• Poder

    Saturday, 04-May-2024 10:06:18 -03

    Juízes promovem concerto em entidade pivô de fraude

    FREDERICO VASCONCELOS
    DE SÃO PAULO

    15/10/2017 02h00

    A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) vai comemorar os 50 anos da reinstalação da Justiça Federal no país com um concerto de piano na Fundação Habitacional do Exército (FHE), em Brasília.

    A Folha revelou há exatamente sete anos que a fundação do Exército foi palco da maior fraude já praticada por magistrados.

    Durante dez anos, a Associação dos Juízes Federais da 1ª Região (Ajufer) —segunda maior entidade de magistrados federais do país— desviou recursos da FHE por meio de contratos fictícios em nome de juízes que desconheciam o golpe.

    A associação rolou mensalmente empréstimos não quitados. Parte desse mensalão da toga era depositada em contas de doleiros e laranjas.

    O convite para o concerto está sendo distribuído em nome do juiz federal Roberto Veloso, presidente da Ajufe, ele mesmo uma das vítimas da trama. "Meu nome foi usado fraudulentamente cinco vezes", revelou na ocasião.

    Veloso disse que o apoio "não é patrocínio".

    Antes de dirigir a associação nacional, ele presidiu a entidade que representa juízes do Distrito Federal e de 13 Estados. Veloso assumiu a presidência depois que o desfalque veio à tona. Determinou uma investigação por juízes federais especializados em julgar crimes financeiros.

    As obras de Schubert e Prokofiev que serão executadas no dia 19 pelo pianista Fernando Calixto, no auditório da FHE, podem ser interpretadas como uma reaproximação. Mas continua na pauta uma dívida de R$ 32,6 milhões que a fundação cobra na Justiça.

    A Ajufer chamou à responsabilidade todos os ex-presidentes e tesoureiros que assinaram os contratos fictícios.

    A associação ingressou na Justiça com denunciação à lide, ou seja, passou do polo passivo para o ativo na ação de cobrança movida pela FHE.

    Uma ação penal sigilosa se arrasta no TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região), em Brasília.

    Foram denunciados quatro ex-presidentes da Ajufer, um ex-diretor da Fundação Habitacional do Exército e outros dois réus, apontados como agiotas e doleiros. Eles foram acusados dos crimes de gestão fraudulenta, falsidade material e ideológica, apropriação indébita e lavagem de dinheiro. Eles alegam inocência.

    Veloso afirma que a recepção, com "vinho de honra", será integralmente custeada pela Ajufe.

    Em 2013, o Conselho Nacional de Justiça editou resolução que regulamenta e limita a participação de magistrados em eventos.

    Um dos artigos prevê que "a restrição não se aplica aos eventos promovidos e custeados com recursos exclusivos das associações de magistrados". A Ajufe questionou essa resolução, mas a ação está parada há três anos no Supremo Tribunal Federal.

    A Ajufe já foi acusada por um juiz associado de atuar como "laranja", captando recursos de empresas privadas para custear programa de interesse do TRF-2 (RJ e ES), que reuniu magistrados e convidados em um resort de luxo em Búzios (RJ). E ajudou a levantar dinheiro da Caixa Econômica Federal para uma festa em homenagem à posse do ministro Dias Toffoli no STF.

    As associações alegam que são entidades privadas e consideram hipocrisia imaginar que juízes fiquem influenciados ao julgar ações em que são partes os patrocinadores.

    OUTRO LADO

    O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Roberto Veloso, diz que o apoio da Fundação Habitacional do Exército (FHE), "não é patrocínio".

    "Eles cederam apenas o auditório, porque tem o piano no qual o pianista irá realizar o concerto. O auditório da FHE foi escolhido pelo pianista pela qualidade da acústica e do piano, portanto, a escolha foi técnica", diz.

    "O evento foi organizado pelo diretor Cultural da Ajufe, Marcos Mairton, que aprovou a escolha. Eu o orientei a custearmos toda a despesa, inclusive de bebidas".

    "Não vi problema porque a FHE não irá custear nenhum valor a título de patrocínio e a Ajufe nunca teve com ela qualquer relação", diz Veloso.

    "Os eventos ocorridos com a Ajufer foram praticados por pessoas que foram identificadas e não se encontram mais na FHE. Não temos convênio com a FHE e não estamos recebendo valores dela. Qualquer vinculação nesse sentido é fruto de ilações maldosas e sem fundamento", afirma o presidente da Ajufe.

    A Fundação Habitacional do Exército informa que cedeu, sem ônus, o auditório. A FHE diz que "não tem nenhuma responsabilidade pelo planejamento e pela organização da cerimônia".

    "A cessão do espaço somente é permitida em função de disponibilidade interna e sem a cobrança de nenhuma taxa para instituições ligadas às Forças Armadas e ao Executivo e Judiciário", afirma a FHE, em nota.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024