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    Lava Jato

    Pivô da Lava Jato, Odebrecht fala nos EUA de vida empresarial pós-delação

    ESTELITA HASS CARAZZAI
    DE WASHINGTON

    01/12/2017 02h00

    "O que fazer se sua companhia está direta ou indiretamente implicada na Operação Lava Jato?"

    A pergunta, em inglês, era um dos tópicos do painel de que a Odebrecht participou nesta quarta (29) em Washington –a construtora fechou acordo de delação com o Departamento de Justiça americano (DoJ) e admitiu pagamento de US$ 1 bilhão de propina em 12 países, no que foi considerado o maior caso de corrupção da história.

    A empresa foi chamada a compartilhar lições sobre transparência e práticas anticorrupção.

    "Não é para dar lição. Compliance [termo que designa regras de conformidade] é dia após dia. Mas nessa busca existem práticas aprendidas, sim", disse a executiva Olga Pontes à Folha.

    Pontes, responsável pela área de conformidade da empresa, foi quem representou a Odebrecht na Conferência Internacional de Foreign Corrupt Practices Act, a lei americana pioneira no combate à corrupção.

    Faz um ano e meio que ela assumiu o setor, após as revelações da Lava Jato.

    Criou um departamento para fiscalizar as condutas empresariais do grupo, que responde ao Conselho de Administração, a mais alta instância da holding.

    A equipe inicial de 20 pessoas mais que triplicou, e hoje tem 73 funcionários. O ritmo de trabalho é intenso: para viajar a Washington, a executiva abriu uma exceção à licença maternidade –e ficou num hotel vizinho ao que abrigava a conferência, US$ 150 mais barato.

    Pontes diz ter independência para investigar quem quiser. O trabalho é fiscalizado por monitores apontados por autoridades brasileiras e americanas, com quem fizeram acordo.

    "Nós estamos em voo de cruzeiro. A única trava é a desconfiança do público", afirmou a executiva.

    CURIOSIDADE

    "Lava Jato" era uma expressão comum nos corredores do evento –assim mesmo, em português e, às vezes, com sotaque americano. O painel de que a Odebrecht participou, uma mesa redonda sobre a América Latina, tinha a participação de outros dois brasileiros. Na plateia, mais algumas dezenas deles.

    "Há seis anos, quando vim para a conferência pela primeira vez, só tinha eu de brasileiro", lembra Pontes, que antes trabalhou em multinacionais de auditoria e na Braskem, ligada ao grupo Odebrecht.

    A capital norte-americana, que sediou o evento, é também sede do DoJ. Mais cedo, o líder do setor anticorrupção do departamento americano, Daniel Kahn, comentava o "fenomenal trabalho da Lava Jato" no Brasil. Elogiou empresas que buscam práticas de compliance, mas sem citar nomes.

    Maior companhia envolvida na investigação, a Odebrecht era o alvo preferencial das perguntas no painel desta quarta (29).

    Alguns queriam saber como a empresa renovou seu relacionamento com o poder público. Outros, como fez o conselho se subordinar às decisões de conformidade.

    "Fico grata, apesar de todo esse processo desgastante e doloroso, que a Odebrecht seja uma vitrine para outras empresas não quererem cometer os erros que ela cometeu", comentou a executiva.

    Segundo ela, a tolerância contra malfeitos hoje na empresa é "zero".

    O sistema de denúncias anônimas foi aperfeiçoado, é administrado por uma empresa independente e já resultou em demissões. "As pessoas ligam até para dizer que sumiu um real da mesa de trabalho", comenta a executiva.

    Pontes quer fazer com que a Odebrecht seja reconhecida no futuro como uma companhia de atuação ética, íntegra e transparente –mais uma vez, uma meta recebida com desconfiança.

    A construtora está vendendo parte dos ativos para pagar as multas com a Justiça, que chegam a R$ 8,5 bilhões. O número de funcionários caiu de 200 mil para 80 mil.

    A empresa já tem outros dois convites para palestras internacionais. Mas continua sob fiscalização: o monitoramento imposto pelas autoridades no acordo de delação só acaba daqui a dois anos.

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