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    Futuro conectado requer tecnologia mais acessível

    EMERSON KIMURA
    DE SÃO PAULO

    11/03/2013 03h30

    O futuro terá aparelhos e sistemas mais inteligentes, conectados e fáceis de usar.

    E, para chegar a ele, será necessário superar alguns obstáculos, entre os quais se destacam problemas de custo, energia e usabilidade --questões antigas que persistem até hoje. "Os principais desafios não mudam muito", diz Steve Furber, professor da Universidade de Manchester e um dos criadores do computador BBC Micro e do processador ARM.

    "Nós temos hoje, nos nossos bolsos, um poder computacional maior do que o usado para enviar astronautas da missão Apollo à Lua", diz Brian David Johnson, futurólogo da Intel. "Mas um dos obstáculos que ainda precisamos superar é: ainda há muitas pessoas sem esse poder nos seus bolsos, que não estão aproveitando os benefícios da tecnologia."

    Paulo Iudicibus, diretor de novas tecnologias e inovação da Microsoft, concorda com Johnson e acredita que o acesso à tecnologia poderá ser ampliado com a esperada "explosão de dispositivos de todos os preços, tamanhos e tipos".

    "O mundo será conectado com informações nas nuvens, acessadas por televisão, geladeira, automóvel, telefone", diz Ronaldo Miranda, gerente-geral da AMD Brasil. "Qualquer dispositivo será a porta de entrada desse mundo conectado."

    USABILIDADE

    Os problemas de acessibilidade não se limitam aos custos. Todo esse conjunto de novos aparelhos e sensores precisará também ser fácil de usar.

    "A interface homem-máquina é um problema", diz Fernando Martins, presidente da Intel Brasil. "É muito difícil interagir com a máquina. O teclado é uma coisa ineficiente, o uso do mouse é ineficiente, e mesmo a pessoa conseguir se expressar por meio de uma tela sensível ao toque é uma coisa bastante limitada."

    A capacidade de o computador entender o que vê --algo que poderia facilitar muito a interação entre homem e máquina-- também é limitada, afirma Martins. "Uma criança de cinco anos de idade é capaz de ver um gato e identificar que aquilo é um gato, mesmo que nunca tenha visto um antes; de ver uma cadeira com um formato um pouco diferente e identificar que aquilo é uma cadeira. A capacidade de identificação que uma criança de três ou cinco anos já tem, uma máquina hoje ainda não tem. Ela não consegue fazer isso [identificar o que vê] de uma forma eficaz."

    "Seu smartphone e seu tablet têm olhos --câmeras--, mas eles não têm ideia do que estão vendo", reforça Furber, da Universidade de Manchester. "Durante os próximos cinco ou dez anos eu espero que isso mude e que esses dispositivos tenham alguma compreensão do que a câmera vê. Isso possibilitará comandos por gestos, por exemplo, que já estão chegando a TVs, já estão presentes no Kinect etc. Mas também possibilitará que você pergunte ao seu celular 'quando foi a última vez que vi o Fred?', e ele responda 'acho que ele estava naquele encontro em Londres na semana passada'."

    "Por que, ao comprar um novo produto eletrônico, você precisa aprender a usá-lo? Em vez disso, não deveria ele aprender como você quer usá-lo, como um bom assistente humano faria?", questiona Furber. "Mas isso requer que o produto monte um modelo de seu usuário, assim como nós todos montamos modelos das pessoas com quem interagimos. Isso exige um monte de avanços na compreensão da inteligência natural, uma área de pesquisa que ainda não foi resolvida porque entender o cérebro humano tem provado ser um desafio científico muito difícil."

    Para o futurólogo Johnson, a solução pode estar na própria onipresença de poder computacional. Ele acredita que, até o ano 2020, poderemos transformar qualquer coisa em um computador. "A minha mesa em um computador, a minha jaqueta em um computador, até o meu corpo em um computador", exemplifica.

    Com isso, viveremos em um ambiente rodeado por inteligência computacional. "A maior parte da computação poderá estar no mundo ao nosso redor --em sensores, em prédios, em objetos cotidianos. E tanto poder computacional poderá permitir que as tecnologias nos entendam, em um nível humano."

    Nesse cenário, as tecnologias entenderiam quem é você --"a sua história, como você aprende, como você fala, com quem você trabalha"-- e poderiam se tornar "hiperpersonalizadas".

    "Isso significa que nós podemos começar a interagir com tecnologias não apenas por meio de toque, voz ou gestos, mas simplesmente vivendo com elas. Ao viver em um mundo rodeado por poder computacional, seus dispositivos poderão ter um entendimento muito mais profundo de quem é você e poderão mudar conforme as suas necessidades."

    E viver em meio a tanta tecnologia poderá até nos permitir ser mais humanos, diz Johnson. "Nós agiremos e interagiremos com ela de uma maneira muito mais humana, mais natural, pois haverá muito mais inteligência em muito mais computadores. (...) A tecnologia vai nos entender em um nível bem pessoal."

    Iudicibus, da Microsoft, acredita em um cenário semelhante, com computadores mais onipresentes, "invisíveis" e proativos. "O computador hoje ainda é passivo. Eu dou comandos para ele, e ele me retorna. À medida que ele começar a me entender, ele poderá saber onde estou, sugerir uma coisa, enviar informação, fazer alguma coisa para mim."

    ENERGIA

    Tanta evolução exigirá melhoras para um uso de energia mais eficiente, diz Furber. "Esse é um dos grandes desafios em computação --dos smartphones aos supercomputadores." Segundo ele, o custo de ter um computador hoje está mais concentrado no uso total de energia do que no preço do hardware. "Eficiência de energia é fundamental."

    "A bateria em nossos aparelhos móveis ainda precisa ser muito grande e acaba por ser a grande responsável pelo peso e pelo espaço ocupado dentro deles --tudo porque o seu consumo de energia ainda é muito alto", diz Marcel Campos, diretor de produtos da Asus Brasil.

    "Ainda dependemos de energia elétrica gerada em grandes matrizes, como usinas hidroelétricas, para que nossos aparelhos funcionem. Eles ainda não são capazes de captar energia por si só de forma eficiente. (...) Ainda dependemos do mesmo modelo de ligar nossos aparelhos na tomada para que sejam recarregados, ainda dependemos de fios para transportar energia de forma eficiente."

    O QUE FAZER?

    "Há décadas, nos últimos 30 anos, temos nos perguntado: podemos fazer isso?", diz Johnson. "Podemos pegar um computador mainframe e diminuí-lo para caber na sua mesa? Podemos pegar um computador desktop e diminuí-lo para usá-lo no colo? Podemos pegar um laptop e diminuí-lo para ele caber no bolso?"

    Para o futurólogo da Intel, em uma era na qual caminhamos para conseguir transformar qualquer coisa em um computador, não devemos mais nos perguntar se podemos fazer algo, mas o que e por que fazer.

    "Se é possível transformar a minha jaqueta em um computador, isso é ótimo, mas o que fazer com ela e por quê? E, se podemos transformar o meu corpo em um computador, o que fazemos com ele, e por quê?"

    Ao fazer essas novas perguntas, algo interessante ocorre, reflete Johnson: "O obstáculo torna-se a nossa imaginação".

    O que criamos é apenas limitado pela nossa imaginação, diz ele. "Para os próximos 30 anos, acho que o nosso maior obstáculo será a nossa habilidade de imaginar os futuros que nós queremos viver e também os futuros que nós não queremos viver."

    Para Iudicibus, o próprio ser humano é o maior obstáculo a ser vencido. A tecnologia continuará a se desenvolver rapidamente, diz ele, mas "o ser humano, infelizmente, não progride da mesma maneira".

    O executivo da Microsoft lamenta que a tecnologia seja pouco usada para resolver grandes problemas da humanidade, como desigualdade social, analfabetismo, epidemias e doenças incuráveis.

    Essas questões são preteridas, acredita ele. O uso da tecnologia para resolvê-las ainda é "mais devagar do que o uso para fins comerciais".

    "Nós mesmos podemos ser a barreira do poder enorme que poderíamos criar com a tecnologia. Somos mais lentos do que a evolução tecnologicamente permitiria."

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