RIO DE JANEIRO - Há dias, perguntei-me ["Quem morre com mais brinquedos", "Opinião", 6/1] onde fora parar a coleção de trenzinhos que Frank Sinatra mantinha em sua casa na Califórnia. A pergunta procedia. Sinatra fizera da coleção uma forma de purgar velhas humilhações – quando criança, em New Jersey, não podia comprar brinquedos. Anos depois, milionário, teria, se quisesse, um trem de verdade no quintal, com locomotiva, vagões e furgões. Mas, fiel a si mesmo, preferiu os trenzinhos.
Um amigo de Curitiba, José Silveira, deu-me a resposta. A coleção está onde sempre esteve, num anexo da casa. A casa é que há muito não pertence aos Sinatra. Sua mulher Barbara vendeu-a em 1995, quando Frank, aos 80 anos, já não tinha voz ativa – morreria em 1998. O comprador se comprometeu a manter tudo como era. Mas, e a coleção de trens? Sinatra e os filhos queriam doá-la para o Smithsonian Institution, onde ficaria ao alcance geral. Mas Barbara antecipou-se, tabelou-a em US$ 200 mil e a vendeu com a casa.
Fez mal. A coleção, com carrinhos raríssimos correndo por três níveis de trilhos, valia muito mais. E US$ 200 mil eram o que eles ganhariam de dedução fiscal se a tivessem doado. A legislação americana premia a generosidade.
É o que não temos por aqui, me lembra o Zé Silveira. E cita o caso da monumental coleção de cartuns, charges e caricaturas do desenhista Alvarus (1904-1985) que, com sua morte, teve de ser vendida a retalho. Eu próprio me lembrei dos "Arquivos Implacáveis" do jornalista João Condé, com originais, manuscritos e fotos de escritores brasileiros. Não duvido que esse material comece a aparecer na feira da praça 15.
E os arquivos de fotos dos extintos "Jornal dos Sports", "Manchete", "Jornal do Brasil"? O que será deles? Pelo visto, ninguém os ama, ninguém os quer.
É escritor e jornalista. Considerado um dos maiores biógrafos brasileiros, escreveu sobre Nelson Rodrigues, Garrincha e Carmen Miranda. Escreve às segundas,
quartas, sextas e sábados.