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    SAIU NO NP

    'Pênis voador' se enrosca na fiação elétrica e intriga Capão Redondo

    CRISTIANO CIPRIANO POMBO
    DO BANCO DE DADOS FOLHA

    08/09/2017 02h00

    J.F. Diorio - 20.abr.1993/Folhapress
    Pênis pendurado em fio da rede de energia elétrica no Capão Redondo, em 1993
    Pênis pendurado em fio da rede de energia elétrica no Capão Redondo, em 1993

    Tudo começou no dia 20 de abril de 1993.

    Um relato chegou à Redação do "Notícias Populares", dos mais inusitados que a reportagem já tinha escutado: um pênis encontrava-se pendurado havia uma semana num fio de alta tensão.

    O jornal apurou a história, e ela era fidedigna, afinal havia mesmo um membro sexual suspenso na estrada de Itapecerica, no bairro do Capão Redondo, na zonal sul de São Paulo.

    O "NP", então, debruçou-se sobre o caso, já que pipocavam versões para o que foi chamado de "pênis voador".

    Logo no primeiro dia, a principal história contada por moradores da região dava conta de que o órgão pertencia a um rapaz que tentara estuprar uma menina de 13 anos, fora descoberto pelo pai da criança e morto por este.

    Outros, porém, acreditavam que, devido ao tamanho, o "pênis voador" deveria ser de algum animal.

    Rogério Albuquerque - 24.abr.1993/Folhapress
    Saiu no NP
    Policiais realizam busca após suspeita de que dono do "pênis voador" teria sido morto e enterrado em matagal

    De toda a forma, contando até com informações do 47º DP (Capão Redondo), o caso foi apresentado na quarta-feira, 21 de abril de 1993, como "Coisa louca" e com o título "Procura-se um dono pra este pênis!".

    No dia seguinte, algo mais intrigante manteve o caso nas páginas do jornal: durante a madrugada o "pênis voador" desaparecera.

    O caso foi relatado por dois PMs, que, após lerem o "Notícias Populares", foram até o local, na altura do número 7.100 da estrada de Itapecerica, e não encontraram nada.

    Depois de o delegado do 47º DP confirmar que ninguém do departamento retirara o objeto do fio e a reportagem do "NP" não ter encontrado em hospitais, necrotérios e delegacias da cidade um homem sem sexo, o caso agora tinha duas perguntas insolúveis: 1) de quem era o "pênis voador"?; 2) quem o levou?.

    Começava ali uma saga que se estenderia por mais cinco dias, abriria novas perguntas e mobilizaria reportagem, polícia e moradores.

    Um leitor do "NP", que ligou para o jornal e, sem se identificar, afirmou saber de quem era o "objeto", motivou as primeiras ações.

    Segundo ele, um homem chamado Gérson, que havia estuprado várias garotas da região, era o dono, mas fora morto e estava enterrado em um matagal no Jardim Piracema.

    Em "PM caça o dono do pênis voador", o jornal relatou que a polícia investigou cinco covas da região e não encontrou nenhum cadáver e tampouco a delegacia tinha registro de estupros nos últimos dias.

    O fato mais revelador desse dia estava sob o título "Órgão já foi de um homem". Isso porque o cientista Gameiro de Carvalho, então professor de reprodução animal da Faculdade de Veterinária da USP, afirmara ao "NP", após ter olhado as fotos do órgão, que o "pênis voador" não era de um animal, e sim de humano.

    No dia 24, uma nova versão para a história do estuprador foi parar nas páginas do "NP". De acordo com A.S., um morador do Capão Redondo que também não quis se identificar, o suposto criminoso tratava-se de um rapaz negro, de 1,78 m, que fora morto por ter molestado uma menina de sete anos e outra de 13.

    Conforme o relato, o vingador seria um moço que estava servindo o Exército e, com uma turma de mais de dez colegas, capou o suposto estuprador. A vítima, após perder muito sangue, chegara morta ao hospital –reportagem do "NP" confirmou que o hospital Novo Campo Limpo não tinha registro do caso. E o medo de represália da gangue mantinha a história em segredo.

    Nesse dia, outro destaque foi para o fato de que o "NP" havia confirmado que o dono do "pênis voador" era mesmo um bem-dotado. De acordo com um médico do departamento de patologia clínica da Associação Paulista de Medicina, "diferentemente do corpo humano, que incha após a morte por causa de substâncias que fazem o organismo fermentar, um órgão decepado não cresce, porque não tem essas substâncias".

    A essa altura, a história motivara mais leitores a ligarem para o jornal, e levou a polícia a novas buscas pela região, no que passou a ser chamado pelo "NP" de "O mistério do Capão Redondo".

    Uma semana após a primeira reportagem sobre o caso, o jornal apresentou a pista mais concreta para se chegar a uma solução para o "pênis voador".

    Em 26 de outubro, o relato da faxineira Aparecida –o sobrenome foi omitido para proteger a moça– em "Desespero: `Pênis voador foi tirado do meu marido'" parecia embicar para o desfecho da história.

    Desesperada, ela ligou para o jornal e perguntou ao repórter: "Você está cavando no mato atrás do dono do pênis? Você encontrou meu marido?".

    A faxineira, então com 28 anos, referia-se a Gérson, 33, que sumira de casa havia dez dias. Ela havia reconhecido o pênis no jornal e disse que, após o desaparecimento do marido, sofrera ameaças. "Três homens conhecidos no bairro começaram a cercar minha casa. Eles diziam que o Gérson tinha estuprado a filha de um deles e que fariam justiça."

    O medo fez com que Aparecida deixasse o Jardim Piracema.

    Folhapress
    Saiu no NP
    Reprodução de reportagem do "NP" sobre elogios da polícia à participação do jornal no caso do "pênis voador"

    Apesar de a história ter sido elucidada, afinal o "NP" já tinha outro relato referindo-se a Gérson, o jornal criticava a morosidade da polícia.

    No dia seguinte, ao mesmo tempo em que relatava a entrada da Polícia Civil no caso, para investigar o sumiço de Gérson, o "NP" publicou que um dos investigadores do 47º DP afirmara que o "pênis voador" nada mais era do que um rabo de boi que tivera o couro retirado, o que lhe conferiu a aparência de pele humana.

    A saga do "pênis voador" chegou ao fim com o reconhecimento da polícia de que a reportagem do "NP" levantara informações importantes para desvendar o caso. Mas nada mais foi publicado ou registrado até hoje para dizer qual foi o paradeiro do "pênis voador".

    Colaboraram ALBERTO NOGUEIRA, ALEXANDRE POLLARA, FLORA PEREIRA e LUIZ CARLOS FERREIRA

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