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    Incerteza sobre autofinanciamento é retrato da volatilidade da lei eleitoral

    DIOGO RAIS
    ESPECIAL PARA A FOLHA

    22/12/2017 02h00

    Pedro Ladeira/Folhapress
    Plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília, em votação da reforma política
    Plenário da Câmara dos Deputados, em Brasília, em votação da reforma política

    Antigamente não havia uma lei para ser aplicada a todas as eleições. Entre 1988 e 1997, cada pleito teve uma regra diferente. Vigorava a insegurança jurídica.

    Em 1997 veio a Lei Geral das Eleições (lei 9.504), pretendendo regrar, de forma geral e perene, as votações brasileiras. Na prática, isso não deu tão certo assim.

    Se antes havia uma lei nova para cada eleição, hoje temos quase três a cada pleito.

    O Código Eleitoral, a Lei de Inelegibilidades, a Lei dos Partidos Políticos e a Lei 9.504/97 foram alteradas 29 vezes nos últimos 20 anos, período em que tivemos apenas 10 eleições.

    É possível afirmar que todo ano par é de eleição e quase todos os ímpares são de reformas eleitorais. A última, por exemplo, veio em um combo com duas leis e uma emenda à Constituição.

    Uma de suas polêmicas está no autofinanciamento de campanha (uso do dinheiro do próprio candidato).

    Em 2017 o Legislativo incluiu um limite de autofinanciamento correspondente a 10% da renda bruta auferida pelo candidato no ano anterior. Se, por exemplo, um candidato a presidente da República ganhou R$ 70 milhões, poderia usar no máximo R$ 7 milhões.

    Entretanto, o presidente Michel Temer vetou este limite de 10%. No caso hipotético, para presidente da República seria possível que o candidato utilizasse até R$ 70 milhões de seu próprio dinheiro na campanha, portanto.

    Neste mês, no entanto, o Legislativo revogou parte do veto presidencial, trazendo de volta o limite de 10%.

    A derrubada do veto levou a uma dúvida: qual o limite de autofinanciamento para as eleições de 2018? Nesse momento, não podemos ter certeza da resposta.

    Com a controvérsia jurídica, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Gilmar Mendes, afirmou que caberá à corte definir os limites do autofinanciamento para 2018. A questão poderá parar no Supremo Tribunal Federal.

    Um ponto essencial é que a derrubada do veto presidencial se deu a menos de um ano da eleição, que ocorrerá em 7 de outubro. O artigo 16 da Constituição impede a imediata aplicação de normas que alterem o processo eleitoral caso não haja, no mínimo, um ano de intervalo entre a mudança e a eleição.

    Por isso, não seria possível aplicar este limite de 10% de autofinanciamento para a eleição de 2018.

    Em outras palavras, os efeitos da alteração deveriam ser aplicados apenas em eleição que ocorra além de um ano.

    Isso porque a derrubada do veto deveria ser equiparada à entrada de um novo dispositivo legal -que neste caso, poderia ser aplicado somente a partir das eleições municipais de 2020.

    A não ser, obviamente, que o TSE e/ou o STF entendam que mudar regras de financiamento não alteram o processo eleitoral. Ou que o veto presidencial não gerou efeito algum.

    O que não há dúvidas é que entraremos no ano eleitoral sem ter certeza sobre qual é o limite do autofinanciamento de campanha.

    A volatilidade da lei eleitoral deixa todos mais confusos e inseguros -incluindo juízes, promotores e advogados que atuam no âmbito eleitoral.

    A incerteza tende a distanciar cada vez mais a população do jogo democrático e das regras eleitorais. Afinal, em tantas eleições que tivemos, não conseguimos fazer, sequer, duas com as mesmas regras eleitorais.

    DIOGO RAIS é professor de Direito Eleitoral da Universidade Presbiteriana Mackenzie

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