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    Luteranos mantêm igreja só para negros há 85 anos no Sul

    DANIEL CASSOL
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM CANGUÇU (RS)

    20/04/2013 22h50

    Ladeado por plantações de fumo e milho, um distrito rural no extremo sul do país mantém a rara tradição de dividir os fiéis luteranos em duas igrejas, separadas por apenas um quilômetro. Uma delas é "dos negros" e a outra, "dos alemães".

    A origem da divisão está na proibição, no início do século 20, de ex-escravos e seus descendentes frequentarem os cultos dos imigrantes que vieram da Europa.

    Entrar em uma ou em outra igreja não é mais proibido. O costume de rezar em templos separados, porém, permanece em Canguçu, município de 53 mil habitantes a 300 km de Porto Alegre.

    A cidade tem o maior percentual de habitantes na zona rural do país (63%) e é o segundo maior produtor nacional de fumo. A maioria dos agricultores é de descendentes de alemães ou de remanescentes de quilombos.

    No quarto domingo da Quaresma, em março, a Folha visitou um culto da congregação Manoel do Rego, fundada em 1927. A maioria dos 28 presentes, de sobrenomes Silva, Borges e Souza, eram negros quilombolas.

    Perto dali, andando por uma estrada de terra margeada por casas simples do distrito de Solidez, chega-se à congregação Redentora, dos alemães. O pastor de ambas igrejas é Edgar Quandt, 62, descendente de europeus.

    RARIDADE

    Os principais ramos luteranos em atuação no país, a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil e a Igreja Evangélica Luterana do Brasil --à qual pertence a Manoel do Rego--, não têm registros de outro grupo com características semelhantes.

    Segundo o professor Ricardo Rieth, da Universidade Luterana do Brasil, o caso de Canguçu é isolado, pois as igrejas luteranas não permitiam a entrada de negros.

    Rieth diz que embora a igreja tenha desenvolvido no mesmo período outras missões em comunidades negras e indígenas do Rio Grande do Sul, havia resistência de imigrantes alemães para as tentativas de integração promovidas pelos pastores.

    Com a expansão das igrejas luteranas, não é rara a presença de negros entre os seguidores no Brasil.

    Hoje, as duas congregações realizam festas e outras atividades conjuntas. O coral masculino da congregação Redentora tem integrantes das duas comunidades.

    "Não há discriminação, como às vezes parece de fora. Eles gostam de ter [cada um] a sua congregação. Há uma integração muito boa em toda a nossa igreja", afirma o pastor Quandt.

    A ideia de unificar as duas igrejas foi debatida. Embora a relação seja definida como boa, a decisão foi de manter "cada um na sua", diz o presidente da associação quilombola do local, Marco Antônio Matos, 40.

    Editoria de Arte/Folhapress

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