Dois populares jogadores de videogame, vestindo camisetas pretas, faziam pose de atiradores de elite, armados com fuzis semiautomáticos reais em um estande de tiro ao ar livre. Em câmera lenta, eles disparavam contra frutas e contra copos cheios de um líquido laranja escuro. "Apresentando Blood Orange", anunciava o vídeo do espetáculo.

Nos dias seguintes, a audiência on-line –formada por adeptos frenéticos de games– encomendou mais e mais garrafas do produto, o mais recente sabor de um energético chamado G Fuel, divulgado como a receita secreta para melhorar o foco e a resistência dos envolvidos em batalhas virtuais.

"Oh, o gosto disso vai ser tão bom", exclamou Michael, um menino de cara angelical, em um vídeo no YouTube que mostrava ao fundo seu beliche ainda desarrumado.

O G Fuel e um concorrente chamado GungHo são a nova encarnação das bebidas energéticas e estão ganhando popularidade em um momento no qual o segmento de energéticos está sob escrutínio por causa de mortes e hospitalizações vinculadas ao consumo dessas bebidas, carregadas de cafeína e de açúcar.

	Bryan Thomas/The New York Times
	Ethan Yorke, um estudante de ensino médio que já tomou a bebida G Fuel para jogar melhor

Os fabricantes de energéticos também vêm tentando atender à crescente cultura dos gamers, lançando marcas como a Mountain Dew Game Fuel (com cafeína adicional) e a Nintendo Power Up Energy Drink. A página de Facebook da Monster Energy Gaming declara que, "da próxima vez que você estiver procurando combustível para os games, escolha o Monster Energy e ative a besta contra os novatos".

ESTRATÉGIA

A indústria vem tentando explorar a imagem de rock stars e os atrativos dos "atletas profissionais de videogame" para a audiência jovem com patrocínios a competições e jogadores. A Gamma Labs, a empresa que vende o G Fuel, promove pesadamente um clã no game "Call of Duty", que inclui os dois atiradores que estrelam seu comercial.

Embora os grandes produtores de bebidas energéticas –entre os quais Red Bull, Rockstar e Monster– tenham feito um acordo voluntário de não realizar esforços de promoção para crianças de menos de 12 anos devido aos efeitos adversos de saúde associados ao produto, um relatório do Congresso norte-americano divulgado neste ano criticava essas e outras empresas por continuarem a direcionar seus produtos aos adolescentes.

As novas bebidas para gamers contém infusão de vitaminas e não têm açúcar, mas muitas vezes apresentam níveis de cafeína iguais ou superiores aos de outros produtos conhecidos, de acordo com o site Caffeine Informer, que oferece informações científicas e ao consumidor sobre os níveis de cafeína nas bebidas e alimentos.

Um fabricante promete uma bebida que reforça a "energia cerebral", enquanto outro chama seu produto de "Aderall [um produto para o tratamento de deficiência de atenção] natural".

Marcie Schneider, especialista em medicina adolescente em Greenwich, Connecticut, se diz preocupada em razão de a maioria dos pais não reconhecer os perigos desse tipo de bebida.

"Sinto que temos mais conhecimento sobre o número de jovens que fumam maconha do que sobre o número de jovens que usam energéticos", disse Schneider. Ela foi uma das diretoras de uma pesquisa da Academia Americana de Pediatria que recomendou que crianças e adolescentes jamais deveriam consumir bebidas energéticas, por causa do potencial da cafeína de distorcer os padrões de sono, elevar o batimento cardíaco e retardar o desenvolvimento do cérebro.

Mas os negócios continuam a florescer. As vendas de bebidas energéticas nos Estados Unidos devem subir a US$ 21 bilhões em 2017, ante US$ 12,5 bilhões em 2012, de acordo com a Packaged Facts, editora que publica pesquisas de mercado sobre o setor de alimentos e bebidas.

DIFERENÇAS

Os fabricantes das novas bebidas dizem que elas são naturais, sem aditivos químicos. As pessoas que as bebem dizem que elas não causam tremores ou baques, como outras bebidas energéticas.

"Acho que não dá nem para comparar os ingredientes do G Fuel com os ingredientes de algumas outras bebidas energéticas", disse Clifford Morgan, fundador e presidente-executivo da Gamma Labs, que fabrica o G Fuel. "Elas são tão tóxicas. Contêm produtos químicos demais."

Mas a cafeína e outros estimulantes continuam a ser ingredientes centrais. O conteúdo de cafeína do G Fuel, 15 miligramas por embalagem de 420 mililitros, é superior ao de muitos dos produtos da Monster e da Red Bull, de acordo com o Caffeine Informer. A GungHo não revela o teor de cafeína de seu produto, diz Danny Mason, o presidente-executivo da companhia.

	Bryan Thomas/The New York Times
	Sede da Gamma Labs, que vende a G Fuel, em Plainview, Nova York

Embora o G Fuel e o Gung Ho não tenham distribuição comparável à das grandes bebidas energéticas, seus produtos podem em breve se tornar mais amplamente disponíveis. A Basic Research, a empresa que fabrica o GungHo, está negociando com grandes cadeias de drogarias para levar seu produto às prateleiras do grande varejo, diz Mason.

Morgan e Mason dizem que suas bebidas energéticas são apropriadas para adolescentes e os dois permitem que seus filhos as bebam.

Jonas Feliciano, analista sênior de bebidas na Euromonitor International, disse que tomar por alvo de marketing a cultura do videogame fazia sentido para um setor que tenta manter um ritmo rápido de crescimento no mercado não esportivo.

"É esse o espaço que está crescendo", disse ele, mencionando serviços de streaming de vídeo como o Twitch, que mostram horas de jogos dos profissionais do videogame, que trabalham sempre com suas bebidas energéticas ao alcance. "Trata-se de uma oportunidade de marketing."

Ethan York, aluno de segundo ano do segundo grau em Lancaster, Califórnia, disse que beber G Fuel melhora seu desempenho significativamente em um videogame de beisebol que costuma jogar (ainda que lamente que a bebida seja cara demais para que a consuma regularmente).

"A sensação é de energia genuína, como se você tivesse tirado uma soneca de 30 minutos ou uma hora", ele diz. "E você tem aquela energia pura."

Tradução de PAULO MIGLIACCI