• Tec

    Wednesday, 08-May-2024 10:57:48 -03

    paris sob ataque

    Ataques em Paris resultam em notícias falsas e desinformação na web

    KATIE ROGERS
    DO "NEW YORK TIMES"

    17/11/2015 14h31

    Reprodução
    Veerender Jubbal é sikh, religião que nada tem a ver com o Corão, e teve foto adulterada para parecer radical islâmico
    Veerender Jubbal é sikh, mas teve foto adulterada para parecer radical islâmico

    Na sexta-feira (13), enquanto ataques terroristas se desencadeavam por toda a área de Paris, os boatos já corriam pela internet, enquanto pessoas continuavam aprisionadas dentro de edifícios sitiados.

    Quando os tiros e detonações já haviam praticamente cessado, começou a circular pelo Twitter uma imagem de um homem usando um colete suicida.

    No Facebook e Instagram, pessoas compartilharam uma foto de uma mulher morena que segundo eles era estranhamente parecida com a de uma mulher que foi fotografada chorando depois que um atirador matou 20 crianças e seis adultos na Sandy Hook Elementary School, nos Estados Unidos, em 2012.

    E dezenas de milhares de pessoas compartilharam via Twitter uma imagem da Torre Eiffel às escuras, afirmando que era a primeira vez que o monumento tinha suas luzes apagadas desde 1889.

    Nenhuma das três coisas era verdade. Mas as três ganharam circulação viral. Por quê?

    O que aconteceu em Paris se enquadra a um padrão de comportamento que parece emergir a cada vez que uma catástrofe se desenrola em tempo real: as pessoas compartilharão qualquer coisa on-line, a fim de compartilhar alguma coisa.

    Mark Fenster, professor de Direito na Universidade da Flórida e estudioso de teorias de conspiração, disse que participar da difusão de desinformação é atraente para pessoas que se consideram detetives amadores. Fenster define o fenômeno como "elemento 'onde está Wally?'" –o prazer que surge de descobrir rostos semelhantes em meio a imagens.

    "É o mesmo impulso que causou a onda de loucura no Reddit depois do atentado contra a maratona de Boston", ele escreveu em e-mail, se referindo ao desastroso fiasco que levou usuários do site a identificar pessoas como suspeitas do ataque, e alguns jornalistas a fazer o mesmo.

    Depois dos ataques em Paris, um exemplo relativamente inofensivo surgiu quando pessoas imaginaram ter visto Martin Kelly, zagueiro do time inglês Crystal Palace, em uma foto tirada diante da casa noturna Bataclan. Mas Kelly, que estava em segurança, teve de negar o rumor pessoalmente.

    Os abelhudos da internet que incorretamente apontaram para a presença de Kelly no Bataclan o definiram, indevidamente, como herói. Mas o que fizeram com relação a outro homem mostra um lado mais sombrio do ativismo na mídia social.

    Depois dos ataques em Paris, alguém adulterou uma foto de Veerender Jubbal, um sikh que dois meses antes havia postado um selfie que o mostrava ao espelho segurando um iPad. A imagem foi adulterada para mostrá-lo segurando um Corão e vestindo um colete repleto de explosivos. (A religião sikh é monoteísta e nada tem a ver com o islamismo ou o Corão. Seus devotos usam turbantes e, como os muçulmanos, enfrentam incompreensão e discriminação.)

    A imagem de Jubbal foi espalhada on-line por usuários do Twitter e jornalistas, e foi publicada em primeira página por um jornal espanhol antes que outros veículos mudassem de rumo e invertessem a história.

    O "Grasswire", que serve como uma espécie de redação noticiosa operada via crowdsourcing, tentou divulgar uma mensagem corretiva que mostrava a imagem original ao lado da imagem adulterada.

    "Espero que todo mundo esteja ciente do que está acontecendo comigo", escreveu Jubbal no Twitter domingo. "Minha foto virou sucesso viral porque foi alterada em Photoshop para me mostrar como terrorista." Na segunda-feira (16), as origens da foto falsificada eram incertas.

    Depois dos ataques, mais um tema recorrente emergiu no Facebook e Instagram: usuários céticos começaram a vasculhar as imagens coletivas e a tentar ligar as pessoas encontradas nela a eventos passados.

    Essa prática é parte de uma teoria da conspiração mais ampla que circula na internet sobre os chamados "atores de crise", ou seja, pessoas que outros acreditam terem sido contratadas para fazer parte de uma multidão pesarosa durante eventos catastróficos. Os adeptos de teorias da conspiração acreditam que os atores estejam em cena para exagerar os fatos, ou que sejam parte de um evento completamente encenado.

    "Para as pessoas que acompanham de casa", escreveu Fenster, "é uma confirmação da existência de uma conspiração ('ei, me lembro de fotos parecidas que circularam na época de Sandy Hook!'), bem como uma maneira de compartilhar aquela mesma mistura de medo, repulsa e empolgação".

    Depois do ataque de Sandy Hook, o site Snopes provou que a teoria de que atores haviam sido contratados para interpretar alunos e pais era uma balela. O "Snopes" conseguiu vincular essas afirmações a sites de teorias de conspiração, e as desacreditou completamente.

    Más intenções ou teorias da conspiração não são as únicas causas de desinformação.

    No caso dos ataques em Paris, tentativas fracassadas de divulgar atualizações noticiosas em tempo real tinham por raiz a desinformação e rumores. O site "Quartz" recolheu alguns dos exemplos com maior circulação, o que incluía a reprodução por usuários do Twitter de mensagens escritas meses atrás pelo Papa Francisco e por Donald Trump.

    A prática é um pouco como permitir que um gênio hiperativo saia de sua lâmpada: quando a má notícia se espalha e é difundida amplamente, se torna difícil corrigi-la.

    Até mesmo gestos de soldados podem ser mal interpretados e atribuídos a causas incorretas. Pouco depois do ataque, Ian Bremmer, cientista político que tem 139 mil seguidores, postou uma foto de pessoas se congregando em Paris. Outras contas mostraram imagens semelhantes.

    As fotos haviam sido tiradas em janeiro, depois que atiradores atacaram a redação do jornal satírico "Charlie Hebdo".

    No caso da Torre Eiffel de luzes apagadas, parece que Rurik Bradbury, que opera uma conta satírica no Twitter chamada @ProfJeffJarvis, deliberadamente postou uma falsa informação a fim de sustentar um argumento mais amplo sobre a natureza das imagens virais.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

    [an error occurred while processing this directive]

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024