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    Polícia faz megaoperação de combate ao tráfico na cracolândia

    ROGÉRIO PAGNAN
    DANILO VERPA
    DE SÃO PAULO

    21/05/2017 07h29

    A polícia de São Paulo realiza na manhã deste domingo (21) aquela que é considerada pelos órgãos de segurança como uma das maiores operações de combate ao tráfico de drogas na cracolândia, na região central da capital.

    Os agentes soltaram bombas na região, a partir das 6h49 da manhã, e avançaram para desmantelar a feira livre de drogas que opera no local, vendendo principalmente crack.

    Policiais ouvidos pela Folha afirmam que, após a operação policial, homens da Guarda Municipal devem se instalar na região para não permitir a volta do tráfico.

    Parte da operação foi acompanhada pelo governador Geraldo Alckmin (PSDB). Segundo ele, a ação policial visa a prisão de traficantes e apreensão drogas e armas. Sobre os usuários, ele disse que o Estado oferece tratamento para os que buscam abandonar o vício. "Dependência química é igual apendicite. Você precisa tratar da pessoa", disse ele.

    Ao menos 69 traficantes —dentro e fora do chamado "fluxo"— estão na mira dos policiais do Denarc (departamento de narcóticos) como suspeitos de irrigar o comércio de entorpecentes na área. Há mandados de prisão contra todos eles.

    Cracolândia - Operação policial - Fluxo - Onde fica - Perfil dos usuários

    Até o momento, segundo a polícia, foram presas 38 pessoas, incluindo os oito principais traficantes da área e um grupo suspeito de traficar e realizar a segurança armada da cracolândia.

    Foram aprendidas armas (entre pistolas e revólver), um simulacro de metralhadora e uma grande quantidade droga.

    Também há mandados judiciais para busca e apreensão em cerca de 80 locais diferentes na zona leste e norte da capital e em alguns endereços na Grande São Paulo e no litoral paulista.

    São estimados cerca de 900 homens e mulheres nesta operação, sendo metade da Polícia Civil e metade da Polícia Militar, que realiza o cerco da área com homens da tropa de choque. A entrada no fluxo foi realizada apenas por policiais civis.

    rua da cracolândia

    Essa ação vinha sendo desenhada desde fevereiro pelo Denarc, com o levantamento de imagens dos principais traficantes que operam ali e a preparação das equipes táticas para invasão de prédios e pontos de interesse dos investigadores.

    O estudo foi pensado pela cúpula da Polícia Civil para tentar evitar ao máximo possível o confronto com traficantes e a morte de algum usuário.

    Nos últimos dias, porém, o clima no local estava tenso, com a identificação de criminosos armados, que já fizeram disparos contra policiais militares em ao menos duas oportunidades, e a descoberta de orientações de integrantes de organização criminosa (PCC) para resistir à ações policiais.

    A data das prisões, um domingo de manhã, foi escolhida para tentar evitar transtorno à vida dos paulistanos, como ocorreu no início deste mês, quando policiais militares e guardas civis entraram em confronto com um grupo liderado por traficantes. Houve tiros, barricadas com fogo, saques no comércio da região e reflexo no trânsito na cidade.

    Ao mesmo tempo, a programação da Virada Cultural está ocorrendo em regiões próximas no centro da cidade.

    vídeo

    Uma grande intervenção na cracolândia vinha sendo discutida entre policiais e representantes da Prefeitura de São Paulo, que tem planos de instalar ali o programa Redenção. Até o final do mês passado havia, porém, um impasse sobre o sistema de segurança ostensivo no local, para evitar que a feira livre das drogas voltasse a imperar.

    A última grande operação do Denarc na cracolândia se deu em agosto do ano passado, quando 32 pessoas foram detidas sob a suspeita de integrar uma das células que abastecem a área de entorpecentes.

    Esse grupo era liderado por representantes de movimento sem-teto na capital, que, segundo a polícia, tinha como entreposto de drogas um hotel conhecido na cidade, o Cine Marrocos.

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    Programas sociais na cracolândia

    RECOMEÇO

    Criação: Governo do Estado (jan.2013, sob Alckmin)
    Objetivos: Tratar o usuário com medidas ambulatoriais, inclusive internações compulsórias
    O que oferece: Acesso a tratamento, internação se preciso, encaminhamento a capacitação e recolocação profissional
    Orçamento anual: R$ 80 milhões
    Gasto por usuário: R$ 1.350 por mês (internação)

    BRAÇOS ABERTOS

    Criação: Prefeitura de SP (jan.2014, sob Haddad) - Foi extinto por Doria
    Objetivos: Reinserir o dependente na sociedade e estimular a diminuição do consumo de drogas
    O que oferece: Moradia em hotéis, 3 refeições por dia, apoio em tratamentos, profissionalização e emprego
    Orçamento anual: R$ 12 milhões
    Gasto por usuário: R$ 1.320 por mês

    REDENÇÃO

    Criação: Prefeitura de SP (mai.2017, sob Doria)
    Objetivos: Unir os dois programas, visando tanto a reinserção do usuário como o tratamento clínico
    O que oferece: Moradia distante do "fluxo", trabalho em empresas privadas e encaminhamento a tratamento
    Orçamento anual: Ainda não estimado
    Gasto por usuário: Ainda não estimado

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    OPERAÇÕES E TUMULTOS

    A cracolândia já foi alvo de uma série de operações das gestões Geraldo Alckmin (PSDB) e Fernando Haddad (PT) nos últimos anos, mas que não conseguiram impedir a concentração de usuários de crack e a presença dominante do tráfico.

    Na região, Estado e prefeitura desenvolvem programas diferentes voltados aos dependentes. O programa Braços Abertos, criado em 2014 pela gestão Haddad, é baseado na redução de danos. O dependente é incentivado, pela oferta de emprego e renda, a diminuir o uso de drogas, sem necessidade de internação.

    O Recomeço, instituído por Alckmin em 2013, trabalha a saída do vício com tratamentos que incluem isolamento em hospitais e comunidades terapêuticas, incluindo internação compulsória.

    Como desde o início do ano ambos são comandados por correligionários do PSDB, prefeitura e Estado vêm tentando agora articular conjuntamente um programa para combater o tráfico na região, evitando que ações policiais sejam disparadas sem o conhecimento da gestão municipal, como aconteceu em episódios anteriores.

    Descaminhos da cracolândia

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    Cronologia

    Operações e projetos na cracolândia que não deram certo

    Set.2005
    A gestão Serra-Kassab dá início ao projeto Nova Luz, que pretendia recuperar a área com investimento público e privado, mas o modelo não vingou

    Fev.2008
    O então prefeito Gilberto Kassab (PSD) afirma que a cracolândia não existe mais. "Não, não existe mais a cracolândia. Hoje é uma nova realidade", declarou. O consumo de drogas, no entanto, continuou explícito

    Jan.2012
    Polícia Militar intensifica a Operação Centro Legal e ocupa as principais ruas da Luz com cerca de 300 homens. Dependentes que se concentravam na rua Helvétia se dispersam para outros pontos da região

    15.jan.2014
    Assistentes sociais e funcionários da prefeitura retiram usuários e limpam a rua. Segundo a prefeitura, 300 pessoas foram cadastradas no programa Braços Abertos, da gestão Haddad (PT). O tráfico, porém, persistiu

    23.jan.2014
    Três policiais civis à paisana vão ao local para prender um traficante e usuários reagem com paus e pedras. A confusão aumentou com chegada de reforços e terminou com cerca de 30 detidos

    29.abr.2015
    Operação desarticulada da prefeitura e do governo do Estado transforma o centro em uma praça de guerra, com bombas de gás, furtos a pedestres e depredação de ônibus. Dois dias depois, fluxo retornou. Haddad chamou ação de 'sucesso'

    5.ago.2016
    Polícia realiza ação com 500 homens na cracolândia e no Cine Marrocos, prédio ocupado por sem-teto no centro, e prende 32 pessoas

    Editoria de Arte/Folhapress
    A céu aberto - como funciona o tráfico na Cracolândia

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