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    Brasileiro tomaria menos 'refri' se preço fosse salgado, aponta pesquisa

    NATÁLIA CANCIAN
    DE BRASÍLIA

    09/09/2017 02h02

    Thinkstock

    Se o peso na balança não é suficiente para fazer as pessoas deixarem de fora da mesa o refrigerante e outras bebidas açucaradas, o aumento no preço desses produtos pode ser uma opção.

    É o que mostram dados de uma pesquisa feita pelo Datafolha a pedido da ONG ACT Promoção da Saúde, que atua em prol de medidas contra obesidade e doenças crônicas.

    Questionados sobre como reagiriam diante de um possível aumento de imposto de refrigerantes e sucos industrializados que elevasse o preço desses produtos, 74% dos entrevistados afirmam que reduziriam o consumo. Destes, 23% diminuiriam "um pouco", e 51%, "muito".

    Os demais afirmam que já não os consomem ou não mudariam em nada o padrão –percentual que é maior entre jovens e mais ricos. Uma parcela mínima, 3%, diz que aumentaria –a pesquisa não traz os motivos.

    Foram ouvidas 2.070 pessoas acima de 16 anos em 129 municípios, em amostra equivalente ao perfil populacional do país. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.

    A ideia era testar o impacto e adesão de propostas hoje em discussão no país na área de alimentos.

    Editoria de Arte/Folhapress

    A possibilidade de aumentar a taxação de bebidas açucaradas é alvo de estudos desde o início deste ano pelos Ministérios da Saúde, Desenvolvimento Social e Fazenda, entre outros órgãos.

    Um dos impulsos para o debate vem da Organização Mundial da Saúde, que tem recomendado aos países medidas mais firmes para o controle da obesidade. Hoje, mais de metade da população brasileira apresenta excesso de peso, e 18,9% são obesos, o que aumenta o risco de doenças crônicas.

    Representantes da indústria, porém, negam que os produtos sejam a causa de obesidade. "E os alimentos? Vamos taxar a bebida açucarada e não vamos taxar o salgadinho, a coxinha e o biscoito achocolatado? Em termos percentuais de açúcar, alguns são muito mais pesados", afirma Alexandre Jobim, da Abir (Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e de Bebidas Não Alcoólicas).

    Para ele, a medida afetaria os mais pobres e traria pouco resultado nos índices de obesidade a curto prazo.

    METAS

    Entidades de saúde favoráveis à medida, no entanto, contestam. Segundo a diretora-executiva da ACT, Paula Johns, o objetivo dessa política não é reduzir obesidade de forma imediata, mas sim melhorar a qualidade da alimentação. "O objetivo é reduzir o consumo, melhorar a qualidade da alimentação e, ao longo do tempo, melhorar os indicadores de saúde", diz.

    Ela lembra que ação semelhante já teve bom resultado contra o cigarro: dados do Ministério da Saúde mostram que o percentual de fumantes, que já vinha em queda, "despencou" com a regulação de preço. "E isso a pesquisa mostra claramente: o baixo preço é um incentivo grande para o consumo. No tabaco, também tínhamos adotado medidas educativas, mas a mais eficaz foi a imposição de preço".

    Além da obesidade, outro argumento para a taxação de refrigerantes é o fato de que parte das empresas tem hoje créditos tributários por estar na zona franca de Manaus.

    "Infelizmente é incentivado", disse na última semana o ministro da Saúde, Ricardo Barros, para quem a medida de aumentar a tributação seria "saudável".

    Segundo ele, a pasta aguarda resultado dos estudos para avançar na defesa da proposta, que também tem apoio do Inca (Instituto Nacional do Câncer).

    Além da taxação, a pesquisa também analisou o grau de adesão da população a outras duas medidas: a restrição da publicidade de alimentos industrializados para crianças e uma mudança nos rótulos dos alimentos.

    A primeira é apoiada por 71% dos entrevistados. Já a segunda, que prevê a inserção de alertas nas embalagens sobre o teor de açúcar, sal e gorduras na parte da frente dos rótulos, tem adesão de 88%.

    Para Laís Amaral, nutricionista do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), o resultado coincide com estudos feitos pela entidade, e que apontam que 40% dos brasileiros não compreendem o rótulo. "Há letras pequenas, além de dificuldade em compreender as informações nutricionais e os termos técnicos", diz.

    Em nota, a Abia (Associação Brasileira das Indústrias de Alimentos) informa ser favorável a melhorias nos rótulos, mas afirma que "qualquer modelo de rotulagem não é capaz de substituir uma ação ampla de educação alimentar e nutricional que oriente a população a entender as informações e saber como compor uma alimentação equilibrada".

    SEMÁFORO OU ADVERTÊNCIA?

    Ao mesmo tempo em que ganha apoio da população, a discussão sobre um novo modelo de rótulo nutricional para os alimentos avança no país.

    Hoje, há dois modelos principais para rótulos de alimentos em análise pelo governo. O plano é que haja informações obrigatórias na frente da embalagem, que alertariam para o teor de açúcar, sal, gorduras e calorias, segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

    Um deles, defendido pela Abia (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos), é a adoção de uma espécie de semáforo numérico que possa informar a quantidade de cada componente e mostrar se está abaixo ou acima da recomendação máxima diária de consumo.

    A Folha teve acesso à proposta apresentada no último mês à Anvisa. Assim, o verde seria usado quando a quantidade está abaixo desse parâmetro. Já o amarelo quando está próximo e o vermelho quando o ultrapassa. Em geral, o modelo é semelhante ao usado hoje no Reino Unido.

    Editoria de Arte/Folhapress

    Outra proposta é a adoção de símbolos de advertência, como círculos e triângulos pretos, para os casos em que há alto teor ou excesso de açúcar, sal e gorduras. Um padrão semelhante é adotado no Chile, cujas imagens foram utilizadas pelo Datafolha e ACT para questionar a opinião da população sobre a inclusão dos alertas no rótulo. A proposta é bem vista por entidades como a Organização Pan-Americana de Saúde e Idec.

    "É um modelo que não tem que interpretar. O preto é como se fosse um carimbo no alimento. Você visualiza e sabe que não faz tão bem para a saúde. Já o modelo de semáforo ainda precisa de interpretação", diz Laís Amaral, do Idec.

    Para ela, a proposta de semáforo pode levar o confundir alguns alertas ou ter dificuldade em escolher os alimentos.

    "Se um alimento tiver um selo verde e outro vermelho, e outro alimento tiver dois amarelos, qual escolheria? Há uma capacidade de julgamento que não sabemos como visualizar", afirma. "Um refrigerante, por exemplo, levaria o vermelho em açúcares e verde em gordura. Mas a presença do verde pode minimizar o vermelho. A população pode acabar compreendendo de forma errada."

    Já a indústria afirma que o modelo de semáforo traria número maior de informações ao consumidor. "É um modelo que educa e dá informação ao consumidor. As cores falam por si", diz Alexandre Jobim, da Associação Brasileira da Indústria de Refrigerantes. Para ele, o modelo de advertência traz as mesmas informações, mas "quer ser muito mais uma contrapropaganda agressiva do que de fato uma educação e informação".

    Segundo a gerente geral de alimentos da Anvisa, Thalita Lima, apesar de já haver propostas na mesa, a agência ainda analisa a possibilidade de novos modelos, com base em exemplos de outros países.

    "Estamos partindo de um semáforo, que é um modelo de cores, e de um modelo de advertência. Mas há também alguns países que sinalizam positivamente os ingredientes que são bons, se tem muita fibra e proteína. Estamos avaliando se isso pode ser uma abordagem."

    Ainda não há prazo para a decisão. No último mês, a agência lançou edital para pesquisas que possam avaliar a compreensão da população aos modelos. A ideia é que os testes sejam realizados no próximo ano.

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