As lagartixas, ao menos as catarinenses, têm todo o direito de zanzar pelas paredes, caçar mosquitos e completar sua dieta com outros insetos. Essa opinião não é de nenhum biólogo ou presidente de uma ONG em defesa dos animais, e sim de um juiz.
Alexandre Morais da Rosa, da 1ª Turma de Recursos da Capital, analisou a disputa entre o dono de um ar-condicionado pifado por uma lagartixa intrusa e a importadora do aparelho.
Na decisão a favor do consumidor, ele escreveu que "toda lagartixa tem o direito de circular pelas paredes externas das casas à cata de mosquitos e outros pequenos insetos que constituem sua dieta alimentar".
Rosa negou o recurso da empresa e a condenou a pagar R$ 664 de indenização ao morador de Florianópolis.
"Todo mundo sabe disso [direitos de circular das lagartixas] e certamente também os engenheiros que projetam esses motores, que sabidamente se instalam do lado de fora da residência, área que legitimamente pertence às lagartixas", completou o juiz.
A decisão foi proferida em 7 de fevereiro, data do julgamento do recurso do fabricante do ar-condicionado, mas só se tornou pública agora, com a divulgação da sentença no site do Tribunal de Justiça de Santa Catarina.
O pedido de indenização à Komlog Importação Ltda foi feito em 2011 pelo aeronauta aposentado Antenor Cirtoli, 64, depois que o aparelho que comprara três meses antes apresentar defeito, e os técnicos detectarem que o motor travou por causa de uma lagartixa, encontrada morta nas engrenagens.
"Eu falei com o fabricante, mas eles não me escutaram. Então tentei o Procon, e não houve acordo. Aí eu entrei no tribunal de pequenas causas, não pelo dinheiro, que parece até infantil, mas porque era um direito meu", disse Antenor à Folha.
O fabricante, que recorreu em primeira instância, pode recorrer de novo.
Em nota, a Komlog afirmou que busca sempre oferecer produtos da melhor qualidade para o consumidor e que "não é possível inserir uma proteção ou bloqueio de acesso" ao motor elétrico do ventilador da unidade interna do ar-condicionado.
"Devido às proporções do animal [lagartixa], houve o travamento e, consequentemente, a queima do motor elétrico na unidade interna. Portanto caracterizamos o evento como um imprevisto, uma vez que a Komlog seguiu todas as normas e procedimentos para a fabricação do produto."
Além dos R$ 664 de indenização por danos morais, a empresa foi condenada a pagar R$ 1.500 referentes a honorários advocatícios.
"Tem toda a razão o autor [Antenor] se a ré [fabricante] não se preocupou em lacrar o motor externo do split [modelo do aparelho], agiu evidentemente com culpa, pois era só o que faltava exigir que o autor ficasse caçando lagartixas pelas paredes de fora ao invés de se refrescar no interior de sua casa", acrescentou o juiz em sua decisão.