real motivação da atual reforma, já que políticos ficaram sem saber como conseguir dinheiro após o Supremo Tribunal Federal proibir em 2015 que as empresas, as grandes financiadoras do mundo político, continuassem a abastecer as campanhas. Coisa de R$ 3,5 bilhões, sob a autoria do senador Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado.

    Aliado a isso, trama-se passar uma série de penduricalhos com o objetivo de beneficiar candidatos e partidos, como regras mais do que generosas para pagamento de multas eleitorais, e medidas polêmicas, como a proibição de divulgação de pesquisas eleitorais na semana anterior à eleição, que já foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal em 2006.

    Temas de maior relevo na opinião de especialistas passaram ao largo dos debates ou foram derrotados. Como o fim da obrigatoriedade do voto e a instituição do modelo eleitoral distrital misto (em que metade das cadeiras do Legislativo é ocupada pelos mais votados nos distritos eleitorais em que os Estados e cidades seriam divididos, e a outra metade, por meio do atual modelo ou por lista de candidatos pré-ordenada pelos partidos).

    Em todas as tentativas de reforma política das últimas décadas prevaleceu sempre o improviso, a falta de entendimento mínimo, e tentativas de amenizar as regras de fiscalização e de controle de partidos e candidatos.

    Em várias das ocasiões coube ao Judiciário, para o bem ou para o mal, realizar mudanças de mais vulto, como a já citada proibição do financiamento empresarial das campanhas e as regras de fidelidade partidária, em 2008 –que foram abrandadas pela própria Justiça posteriormente.

    Uma das explicações dadas para os sucessivos fracassos legislativos nas tentativas de reforma política é a tendência de os congressistas resistirem a mudar um modelo que lhes garantiu o cargo.

    Muitos, como o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ), defendem uma Constituinte exclusiva para debater a mudança do sistema político. Ou seja, formada por gente que em tese não será afetada pelas mudanças.

    Uma coisa é certa: apesar de todo o improviso, amadorismo e falta de objetivos nobres na atual discussão sob o abrigo do Congresso, outras tentativas virão. Vai que cola.

    A EMENDA E O SONETO
    Depois de meses de debate, reforma política deve se resumir, se muito, a alterações eleitorais pontuais. Para valer na disputa de 2018, tudo tem que ser aprovado e estar sancionado ou promulgado até o final da primeira semana de outubro

    Sistema para eleição de deputados e vereadores

    COMO É HOJE
    Proporcional: cadeiras são distribuídas com base em um cálculo que considera todos os votos dados aos candidatos do partido ou coligação (eleitos e não-eleitos), além do voto na legenda

    QUAL ERA A PROPOSTA ORIGINAL
    Distritão: São eleitos os mais votados. Os votos dados aos não eleitos e aqueles dados em excesso aos eleitos são desprezados. Não existe voto em legenda. A partir de 2022, o distrital misto: metade das cadeiras é preenchida pelo mais votado em cada distrito (o Estado -ou cidade, no caso da eleição para vereadores- é dividido em distritos). A outra metade, pelo sistema proporcional: votação em lista fechada de candidatos elaborada pelos partidos

    COMO FICOU
    Proposta derrotada. Nada muda

    Suplente de senador

    COMO É HOJE
    Candidatos ao Senado escolhem seus suplentes, que na ausência do titular assumem o mandato mesmo sem ter um voto sequer

    QUAL ERA A PROPOSTA ORIGINAL
    Suplente seria o deputado mais votado do partido ou da coligação

    COMO FICOU
    Proposta derrotada. Nada muda

    Vices

    COMO É HOJE
    Presidente, governadores e prefeitos são eleitos em chapa com vices, que ocupam a vaga na ausência do titular

    QUAL ERA A PROPOSTA ORIGINAL
    Acaba a figura do vice. Primeiro na linha sucessória seria o chefe do Legislativo

    COMO FICOU
    Proposta derrotada. Nada muda

    Coligações para eleição de presidente, governadores e prefeitos

    COMO É HOJE
    Partidos podem se coligar livremente. Não raro, siglas nacionalmente antagônicas, como PT e DEM, se unem nas disputas regionais. O objetivo principal dessas alianças é conseguir ampliar o tempo de propaganda eleitoral do candidato, que é definido de acordo com o tamanho da coligação

    QUAL ERA A PROPOSTA ORIGINAL
    Não houve proposta

    COMO FICOU
    Nada muda

    Coligações para eleição de deputados e vereadores

    COMO É HOJE
    Partidos podem se coligar livremente. Não raro, siglas nacionalmente antagônicas, como PT e DEM, se unem nas disputas regionais. O objetivo principal dessas alianças é conseguir o maior número de votos para a chapa. Isso porque as cadeiras do Legislativo são distribuídas de acordo com o número de votos obtidos por candidatos eleitos e não eleitos do partido ou da coligação

    QUAL ERA A PROPOSTA ORIGINAL
    Acaba a coligação ampla e irrestrita. Mas mantêm-se a possibilidade de união de legendas com "afinidade ideológica e programática" em federações, que deverão cumprir o mandato de forma unitária nos Legislativos. Na eleição às Assembleias e Câmara municipais essa federação poderá ser fatiada em subfederações

    COMO FICOU
    Pendente de votação final da Câmara. Após isso, tem que ser ratificada pelo Senado

    Cláusula de desempenho (ou de barreira)

    COMO É HOJE
    Partidos com baixo desempenho nas urnas já têm algumas restrições ao seu funcionamento, como uma menor fatia das verbas públicas e do tempo de propaganda partidária e eleitoral

    QUAL ERA A PROPOSTA ORIGINAL
    Partidos que não obtivessem em 2018 pelo menos 2% dos votos nacionais para deputado federam perderiam acesso às verbas públicas e à propaganda partidária na TV, mecanismos essenciais à sua existência

    COMO FICOU
    Proposta abrandada (*) aguarda votação final na Câmara. Após isso, tem que ser ratificada pelo Senado

    Financiamento eleitoral

    COMO É HOJE
    Empresas estão proibidas de doar a candidatos. Recursos vêm de pessoas físicas, do bolso dos próprios candidatos e dos cofres públicos (fundo partidário, que deve chegar próximo de R$ 1 bilhão no ano que vem, além de renúncia fiscal de TVs e rádios para veiculação da propaganda eleitoral)

    QUAL ERA A PROPOSTA ORIGINAL
    Criação de um mais um fundo público de R$ 3,6 bilhões, ampliação do limite para doação de pessoas físicas

    COMO FICOU
    Câmara e Senado têm propostas similares que podem ser votadas nos próximos dias

    Pesquisas eleitorais

    COMO É HOJE
    Podem ser divulgadas até no dia da eleição. Institutos devem divulgar uma série de informações sobre o contratante e a pesquisa pelo menos cinco dias antes da publicação dos dados

    QUAL ERA A PROPOSTA ORIGINAL
    É vedada a divulgação de pesquisas eleitorais a partir do domingo anterior à data das eleições. Institutos deverão divulgar informações sobre o contratante e a pesquisas pelo menos 10 dias antes da publicação, incluindo o nome do estatístico responsável, entre outras exigências

    COMO FICOU
    Aguarda votação na Câmara. Após isso, vai ao Senado

    *Partidos que não obtiverem 1,5% dos votos válidos nacionais a deputado federal perdem acesso às verbas públicas e à propaganda partidária na TV

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