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    Violência restringe entrega de produto pelos Correios em 29% da cidade de SP

    ROGÉRIO PAGNAN
    DANIEL MARIANI
    FÁBIO TAKAHASHI
    DE SÃO PAULO

    27/12/2017 02h00

    O alto índice de assaltos levou os Correios a restringirem ou até mesmo a não entregarem produtos em quase um terço da cidade de São Paulo, o que afeta a vida de cerca de 4,5 milhões de pessoas.

    Há problemas na distribuição em mais da metade dos distritos da capital (57 dos 96 existentes), principalmente na periferia, onde a restrição chega a 99,96% das ruas do Itaim Paulista, na zona leste.

    Os dados integram um levantamento inédito feito pela Folha com base no sistema de informações dos Correios.

    A reportagem analisou a situação de entrega para 43.730 CEPs da capital paulista (só 3% do total ficaram de fora, por falhas de sistema) e detectou restrição –completa ou parcial– em 13.410.

    Com base nos CEPs, foram calculados os quilômetros de ruas com algum tipo de restrição –são 29% do total. Foi estimada também a população afetada, considerando número de habitantes nos distritos.

    Esses moradores normalmente não recebem em suas casas itens como roupas, brinquedos e eletrônicos.

    Existem dois tipos de restrição adotados pelos Correios para locais considerados perigosos pela empresa.

    Em um deles, que abrange 24% das ruas, a instituição afirma que a entrega exigirá recursos especiais de segurança, como escolta armada, o que pode mais que dobrar os prazos para entrega.

    Se fizer a consulta no site da empresa, o cliente também já fica ciente de que talvez o produto não seja entregue no endereço especificado e ficará em central de distribuição para ser retirado lá.

    No outro tipo de restrição, que abrange 5% da cidade, o produto não é entregue de nenhuma forma e vai direto para a unidade de distribuição.

    Os locais de retirada são informados pela instituição em avisos deixados pelos carteiros nas casas dos destinatários (correspondências são entregues nessas áreas).

    DELITOS

    Os Correios informaram que as restrições são adotadas "levando em consideração o histórico de delitos praticados" contra a instituição.

    "Periodicamente a área de segurança da empresa realiza estudos para verificar se as condições de segurança das regiões em questão voltaram à normalidade. Porém, apenas o fim da violência nas cidades permitiria a entrega convencional em todos os locais", afirma a nota oficial.

    Distritos com maior percentual de restrição nos Correios tendem a ser os que mais sofrem com roubos em geral. Na periferia da zona sul, Capão Redondo tem restrição em 98% das ruas e o segundo maior número de roubos da cidade, de acordo com dados do governo estadual.

    A Secretaria da Segurança Pública da gestão Geraldo Alckmin (PSDB), responsável pelas polícias do Estado, disse que a situação não é tão crítica quanto mostra o levantamento da Folha e que roubos de carga estão em queda.

    PAPAI NOEL

    As agências dos Correios na periferia ficam cheias de pessoas em busca dos produtos.

    É o caso de um centro de distribuição em Itaquera (zona leste), próximo ao estádio do Corinthians, usado na abertura da Copa do Mundo em 2014. Metade do distrito tem restrição total de entrega.

    O autônomo César Augusto Vilas Boas de Lima, 47, que estava na unidade no último dia 21, é um dos que sofrem com a limitação do serviço.

    Comerciante de produtos pela internet, Lima diz que algumas vezes envia roupas para clientes que não sabem que estão em área sem entrega.

    Consumidores se revoltam com a necessidade de retirada nas agências e desistem da compra. "Preciso ir retirar na agência porque eles também não entregam no meu endereço. Às vezes nem compensa porque fica mais caro o combustível do que a peça."

    Em Itaim Paulista (zona leste), buscava produtos quatro dias antes do Natal a dona de casa Thamires de Oliveira Damatto, 28, grávida de nove meses. Estavam com ela os filhos Miguel, 6, e Bernardo, 3.

    Os meninos haviam mandado cartas para o Papai Noel dos Correios (programa em que voluntários recebem pedidos feitos por crianças).

    Os dois foram sorteados, mas o bom velhinho não quis arriscar. Pediu, em uma cartinha, que eles retirassem os presentes na agência.

    "Eles esperavam que ao menos estivesse o Papai Noel entregando os presentes na agência, mas não tinha ninguém. Ficaram decepcionados", disse a mãe.

    Também reclamava no local o polidor de aeronaves Emanuel Gomes, 51. "Moro a 150 metros de agência dos Correios e não entregam na minha casa porque dizem que é área de risco. Fico indignado, eles não fazem a entrega de graça; cobram por isso."

    CRIMES

    Os roubos de carga, aos quais se enquadram assaltos a produtos que os Correios entregam, subiram neste ano, até novembro, 10% no Estado, 1,2% na cidade e 27% na Grande SP –próxima de bairros periféricos paulistanos.

    Houve uma sequência de três meses de queda no crime desde setembro no Estado, que chegou a ter 15 altas consecutivas desde junho de 2016.

    Segundo Silvana Regina Azeredo dos Santos, 52, diretora do Sindicato dos Trabalhadores dos Correios, os ataques aos Correios se agravaram nos últimos dois anos.

    Santos afirma que há trabalhadores que foram vítimas de roubo mais de 30 vezes.

    Muitos dos funcionários, diz ela, são agredidos nesses roubos e acabam afastados do trabalho por problemas psicológicos –o que deixa ainda mais desfalcado o quadro de servidores da empresa.

    "Tirando a região central, os criminosos veem os carros dos Correios e já enxergam dinheiro em caixa", afirmou ela.

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    SEGURANÇA

    A Secretaria da Segurança Pública paulista diz que as polícias vêm trabalhando no combate a roubos de cargas.

    A pasta, representante do governo Geraldo Alckmin (PSDB), afirma também que, neste ano, em "mais da metade" dos 93 distritos policiais da capital não houve registro de roubo aos Correios (a afirmação desconsidera, porém, que a empresa restringe entrega nos locais perigosos).

    O governo diz ainda que em 30 distritos da capital paulista houve, em 11 meses, o registro de um a três roubos contra os Correios. A pasta não informou o total de crimes registrados no período.

    "As polícias Civil e Militar atuam conjuntamente na segurança e ambas mantêm contato com representantes dos Correios para que registrem as ocorrências", diz nota enviada à reportagem.

    De acordo com o governo, no combate ao roubo de cargas, "a Polícia Militar realiza mapeamento dos locais e diversas ações e abordagens em veículos de carga, por meio das operações".

    Na capital, diz a nota oficial, houve a prisão de 45 pessoas por envolvimento de roubo de carga em novembro passado, mês em que houve redução de 27% neste tipo de crime, em comparação com o mesmo período de 2016.

    Ainda de acordo com a Segurança Pública, a Folha erra ao relacionar a restrição de entrega de produtos pelos Correios à falta de segurança nas regiões -essa relação foi feita pela própria empresa de distribuição, quando questionada pela reportagem sobre a restrição a CEPs.

    "Por exemplo, se considerados os índices de roubos em geral nos nove locais apontados pelo veículo [a Folha]", afirma o governo, "verifica-se que em seis houve diminuição, o que é resultado do trabalho intensivo e diuturno das polícias nessas áreas".

    O governo diz ainda que as duas delegacias seccionais responsáveis pelas regiões mais problemáticas prenderam, no semestre, oito pessoas em flagrante por roubo aos Correios, além da apreensão de um menor de idade por roubo a um carteiro na Vila Jacuí.

    CORREIOS

    Os Correios, que confirmaram a dimensão do levantamento da Folha, informaram que o "modelo alternativo" para a entrega de encomendas busca garantir a segurança "dos trabalhadores e evitar que os objetos sejam roubados". Diz ainda que as informações sobre as áreas com restrição estão em seu site.

    Para melhorar "a experiência dos destinatários", os Correios afirmam ter desenvolvido sistema em que a entrega pode ser feita em agência a ser escolhida pelo cliente.

    "Ele pode optar por endereço que seja mais cômodo, como uma unidade mais próxima do trabalho ou um shopping, por exemplo. São 7.000 unidades disponíveis."

    Ainda segundo os Correios, a "competência para o enfrentamento" da insegurança "é do Estado".

    "Por isso, a empresa desenvolve ações preventivas em parceria com os órgãos de segurança, em nível estadual e federal, para investigar e coibir os assaltos. As ocorrências são imediatamente comunicadas aos órgãos de segurança pública (Polícia Federal, Polícia Militar) para as devidas providências", diz.

    Os Correios não informaram a quantidade de roubos, números de funcionários afastados nem prejuízo com pagamento de seguro.

    Editoria de arte/Folhapress
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