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    Mônica Bergamo

    'Estou andando pela vida e vivendo, esse é o barato', diz Fabio Assunção

    17/12/2017 02h00

    Ricardo Borges/Folhapress
    O ator Fabio Assunção no escritório de sua produtora na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro
    O ator Fabio Assunção no escritório de sua produtora na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro

    "O que passou, passou, e não tem mais relevância para determinar meu futuro", escreveu Fabio Assunção em uma mensagem de Whatsapp enviada ao repórter Bruno B. Soraggi às 5h29 de uma quinta-feira, antes de sua aula diária de pilates. "Tenho muito orgulho do que construí", dizia. "Acordei hoje com essa energia", acrescentava o ator no áudio de seis minutos remetido depois do texto.

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    No dia anterior, foi ele quem pessoalmente abriu a porta de seu escritório na Barra da Tijuca, bairro onde mora, para esta entrevista. A conversa teve início por um assunto sobre o qual ele tem sido frequentemente perguntado nos últimos meses: sua barba.

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    "Ela rouba a cena, né? É engraçado. Podemos falar só sobre ela", brinca o paulistano da Vila Mariana sobre o visual grisalho que cultiva há seis meses para compor o personagem do juiz Ramiro, seu papel na série "Onde Nascem os Fortes", da Globo. Filmada na Paraíba, para onde Fabio já foi três vezes gravar, a atração deve estrear em abril.

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    "Minha filha achou estranha [a barba], mas se acostumou. Agora fica brincando com ela. Já meu filho me sacaneia. Diz que eu pareço o Papai Noel", conta o pai de João, 14, e Ella, 6.

    Ricardo Borges/Folhapress
    Rio de Janeiro, Rj, BRASIL. 06/12/2017; Retrato do ator Fabio Assuncao no Rio de Janeiro.( Foto: Ricardo Borges/Folhapress)
    O ator Fabio Assunção no escritório de sua produtora na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro

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    "É o primeiro vilão de fato que eu estou fazendo", diz o ator, que tem 27 anos de carreira."O Ramiro tem uma índole ruim. É um personagem machista, agressivo, fascista. A vida dos outros não vale nada para ele. Ele é desumano. Quando vou filmar eu transito por essas emoções, que não são sentimentos que eu tenho."

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    "Tem sido muito angustiante. É um dos trabalhos mais solitários que eu já fiz", afirma. "Não estou dizendo que não estou feliz", emenda o ator, que se diz uma pessoa "intensa". "E às vezes tensa por causa disso [risos]."

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    Fabio deixou a faculdade de publicidade para se formar ator na Fundação das Artes, em São Caetano. Fez sua primeira novela aos 19 anos, quando integrou o elenco de "Meu Bem, Meu Mal". Desde então, teve a vida exposta.

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    "É uma coisa recorrente. Não sei muito o que dizer sobre isso. Não tenho do que reclamar. É um pouco o preço do meu trabalho."

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    Em junho, Fabio foi preso por desacato na cidade de Arcoverde (PE). Ele estava no local para exibir um documentário sobre o samba de coco feito com sua então namorada, Pally Siqueira, 25 -hoje, está solteiro. Vídeos que mostram o ator alcoolizado naquela noite alvoroçaram a internet.

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    "Aquilo é fruto de um nervosismo causado pela própria exposição, que é uma perversão, na verdade. Como isso interferiu, me deixou inseguro, com medo naquela situação, entende? E as pessoas me agridem por esse vídeo. Isso é um sadismo virtual que não diz nada. Não reflete a minha personalidade nem a minha conduta."

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    "Era uma noite de comemoração. Todos beberam. Houve uma situação de agressão que gerou confusão. Eu levei três chutes na cara. Fui ao hospital. [As duas pessoas da equipe de Fabio que o acompanhavam] chamaram a polícia para me proteger. Quando os policiais me abordaram, com truculência, eu reagi. Fui algemado e colocado no carro", conta.

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    "Não quero me vitimizar. Eu desacatei, resisti Mas não havia nada que justificasse a prisão." O ator foi liberado após pagar fiança. Ele se desculpou pelo ocorrido e reitera que não havia consumido drogas ou medicamentos.

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    Fabio acende um cigarro. "Se quiser tem esse bonito aqui, com uma energia espiritual", brinca ao apontar um cinzeiro com o símbolo do Corinthians. O ator levou o filho a Tóquio para ver seu time vencer o mundial de 2012.

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    Sobre a Copa, ele diz que "pela primeira vez" o assunto não passa por sua cabeça. "[Em anos anteriores] Eu já estaria excitadíssimo, pensando na possibilidade de ir!" Atualmente, outros temas chamam a sua atenção.

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    "A gente vai ter um ano muito complicado", diz, referindo-se às eleições do ano que vem. "O que esperar para 2018 de um país que se conhece pouco, que só tem notícias de que quem faz política é bandido –o que dá uma descrença enorme no sistema. Está difícil avaliar quem são as nossas lideranças", diz. "Aí voltam os justiceiros. A política tem que ser feita por políticos", defende o ator, que se filiou recentemente ao PT.

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    Desde o começo deste ano, Fabio participa de um grupo que debate políticas sobre drogas. Mas diz não fazer do assunto uma bandeira. "O que me interessa é a discussão. A droga centraliza muitos problemas da sociedade, como segurança pública e a área de saúde", afirma o ator.

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    "Falar sobre legalização de drogas não significa que você quer que as pessoas as usem. Só que se as pessoas usam você tem que saber administrar. É uma responsabilidade da sociedade discutir e tratar isso com humanidade."

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    Sobre a sua experiência pessoal como dependente de cocaína, da qual se diz livre, Fabio afirma que por ele este "poderia ser um assunto encerrado".

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    "É uma parte que talvez exista até o fim da minha vida. O que eu estou buscando é o que fazer com isso. O mais difícil não é uma coisa que acontece com você, e sim você colaborar com a sociedade sendo melhor. É lidar com estigmas", diz.

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    "Como você pode entender a questão das drogas e dos direitos humanos se você não tem empatia, se você não se coloca no lugar das pessoas que passam por isso?"

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    Ricardo Borges/Folhapress
    O ator Fabio Assunção no escritório de sua produtora na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro
    O ator Fabio Assunção no escritório de sua produtora na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro

    Fabio é atuante no movimento 342, grupo de artistas que se mobiliza em torno de temas em evidência do noticiário, como as polêmicas envolvendo exposições de arte em Porto Alegre e em São Paulo encampadas por grupos considerados conservadores.

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    "Eles fazem um movimento para fazer barulho, para chamar atenção. Para alavancar plataformas de governo para o ano que vem. São pessoas que estão desesperadas para aparecer. E, quando não têm argumento, atacam. Atacaram a arte."

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    "Eles resistem a esse processo evolutivo", afirma o ator. "A gente está evoluindo. Acho que está tudo desmoronando porque estamos evoluindo. O pau está comendo porque a gente está andando. E tem gente que não quer. E essas pessoas estão ai fazendo barulho, com discurso de ódio, ofensivas, perdidas."

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    "É uma perversão também você pegar essas pessoas e expor. Ecoar [isso] é valorizar uma ignorância profunda", diz. "Não estou me colocando de um jeito superior. Mas para você falar sobre arte você tem que entender a função dela, que é questionar a sociedade de uma forma artística."

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    "Todo mundo hoje é uma 'autoridade'. As pessoas escrevem com uma certeza absoluta, com convicções porque ouvem falar. Isso está construindo um pensamento que não é de identidade real."

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    "A gente está vivendo um processo político no Brasil que é uma novela diária. É uma exposição da ferida do brasileiro, da forma como a gente se organiza socialmente. É impossível não ficar inquieto diante disso."

    Divulgação/TV Glogo
    O ator Fabio Assunção em cena da série "Onde Nascem os Fortes", da Globo
    O ator Fabio Assunção em cena da série "Onde Nascem os Fortes", da Globo

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    Sobre o futuro, Fabio se diz otimista. "Eu estou indo para o sertão, construindo cada cena. Tenho duas peças que estou para fazer. Mas não sei, não sei o que vai acontecer. Não sei se a Coreia do Norte vai jogar um míssil nos Estados Unidos [risos]."

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    Fabio diz não ter receio de envelhecer. "Ou eu estaria pintando a barba [risos]."

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    "A ação do tempo é muito preciosa. A experiência de vida, ela soma. Você vai ficando mais robusto."

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    "Na internet eu vi comentários de que a barba não me favorece, me deixa mais velho. Mas eu não pintei de branco. Estou com 46 anos e essa é a barba que tenho. Como é que algo da minha natureza me envelhece?"

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    Fabio diz que a vida o afastou dos pais e dos irmãos, com quem não se relaciona há mais de dez anos. "A gente foi ficando distante mesmo. Foi uma distância que foi rolando", conta.

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    "Foi muito difícil para mim. Uma ruptura. Mas as coisas vão acontecendo", afirma. "Acostumei com essa ausência. É como as coisas são. A gente tem que trabalhar com o que tem. Amadurecer me trouxe isso. Não passo a vida pensando nas faltas."

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    "Eu estou descobrindo. Estou andando pela vida e vivendo. Aprendendo", diz o ator Fabio Assunção. "Acho que esse é o barato."

    mônica bergamo

    Jornalista, assina coluna com informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999. Escreve diariamente.

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