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    Iceberg maior que o Distrito Federal se descola da Antártida

    DO "NEW YORK TIMES"
    DE SÃO PAULO

    12/07/2017 10h01 - Atualizado às 20h57

    Reuters
    Parte do iceberg, de 6.000 km², que se descolou na Antártida e segue à deriva no oceano
    Parte do iceberg, de 6.000 km², que se descolou na Antártida e segue à deriva no oceano

    Um bloco de gelo flutuante com peso que supera um trilhão de toneladas e a área maior que a do Distrito Federal (6.000 km²) se separou da península antártica, produzindo um dos maiores icebergs já registrados e oferecendo um vislumbre de como a camada de gelo que recobre a Antártida pode começar a se desfazer no futuro.

    Uma rachadura na plataforma de gelo Larsen C vinha aumentando de tamanho há anos, e atualmente já superava os 200 km de comprimento. Cientistas confirmaram na quarta (12) que a porção da plataforma delimitada pela rachadura enfim se descolou do continente gelado.

    "O manto de gelo remanescente terá o menor tamanho já registrado", disse Adrian Luckman, um dos pesquisadores que comandam o Projeto Midas, das universidades de Swansea e Aberystwyth, que monitora a plataforma desde 2014. "Essa é uma grande mudança. Mapas terão de ser redesenhados."

    O problema é que esses fenômenos estão acontecendo de uma maneira mais acelerada, algo relacionado às mudanças ambientais na região, como alterações nas correntes oceânicas e nos ventos, diz Jefferson Simões, do Instituto Nacional de Ciência e tecnologia da Criosfera.

    "A implicação disso é que o gelo que está no continente, sem a plataforma, escorre mais rapidamente para o oceano", explica Simões.

    Mesmo assim, o impacto sobre o nível dos oceanos não deve ser muito grande. "É uma região montanhosa com pouco volume de gelo -menos de 2% do total do continente", diz o pesquisador. Antes da Larsen C, as plataformas Larsen A e Larsen B sofreram fenômenos semelhantes nas década de 1990 e 2000, respectivamente.

    Como se trata da região mais ao norte e mais quente do continente gelado, é comum que as primeiras alterações sejam vistas por ali. No entanto, a preocupação aumenta conforme o fenômeno "caminha" para o Sul. "Se o gelo da Antártida Ocidental se desestabilizar, a contribuição para o nível do mar seria muito maior", diz Simões. Segundo estimativas, haveria um aumento de mais de 2 metros.

    No final do século 20, a península antártica, que se projeta da Antártida e aponta na direção da América do Sul, era um dos lugares em mais rápido aquecimento no planeta. O aquecimento desacelerou ou talvez tenha se revertido ligeiramente no século 21, mas os cientistas acreditam que o efeito das temperaturas mais altas sobre o gelo ainda não tenha sido sentido plenamente.

    Alguns cientistas que pesquisam sobre o clima acreditam que o aquecimento na região seja ao menos em parte resultado de mudanças no clima causadas pela atividade humana, mas outros estudiosos, como Simões, contestam essa interpretação, e consideram que a variabilidade natural tem papel importante e que não dá para ter certeza -eles apontam que icebergs vêm se separando de mantos de gelo há muitos milhões de ano.

    O consenso é que a separação de plataformas de gelo na região da península deve servir como indicador para o que acontecerá na porção principal da Antártida à medida que o planeta continuar a se aquecer como resultado das atividades humanas.

    As plataformas de gelo se formam quando longos rios de gelo, as geleiras, fluem da terra para o mar. Como resultado, a plataforma acaba obstruindo esse fluxo. Sem elas é como se a tampa do ralo fosse removida.

    Na porção restante da Larsen C, a beirada do gelo agora fica muito mais próxima de uma linha que os cientistas designam como "arco compressivo", que é crucial para a sustentação da estrutura. Se a plataforma se retrair para aquém dessa linha, sua porção norte pode entrar em colapso em questão de meses.

    "Há duas âncoras laterais na Larsen C que podem desempenhar papel crítico em manter a plataforma em sua posição", diz Eric Rignot, da Universidade da Califórnia em Irvine. "Se a plataforma estiver se tornando mais fina, se tornará mais quebrável e perderá contato com as cristas de gelo."

    Cristas de gelo são ilhas que terminam sobrepostas pela plataforma e permitem que o peso da plataforma aumente. Os cientistas ainda não determinaram em que medida a plataforma se afinou em torno das cristas de gelo.

    Em 1978 o geólogo John Mercer, da Universidade de Ohio, escreveu estudo alertando que a porção oeste da Antártida era tão vulnerável à interferência humana no clima que podia representar "uma ameaça de desastre" provocado pela alta no nível do mar.

    Ele disse que a humanidade saberia que a calamidade havia começado quando as plataformas de gelo começassem a se separar da península, com as separações avançando gradativamente em direção ao sul.

    Infográfico: Neve na Antártida

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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