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    Bandidos pedem 'dinheiro digital' para libertar refém de sequestro

    ROGÉRIO PAGNAN
    DE SÃO PAULO

    03/05/2017 02h00

    Deic/Divulgação
    Ação policial desmontou cativeiro na zona leste de SP
    Policial imobiliza criminoso em cativeiro na zona leste de SP onde mulher foi mantida

    O sequestro de uma mulher de 32 anos, de Florianópolis, terminou neste final de semana em São Paulo com o "estouro" do cativeiro e a liberação da vítima sem o pagamento de resgate.

    Apesar do sucesso da ação policial, a notícia deste crime trouxe preocupação à segurança pública do país pela forma como os criminosos exigiam o pagamento do resgate: via criptomoedas. Conhecido genericamente no mundo digital como bitcoins, esse dinheiro digital é utilizado para compras legais de produtos, mas também para diferentes transações ilegais.

    Um crédito comprado no Brasil, por exemplo, pode ser sacado em dinheiro em qualquer parte do mundo ou ser usado na compra de armas e drogas na chamada "deep web" –a internet profunda. Além de serem isentas de cobranças de taxas, as transações são feitas sem a possibilidade de rastreamento.

    A exigência de moeda digital até então era conhecida pela polícia em extorsões para a liberação de dados como em ações de hackers no roubo de senhas de e-mails e de redes sociais, por exemplo. Em crimes chamados comuns, segundo a própria polícia, é caso totalmente novo.

    "Isso [pedido de resgate com moeda digital] não é raro. Isso é inédito no mundo", disse o delegado Anselmo Cruz, da Divisão Antissequestro de Santa Catarina e responsável pela investigação. "Qual é a tentativa aí? Em vez de ter alguém carregando dinheiro, sair para outro lugar para esconder o dinheiro, eles conseguem fazer isso num clique. Algo instantâneo."

    Para o sociólogo Luís Flávio Sapori, professor da PUC Minas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança, essa é notícia merece a "atenção total das forças de segurança" por abrir uma série no país. "É um case muito preocupante que pode inaugurar uma nova era de sequestros na sociedade brasileira, um tipo de crime que caiu um desuso nos últimos 20 anos", diz.

    Deic/Divulgação
    Ação policial desmontou cativeiro na zona leste de SP
    Ação policial desmontou cativeiro na zona leste de SP

    CRIME

    A vítima do sequestro é a mulher do empresário brasileiro Rocelo Lopes, dono da CoinBr, a maior empresa da América Latina para o comércio de criptomoedas. O casal vive em SC desde 2015. Ela foi atacada por volta das 13h30 da última quarta (26) na Lagoa da Conceição, área nobre de Florianópolis, logo após ter deixado a filha de seis anos na escola.

    Por serem endereços próximas, a mulher voltava caminhando para casa. Após ser colocada em um veículo, foi transportada até uma casa no Cangaíba, bairro da zona leste da capital paulista, onde ficou em poder do bando até o último sábado (29).

    Cerca de duas horas após o ataque, um dos bandidos entrou em contato com o empresário para solicitar o pagamento do resgate.

    De imediato, o interlocutor do bando informou como queria o pagamento. "Nós não 'quer' porra de reais, não. Nós 'quer' nas moedas... nas criptomoedas, entendeu? Nós 'quer' receber em criptomoeda", diz o criminoso, em mensagem de áudio.

    O pedido inicial de resgate foi em dois tipos de moedas, Zcash e Monero, que são mais difíceis de rastreamento. O montante indicava, porém, que os criminosos tinham informações limitadas sobre esse tipo de comércio, já que o pedido somava algo em torno de R$ 115 milhões. "Eu pensei que fosse trote e desliguei o telefone", disse à Folha o empresário Lopes.

    Nas tratativas seguintes, o valor foi reduzido para R$ 5 milhões, mas não chegou a ser pago. Com a ajuda de policiais paulistas, equipes da Polícia Civil de Santa Catarina encontraram o cativeiro na manhã de sábado. Um homem foi preso na ação. De acordo com policiais, ele não tinha registro de antecedentes criminais e afirmou ter sido contratado apenas para tomar conta da casa.

    A vítima, segundo a família, não sofreu nenhum tipo de agressão física.

    A polícia catarinense continua as investigações para tentar descobrir quem são os comparsas do preso. A principal suspeita é de ter havido a participação de seis homens na ação, todos radicados em São Paulo e possivelmente ligados à facção criminosa paulista PCC. O delegado Cruz, da Divisão Antissequestro de SC, diz acreditar que o crime vinha sendo planejado há pelo menos nove meses.

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