Em 2005, May-Britt Moser relatou, com seu marido, Edvard Moser, e alguns colegas, a descoberta em ratos de células cerebrais que funcionam como uma espécie de sistema de navegação, crucial para que os animais saibam onde estão, aonde vão e onde estiveram.
Eles as chamaram de células de grade. As implicações da descoberta são ao mesmo tempo práticas e profundas. Já se provou a existência das células em primatas, e os cientistas acham que elas serão achadas em todos os mamíferos, inclusive humanos.
A área do cérebro que contêm o sistema de navegação das células de grade costuma ser logo danificada em casos do mal de Alzheimer, e um frequente sintoma precoce da doença é que os pacientes se perdem.
Edvard Moser, 51, e May-Britt Moser, 50, dirigem o Instituto Kavli de Neurociência Sistêmica e o Centro para a Biologia da Memória na Universidade Norueguesa de Ciência e Tecnologia, aqui em Trondheim.
O funcionamento das células de grade mostra que, dentro do cérebro, "você está constantemente criando um mapa do mundo exterior", segundo Cori Bargmann, da Universidade Rockefeller, no Estado de Nova York.
Frequentemente, o funcionamento dos bilhões de neurônios que produzem nossos pensamentos é opaco. Mas registros elétricos dos sinais emitidos pelas células de grade mostram um mapa "com uma estrutura e coordenadas que são completamente intuitivas", segundo Bargmann.
E encontrar um sistema tão claro é, à sua maneira, "simplesmente fascinante". O que o cérebro está fazendo ao ser tão misteriosamente não misterioso?
John O'Keefe, do University College, de Londres, que na década de 1970 identificou as chamadas células cerebrais de localização, que registram lugares específicos -como a loja da esquina ou a casa da vovó-, e que foi um dos mentores do casal Moser, disse que a descoberta das células de grade foi "incrivelmente significativa".
O casal Moser não trabalha em humanos, mas quaisquer pistas para entender a perda da memória e da capacidade cognitiva são importantes. No nível mais profundo, O'Keefe, os Mosers e outros especulam que a forma como o cérebro registra o movimento no espaço e se lembra deles pode estar na base de toda a memória.
Os Mosers queriam descobrir como a informação fluía para as células de localização, e se ela estava indo de uma área do hipocampo para outra. Mas, mesmo depois de inativarem seções dessa área cerebral, as células de localização continuavam funcionando. Então, parecia que a informação estava chegando de uma área cerebral próxima, o córtex entorrinal.
Começaram a olhar lá, no começo tendo a ajuda de Menno Witter, então em Amsterdã, hoje em Trondheim, na delicada tarefa de guiar os eletrodos até o ponto exato.
"Não achamos imediatamente as células de grade", disse Edvard Moser. De início, eles notaram que as células emitiam um sinal toda vez que um rato ia a um lugar específico, e acharam que talvez isso fosse algo afim às células de localização no hipocampo, que estão ligadas às localizações do mundo exterior.
Gradualmente, descobriram que, na verdade, estavam vendo uma célula que acompanhava o movimento do rato independentemente de onde rato estivesse. A célula não estava respondendo a nenhuma marcação exterior, estava monitorando como o rato se movimentava. E, quando o rato ganhou espaço suficiente, um padrão muito regular surgiu.
"A primeira coisa foi que achamos que havia algo de errado com o nosso equipamento", disse Edvard Moser. "Pensei: 'Será que é um bug?'", disse May-Britt.
Após um artigo em 2005 na revista "Nature", em que eles relataram a descoberta e batizaram as células, outros laboratórios confirmaram as conclusões.
Agora está claro que as células de grade, em combinação com as células que sentem a direção de cabeça e outras que sentem limites -ambas originalmente identificadas por outros laboratórios em outras partes do cérebro- formam uma espécie de sistema cerebral de navegação estimada, que mapeia o movimento.
A informação passa dessa parte do cérebro para o hipocampo, e então volta. Não se sabe exatamente como a grade informa as células de localização, e vice-versa. O que os cientistas têm agora são as duas pontas de um sistema, e no meio delas uma caixa-preta que ainda não foi totalmente compreendida.
"Esse ainda é um problema de pesquisa para uns dez a 20 anos", afirmou Edvard Moser. Ou, como disse O'Keefe: "Ainda estamos na fase pré-newtoniana da neurociência".
[an error occurred while processing this directive]