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    Maurício Stycer

    Quem precisa de opinião

    20/04/2014 03h02

    A decisão do SBT de proibir comentários de seus jornalistas nos telejornais não surpreende quem já observou, em outros momentos, atitudes de pouco respeito de Silvio Santos em relação ao jornalismo da emissora.

    A primeira reação do SBT ao famoso comentário de Rachel Sheherazade foi dizer que se tratava de opinião da jornalista. Em outras palavras, ao mesmo tempo em que defendeu a liberdade da apresentadora do "SBT Brasil" de se expressar, a emissora procurou dizer que não tinha nada a ver com o que foi dito.

    Quarenta e oito horas depois, diante da crescente reação negativa, a jornalista procurou esclarecer o comentário no ar e seu colega da bancada, Joseval Peixoto, insistiu no argumento, observando haver "uma certa confusão em separar a opinião pessoal dos apresentadores e a linha editorial do jornalismo do SBT".

    Um ano antes, em março de 2013, uma campanha publicitária relembrou os princípios editoriais do SBT, divulgados em 1988. Um deles diz: "O tom do jornalismo deve ser otimista, procurando mostrar que, mesmo nas situações mais trágicas, é possível dar a volta por cima".

    Em março de 1985, nos últimos dias da ditadura militar e na véspera da posse de José Sarney, Silvio Santos deu uma famosa entrevista ao "Estadão", incluindo o seguinte comentário: "Eu já dei ordens aos jornalistas da minha empresa para nunca criticar, só elogiar o governo. Se for para criticar, é melhor não falar nada, é melhor ficar omisso."

    Três anos depois, em fevereiro de 1988, disse à Folha: "Eu sou concessionário, um 'office-boy' de luxo do governo. Faço aquilo que posso para ajudar o país e respeito o presidente, qualquer que seja o regime".

    Símbolo deste "projeto editorial", o programa dominical "A Semana do Presidente" foi ao ar por cerca de 20 anos, entre os governos Figueiredo e FHC, sempre documentando em tom oficialista atos do poder.

    O "TJ Brasil" apresentado por Boris Casoy (1988-97) constitui um dos raros capítulos fora da curva numa história de pouca prioridade e raros investimentos em jornalismo de qualidade.

    Ao dizer que considerava "até compreensível" a atitude dos que amarraram um suposto ladrão ao poste e propor aos que discordavam de sua visão aderir à campanha "adote um bandido", Rachel Sheherazade expressou mais do que uma opinião, na visão de seus críticos: ajudou a disseminar ódio, incitou ao crime, justificou uma ilegalidade.

    Além destes questionamentos, há ainda outro debate de fundo: qual é o papel do próprio jornalismo em uma emissora de TV aberta?

    Ao pedir à Procuradoria-Geral da República (PGR) a abertura de inquérito contra o SBT, a líder do PCdoB na Câmara, Jandira Feghali (RJ), abordou esta questão. "A emissora vai ter de assumir. Não estamos provocando a Rachel Sheherazade, é o SBT que está em questão. Não é uma questão dela especificamente, mas dela vinculada ao canal. A gente espera que isso sirva de parâmetro para outras TVs", disse ao site "Congresso em Foco".

    O SBT não quis entrar no mérito das declarações de sua âncora e, diante das pressões que está enfrentando, optou mais uma vez pelo mais fácil: ninguém mais dá opinião nos telejornais da casa.

    mauricio stycer

    É jornalista, repórter e crítico e autor de 'Adeus, Controle Remoto'.
    Escreve aos domingos.

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