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    tragédia no rio doce

    Em 2014, ano de seca, Samarco elevou em 74% consumo de água

    ESTÊVÃO BERTONI
    DE SÃO PAULO

    04/02/2016 02h00

    Em 2014, ano em que uma seca severa fez a Prefeitura de Mariana (MG) usar mais de 20 caminhões-pipa para abastecer parte da cidade, a Samarco elevou o consumo de água em sua unidade em 74%.

    O aumento se deve à conclusão, naquele ano, do projeto de expansão da empresa, visando alta de 37% em sua capacidade produtiva.

    Foram inaugurados, em 2014, um terceiro concentrador (equipamento que eleva o teor de ferro do minério e o transforma em polpa) e um terceiro mineroduto, para transportar o material até a unidade de Anchieta (ES).

    A água é fundamental no beneficiamento e transporte da polpa. Antes de seguir para o mineroduto, capaz de transportar 20 milhões de toneladas de minério, o material recebia 30% de água.

    Com a seca, a Samarco começou a captar água em Santa Bárbara (MG) para abastecer os tanques do novo concentrador. A cidade virou a principal fonte da empresa em 2014, mas a outorga venceu em dezembro daquele ano.

    A mineradora solicitou ao Estado a renovação da autorização, mas o pedido não chegou a ser analisado.

    CONSUMO

    O consumo total da Samarco saltou de 16,9 milhões de m³ em 2013 para 29,5 milhões de m³ em 2014. Segundo a mineradora, mesmo com a seca na região, não houve "declaração de restrição hídrica" nas bacias onde capta água.

    Segundo estimativa do professor do departamento de engenharia hidráulica e recursos hídricos da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), Marcelo Libânio, o volume captado em 2014 pela Samarco é suficiente para abastecer uma cidade de 350 mil habitantes, seis vezes a população de Mariana.

    Em Mariana, a seca prejudicou cerca de 40% dos moradores na parte baixa da cidade, diz Jonathan Chaves, diretor executivo do SAAE, o serviço de águas da cidade.

    Em 2015, os moradores continuaram a ter problemas devido à falta de estrutura da cidade para suportar o aumento da população atraída pela mineração, segundo Chaves.

    "Criou-se uma cultura aqui de abastecer os reservatórios das casas com o caminhão-pipa. A gente está tentando agora mostrar que isso é uma alternativa, um paliativo."

    O deputado Paulo Lamac (Rede) apresentou em 2014 na Assembleia de Minas um projeto de lei que obriga as empresas a devolver ao Estado 50% da água usada em dutos que correm para o mar.

    "Temos uma perda real de água doce no território, suficiente para abastecer uma cidade de médio porte. Ela deixa de evaporar aqui e desequilibra o balanço hidrológico", afirma o deputado.

    Segundo a Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais, a Samarco pagou R$ 3,6 milhões pelo uso da água de 2012 a 2015 em duas bacias. Do total captado, 40% são usados nos minerodutos e acabam no Espírito Santo.

    Para Libânio, levar a água de volta para Minas exigiria um número "escandaloso de estações elevatórias" para vencer os desníveis. "E isso teria um custo exorbitante."

    OUTRO LADO

    A Samarco, mineradora que pertence à Vale a à anglo-australiana BHP Billiton, diz que a captação de água para a unidade de Mariana não ocorre de forma linear nem em único ponto, o que "afasta possíveis impactos negativos nas áreas próximas".

    "O uso da água pela Samarco não concorre diretamente com captações de água urbana. A outorga para uso industrial prevê estudos prévios para estabelecer limites sustentáveis de uso de água", afirma a empresa, em nota.

    A mineradora diz ainda que, em 2014, passou a contabilizar entre suas fontes de captação de água nova o reservatório de Santarém, antes considerado como de "água reutilizada".

    IMPACTO

    Segundo a empresa, isso "impactou" o indicador de consumo total da Samarco naquele ano. A água de Santarém, porém, representou em 2014 apenas 8,5% do volume consumido pela empresa.

    A reportagem questionou a mineradora sobre a quantidade utilizada em 2015, mas não obteve resposta.

    Sobre o volume utilizado nos minerodutos para transportar a polpa de minério até o Espírito Santo, a empresa diz que não capta água unicamente com essa finalidade. "Independentemente dos minerodutos, a captação de água é necessária em função da natureza do processo industrial", afirma.

    Segundo o SAAE, o serviço de água de Mariana, a prefeitura perfurou em 2015 dez poços artesianos para aumentar a oferta de água no município e recuperou outros oitos, "inclusive com apoio [financeiro] da Samarco".

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