• Tec

    Monday, 06-May-2024 19:14:01 -03

    Depoimento

    Jogo me dá oportunidade de estar com o meu filho que morreu

    JULIANA GRAGNANI
    DE SÃO PAULO

    01/02/2016 02h06

    Arquivo Pessoal
    Ryan e Amy, criadores de 'That Dragon, Cancer'; Joel, que morreu é o segundo da dir. para a esq.
    Ryan e Amy, criadores de 'That Dragon, Cancer'; Joel, que morreu é o segundo da dir. para a esq.

    Há dois anos, Ryan Green, 35, perdeu o filho Joel para o câncer. Ele e a mulher, Amy Green, 34, decidiram criar um game que retratasse a experiência. O jogo, chamado "That Dragon, Cancer", dá ao jogador a possibilidade de explorar cantos do hospital, ou então ver cenas do cotidiano da família Green, brincando com Joel, conversando sobre o trânsito no caminho para o tratamento, ou rezando pelo filho. Às vezes, o jogador assume a perspectiva de Joel, vendo o mundo através de seus olhos.

    Leia abaixo o depoimento abaixo deles.

    *

    Ryan:

    Queríamos que os jogadores pudessem explorar como era a vida de Joel, lidando com os desafios físicos e mentais causados pelo câncer e seu tratamento. Começamos a desenvolver o jogo enquanto Joel estava vivo, então nossa experiência como pais acabou entrando junto.

    Uma das primeiras cenas que criamos foi aquela em que Joel está chorando, foi uma das piores noites no hospital. Ele estava desidratado, vomitando. Foi uma noite horrível para ele, nada que eu tentava dava certo. Decidi criar um jogo que refletisse a vida real, mostrando que, às vezes, não temos controle algum sobre ela. Nós rezamos para Deus e Joel dormiu.

    Também precisávamos lidar com o fato de que o Joel morreu. Estávamos de luto e não recebemos as respostas que gostaríamos, não recebemos aquilo pelo qual rezamos. Essa luta espiritual fez parte da experiência, e isso aparece no jogo.

    "That Dragon, Cancer" também surgiu da vontade de brincar com o Joel, e quisemos transmitir que tipo de menino ele era, como era alegre. O jogo me dá a oportunidade de interagir com ele de novo, balançá-lo numa cadeira de balançar, ou só estar perto dele novamente.

    Amy:

    Há muito do nosso cotidiano no jogo. Como fazíamos o jantar, como lidávamos com o trânsito e com nossos três outros filhos pequenos. E há partes emotivas.

    Muitas coisas surgiram da nossa imaginação de como era a experiência para Joel, especialmente a cena da radiação, que mostra nosso filho em outro mundo, no espaço. É que ele amava ir para a radiação, e nós nunca entendemos isso. Sempre nos perguntávamos: "O que passa pela cabeça dele? Será que ele está inteiro e puro em um mundo mágico?"

    Foi difícil revisitar toda a nossa esperança e as nossas orações, que aparecem no jogo, sabendo qual seria o resultado. Eu sabia que as pessoas jogariam conhecendo já o final da história. Quando escutassem nossas orações, não estariam ouvindo no contexto em que estávamos, ouviriam de algum momento no futuro, sabendo que elas não foram contempladas como nós gostaríamos.

    O jogo mostra nossas expectativas, que eram altas, e depois o fim da história. Gostaria de ter contado uma história diferente, ter feito um jogo sobre como Joel foi curado, mas temos que aceitar a história que nos foi dada.

    Edição impressa

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024