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    Repórter conserta jipe em Marte com ajuda da realidade virtual

    BRIAN X. CHEN
    DO "NEW YORK TIMES"

    09/01/2016 02h00

    Divulgação
    A Fox lançou uma experiência de realidade virtual para promover o filme "Perdido em Marte"; o usuário pode ser Mark Wattney, o astronauta encalhado no planeta
    A Fox lançou uma experiência de realidade virtual para promover o filme "Perdido em Marte"

    Nos últimos dias, consertei um robô, dirigi um jipe espacial por Marte e ataquei objetos com uma arma laser.

    Fiz tudo isso sem sair de um lugar bem menos interessante, Las Vegas, onde estava acontecendo a feira de eletrônicos CES (Consumer Electronics Show). Para escapar à realidade artificial da cidade durante a mostra, passei alguns dias experimentando diferentes headsets e aplicativos de realidade virtual, para tentar avaliar se ela é uma tendência duradoura ou só uma moda passageira.

    Meu veredicto: a realidade virtual chegou para ficar por muito tempo, em parte porque o conteúdo tem aparência e causa sensações excelentes (mas também porque as empresas de tecnologia falam sobre isso sem parar). Determinar se esses produtos terão apelo amplo junto aos consumidores dependerá de como as companhias envolvidas comercializarão a tecnologia e se serão capazes de baixar os preços dos aparelhos de realidade virtual.

    No curto prazo, esse tipo de sistema atrairá principalmente os gamers e entusiastas da tecnologia, por causa do alto preço que uma experiência virtual caseira sólida impõe. O Facebook anunciou nesta semana que seu headset Oculus Rift, com lançamento previsto para março, custaria US$ 599, ou US$ 1.500 como parte de um pacote que incluirá também um computador.

    Mas considerando a alta qualidade do conteúdo e aplicativos inicialmente disponíveis para os sistemas de realidade virtual, e dado o volume de dinheiro que as empresas estão investindo nessa mídia, provavelmente não estamos falando de uma moda que logo esfriará, como a dos televisores 3D.

    As companhias dizem que 2016 será o ano em que muitos consumidores experimentarão a realidade virtual pela primeira vez, e talvez se deixem deslumbrar, ainda que não seja o ano em que a tecnologia encontrará adesão em massa em termos de vendas.

    "Nenhuma pessoa que experimentou o Rift tirou o headset e comentou que 'para mim não teve graça, não foi incrível'", disse Brendan Iribe, presidente-executivo da Oculus VR, em entrevista. "A reação da maioria das pessoas é que o aparelho é a coisa mais espetacular que já viram em suas vidas, na tecnologia."

    A realidade virtual avançou muito. Os tecnólogos vêm fuçando com o conceito desde os anos 1980, mas os primeiros aparelhos e aplicativos maduros só emergiram nos três últimos anos. A Oculus VR, adquirida pelo Facebook por US$ 2 bilhões em 2014, atraiu o maior número de manchetes. Mas muitas outras companhias agora têm interesse nesse tipo de sistema, entre as quais Samsung, Valve, Jaunt, HTC e Fox Entertainment Group.

    Durante as minhas aventuras de realidade virtual na feira de eletrônica, testei o Oculus Rift, que se conecta a um computador, e dois aplicativos que empregam os controladores manuais do sistema. Um app chamado Toybox coloca o usuário em uma plataforma interativa, cercado de objetos que você pode apanhar e com os quais pode interagir –por exemplo raquetes de pingue-pongue, uma arma laser, estilingues e fogos de artifício. Você também pode ter a companhia de um segundo usuário na sessão, para jogar pingue-pongue ou travar uma guerra de paintball com estilingues.

    Vídeo

    A Fox Entertainment também demonstrou um app de realidade virtual desenvolvido para a Oculus VR a fim de promover o filme "Perdido em Marte". O app oferece ao usuário a oportunidade de ser Mark Wattney, o astronauta encalhado no planeta que Matt Damon interpreta no filme. A experiência, com 20 minutos de duração, consiste de sete cenários, entre os quais uma sequência na qual você usa os controladores manuais a fim de operar um guindaste e carregar o jipe espacial com painéis solares.

    Uma sequência menos envolvente requeria separar batatas, dividindo-as por tamanho em baldes diferentes. Meu desempenho no arremesso de batatas foi péssimo –tão ruim quanto minha incompetência em arremessar objetos na vida real.

    A HTC, companhia de tecnologia sediada em Taiwan, também desenvolveu um headset de realidade virtual chamado Vive, com a ajuda da distribuidora de videogames Valve. O Vive estará disponível em abril, conectado a um poderoso computador a fim de gerar imagens mais ricas e intensas que as do Rift.

    Testei alguns apps, entre os quais o Tilt Brush, um aplicativo de pintura desenvolvido pelo Google, que me permitia dar pinceladas em um espaço tridimensional –propiciando uma experiência hipnótica. O Aperture, um videogame, me posicionava em uma instalação de reparo de robôs e me instruía a abrir gavetas, puxar alavancas e premir diferentes botões para consertar robôs.

    Os controladores manuais do Rift e do Vive requerem tempo para que o usuário se acostume, mas interagir com objetos, usando qualquer um deles, parecia natural. Descobri como consertar o robô do Aperture e operar o guindaste de "Perdido em Marte" sem ajuda.

    Chet Faliszek, roteirista de games da Valve, disse que o aprendizado intuitivo da realidade virtual abrirá a mídia a aplicações muito amplas, não apenas jogos. "As aplicações e as diferentes formas pelas quais elas podem ser usadas são muito diversas", ele disse.

    O Rift e o Vive apresentam algumas grandes diferenças. O Rift foi projetado para ser usado em pé ou sentado, e o Vive encoraja o usuário a caminhar –há uma câmera frontal no headgear que permite observar o mundo real com o premir de um botão, caso você queira beber um copo de água, por exemplo.

    Os dois aparelhos apresentam algumas falhas. O Rift é difícil de usar no rosto; não consegui posicionar o aparelho de forma a bloquear o mundo externo, no espaço sob o meu nariz (talvez porque meu nariz seja comprido), e movimentar a cabeça rapidamente fazia com as imagens do headset saíssem de foco, requerendo reajuste.

    Porque o Vive encoraja movimento, tropecei no cabo algumas vezes. Usando os dois aparelhos, me senti exausto e hiperestimulado ao final de sessões de 20 minutos –a realidade virtual parece ser uma mídia concebida para consumo em pequenas doses, e não por horas ininterruptas.

    A Oculus VR e a Vive inicialmente direcionam seus produtos aos adeptos dos videogames, e existem limites para os atrativos dos sistemas. Um deles é a estética dos headsets, que pode repelir os usuários cotidianos. Os dois headsets ainda parecem esquisitões, como se fossem figurinos de ficção científica saídos de um episódio de "Jornada nas Estrelas".

    Quando apontei esse fato para executivos da Jaunt, uma companhia sediada em Palo Alto, Califórnia, e que oferece câmeras e software para produtores de conteúdo de realidade virtual, eles me mostraram um smartphone envolto em um estojo chamado Figment VR.

    O Figment VR, que está sendo desenvolvido com a ajuda de uma campanha no site de crowdfunding Kickstarter, inclui duas lentes que saem do estojo e permitem que o usuário veja conteúdo de realidade virtual rapidamente na tela de seu smartphone.

    A Jaunt, que um dia espera se tornar "a Netflix da realidade virtual", afirma que, pelo menos inicialmente, os smartphones, e não equipamentos sofisticados como o Rift e o Vive, serão a chave para a adoção em massa dos sistemas de realidade virtual.

    "Tudo gira em torno da tecnologia dos smartphones", disse David Anderman, vice-presidente de negócios da Jaunt. "Todo mundo que tem um smartphone no bolso –e em breve isso pode querer dizer literalmente todo mundo - será capaz de ver conteúdo de realidade virtual."

    Jan Dawson, analista independente de tecnologia, concorda com essa previsão. Ele diz que aparelhos como o Gear VR, um headset de realidade virtual desenvolvido pela Samsung Electronics e Oculus VR, têm maior potencial de ganhar aceitação em massa. O acessório custa US$ 100 e requer inserir um smartphone Samsung Galaxy no headset; a tela do celular serve como vídeo. O Gear VR foi colocado à venda no final de novembro, e rapidamente se tornou sucesso na Amazon.

    Ted Schilowitz, futurista residente da Fox e participante da equipe que desenvolveu o app de realidade virtual para "Perdido em Marte", disse que o smartphone havia treinado consumidores para a adoção da realidade virtual. Os smartphones, disse ele, agem como robôs que nos servem de assistentes pessoais –e agora as pessoas devem se sentir mais confortáveis com o uso ainda mais íntimo de ambientes virtuais.

    "O que aconteceu com a nossa psicologia, com a nossa humanidade, preparou o terreno para o que está por vir", ele disse. "Estamos prontos para isso, agora".


    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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