• Tec

    Monday, 06-May-2024 01:28:30 -03

    Analogia com eletricidade ajuda a entender neutralidade de rede

    NEIL IRWIN
    DO "NEW YORK TIMES"

    12/11/2014 06h30

    É uma das mais importantes disputas acerca do futuro da internet, e agora o presidente dos EUA Barack Obama formalmente se posicionou a favor da neutralidade de rede. O que vinha sendo há muito tempo uma discussão entre lobistas da tecnologia e das telecomunicações agora deve ser alçado ao debate do público em geral.

    Ainda que haja uma enorme dificuldade em entender leis de telecomunicações, há uma maneira muito simples de pensar esse debate: seria o acesso à internet algo como a eletricidade, ou mais como um serviço de TV a cabo?

    As fornecedoras de energia elétrica fazem um trabalho notável nos EUA. Quase toda vez que eu pressiono um interruptor na minha casa, a energia que foi gerada em alguma usina distante e que flui por uma complexa rede de transformadores e de linhas elétricas conseguem de alguma maneira chegar às lâmpadas acima das nossas cabeças.

    Obama

    Pago minha fornecedora (a Pepco, no meu caso, que serve a capital Washington) uma boa tarifa por esse serviço todo mês, atrelado a quanto dessa energia eu usei e ao atual preço do quilowatt-hora, com alguma sobra para que a companhia tenha um confortável lucro.

    Mas, além disso, a Pepco não exerce um papel em determinar para que uso minha internet.

    A empresa não oferece um serviço mais estável e barato se eu usar sua marca preferida de eletrodoméstico, com a qual a fornecedora teria algum arranjo empresarial. Eles não sabem, muito menos controlam, que tipo de lâmpada ou de secadora de roupa eu aciono com a eletricidade que eles me vendem.

    Sim, há alguns esforços por fornecedoras de eletricidade para que eu e os demais consumidores poupemos energia, especialmente nos horários de pico, mas isso tem mais a ver com a redução do consumo quando custa mais para gerar do que com uma hipotética oferta especial da Pepco.

    Posto de lado toda a complexidade técnica de gerar e distribuir eletricidade, o acordo econômico é muito simples: eu lhes dou dinheiro; eles me dão energia elétrica. Faço o que quiser com ela.

    As coisas são diferentes com serviço de TV a cabo.

    A Comcast, minha provedora, me oferece um cardápio de pacotes que eu posso escolher, cada um com uma seleção diferente de canais. Faz longas e árduas negociações com os proprietários desses canais e tem um diferente acordo com cada um deles. Os detalhes dos contratos são opacos para mim como consumidor; tudo o que sei é que posso conseguir futebol por X dólares ou filmes por Y dólares etc.

    Agências reguladoras podem restringir os preços para os oferecimentos mais básicos de TV a cabo. Mas o serviço mais extensivo de TV a cabo é considerado um bem supérfluo, e as companhias têm liberdade para dar o preço que o mercado suportar, oferecendo a cesta de canais que lhes parecer melhor.

    O lado ruim é que é muito fácil acabar pagando algumas centenas de dólares por mês por esse serviço. O lado positivo é que este funcionamento dá uma profusão de novos canais e de opções de entretenimento.

    Seja sua preferência uma por teledramaturgia de roteiro literário de alta qualidade, seja por reality shows "trash" ainda que interessantes ou por esportes em todo canto do mundo, você tem mais opções que nunca nos EUA, tanto ao vivo quanto à la carte. É uma melhoria genuína em relação às opções americanas só uma geração mais velhas.

    E isso nos traz de volta à neutralidade de rede.

    Uma teoria do caso, e que a administração do presidente Obama abraçou publicamente na segunda-feira (10), é que a internet é como eletricidade. É fundamental para a economia do século 21, tão essencial para o funcionamento da sociedade moderna quanto a eletricidade.

    É utilidade pública. "Não podemos permitir que os provedores de serviço restrinjam o melhor acesso ou escolham vencedores e perdedores no mercado on-line de serviços e de ideias", disse o presidente em seu comunicado por escrito.

    Na lógica do presidente, e na das empresas de conteúdo de Internet (Facebook e Google, por exemplo), que são as maiores apoiadoras da neutralidade, assim como sua fornecedora elétrica não tem uma palavra sobre como você usa a eletricidade, a internet deveria ser uma confiável maneira de acessar conteúdo produzido por qualquer um, independentemente de eles terem qualquer acordo de negócios com quem fornece o serviço.

    Os que argumentam contra a neutralidade de rede, mais significantemente as empresas de banda larga e TV a cabo, dizem que a internet será uma experiência mais rica se o ímpeto por lucro for aplicado, eles poderão negociar com grandes provedores de conteúdo, como o Netflix e o Hulu, para que eles paguem pelo privilégio.

    O mesmo tipo de modelo de negócios que criou um "boom" em conteúdo para os consumidores de TV a cabo pode criar um ambiente mais fértil para uma explosão de criatividade na internet, seguindo essa lógica.

    Também daria ao provedor de internet uma considerável alavancagem econômica. Seria, no mundo da rede não neutra, permitido aumentar a velocidade com a qual você acessa serviços, ou bloqueá-los completamente, da mesma maneira que você não pode assistir a um canal que seu provedor escolhe não oferecer (talvez por causa de uma discordância com o canal acerca de taxas).

    Tenha em mente que não significa que o debate está finalizado só porque a administração Obama se posicionou. A decisão, assim como diz o comunicado presidencial, pertence à FCC (Comissão Federal de Comunicações dos EUA). Independentemente do que for decidido, o que está em jogo é uma questão que atinge o núcleo do papel que a internet exercerá em nosso dia a dia.

    [an error occurred while processing this directive]

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024