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    Entidades criticam governo Alckmin por omitir dados de violência policial

    THIAGO AMÂNCIO
    DE SÃO PAULO

    23/10/2015 12h14

    Entidades ligadas à proteção de direitos humanos e especialistas em violência criticaram, nesta sexta-feira (23), a estratégia da gestão Geraldo Alckmin (PSDB) de divulgar parcialmente estatísticas sobre mortes causadas por policiais em São Paulo.

    O secretário da Segurança Pública, Alexandre de Moraes, liberou na quinta (22) números de mortes por PMs em serviço em SP, que mostram uma queda de 20% no terceiro trimestre em relação ao mesmo período em 2014. Na comparação com o acumulado do ano, a redução foi de apenas 2%.

    A gestão, porém, omitiu os números de mortes por PMs de folga e por policiais civis. No trimestre anterior, eles foram liberados em conjunto. Após reiterados pedidos da Folha, a secretaria divulgou os dados às 21h. Eles mostram que fatiar as estatísticas permite à pasta obter recortes favoráveis. Com isso, a letalidade policial nos primeiros nove meses do ano subiu 1% –apesar da queda de 2% das mortes por PMs em serviço.

    O advogado Rafael Custódio, da ONG Conectas Direitos Humanos, chama os recortes da secretaria de Segurança Pública de "tentativa muito pouco nobre de esconder o que não se pode." Para ele, "nada justifica um falseamento de informação."

    O pesquisador do Núcleo de Estudos em Violência da USP, Bruno Paes Manso, doutor em ciência política, diz que o recorte dos dados sobre letalidade policial coloca em xeque políticas bem sucedidas da gestão Alckmin.

    "Joga por água abaixo um instrumento republicano fundamental para entender o que acontece nas cidades, que é a divulgação de estatísticas. Pode parecer esperteza a curto prazo, mas é uma tragédia a médio prazo. Desacredita políticas bem sucedidas: será que de fato alguma ação deu certo ou foi divulgada de tal maneira para manipular a opinião pública?", diz Manso.

    José Carlos Abissamra Filho, advogado e membro do IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), afirma que a divulgação parcial das estatísticas viola a Constituição, que estabelece o direito à informação. "É preciso tomar cuidado com números. A letalidade policial é muito alta e preocupante, a gente mata como se estivéssemos em guerra."

    Infográfico: Letalidade policial

    O número de mortes por policiais militares de folga, também omitido por Moraes, foi maior no terceiro do que no segundo trimestre do ano. Mas não é possível saber se cresceu ante 2014 porque a gestão Alckmin mantém os dados do ano passado em segredo –apesar dos pedidos da Folha.

    Foi em horário de folga que PMs são suspeitos de comandar a maior chacina do ano no Estado, em agosto, quando ao menos 23 pessoas foram assassinadas em Osasco e Barueri (Grande SP). O caso é investigado por uma força-tarefa do governo e não faz parte da estatística divulgada.

    Outro caso de repercussão envolvendo policiais terminou com a morte de dois suspeitos de roubar uma moto, em setembro, no Butantã (zona oeste). Mesmo rendidos, foram baleados –parte da ação foi flagrada em vídeo.

    Os dados da violência, antes da chegada de Moraes ao cargo, em janeiro, eram divulgados de uma só vez no dia 25 de cada mês. Os de letalidade policial, trimestralmente, todos juntos. Agora, os balanços são picotados. No mês passado, ele antecipou as estatísticas de homicídio só da capital e reteve dados de região metropolitana e interior.

    Infográfico: Evolução das mortes pela polícia

    OUTRO LADO

    Em nota, a secretaria da Segurança Pública afirma que os dados de letalidade são divulgados a cada três meses, até 30 dias após o fim do trimestre, e que os números são publicados mensalmente no Diário Oficial, "o que demonstra transparência."

    "São Paulo é um dos poucos estados que contabilizam mortes provocadas por policiais fora de serviço. Seus dados criminais são classificados como um dos mais confiáveis pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública", disse a pasta, via assessoria de imprensa.

    "Não está havendo nenhum fracionamento nem tampouco há escolha de índices bons ou ruins. Os dados divulgados são feitos em sua inteireza e colocados imediatamente no site", continua o órgão.

    "Os dados, sejam bons ou ruins, sempre são divulgados em respeito à publicidade e transparência", completa.

    Nesta quinta, depois de uma palestra sobre segurança e liberdade na FMU (Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas), na capital paulista, o secretário Alexandre de Moraes disse que sua gestão não tolera abusos por parte da polícia.

    "Minha prioridade é uma polícia forte que atue dentro da legalidade. Eu não tolero abusos. Isso vem sendo demonstrado na diminuição da letalidade", afirmou, ao anunciar os números divulgados parcialmente.

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