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    Copa do Mundo 2018

    Eliminação da Copa ameaça ascensão, mas também 'ensina' futebol aos EUA

    JERÉ LONGMAN
    DO "THE NEW YORK TIMES"

    11/10/2017 17h17

    Rebecca Blackwell/Associated Press
    United States' Christian Pulisic, right, is comforted by a member of the team staff after the U.S. lost to Trinidad and Tobago in their World Cup qualifying match, at Ato Boldon Stadium in Couva, Trinidad and Tobago, Tuesday, Oct. 10, 2017. (AP Photo/Rebecca Blackwell) ORG XMIT: MXRB103
    Grande esperança da seleção norte-americana, Christian Pulisic, 19, é consolado após dura derrota

    A exclusão dos Estados Unidos da Copa do Mundo da Rússia-2018, após derrota para Trinidad e Tobago pela última rodada das eliminatórias nesta terça (10), causou recriminações sérias no Twitter e análises sóbrias dos comentaristas da ESPN, mas não gerou indignação nacional ou desprezo pela seleção. O futebol não desperta emoções coletivas tão fortes no país.

    Quando o defensor Omar Gonzalez, que fez um gol contra, disse aos repórteres que "haviam decepcionado todo o país", seu desânimo era compreensível, mas o teor do comentário não parecia pertinente.

    No entanto, ficar fora da Copa do Mundo de 2018 pode ser sentido de maneira mais aguda –e representar um revés mais grave– nos Estados Unidos do que em outros países nos quais o futebol é o esporte mais popular, disse Andrei Markovits, professor na Universidade de Michigan e coautor de "Offside: Soccer and American Exceptionalism" ("Futebol e o Excepcionalismo Ameriano").

    A trajetória do futebol dos Estados Unidos se manteve ascendente por quase 25 anos. A seleção masculina foi a sete Copas consecutivas; a seleção feminina venceu três. As ligas profissionais do país encontraram estabilidade. O universo de interessados no esporte cresceu de 59 milhões a 79 milhões de adultos, entre 2010 e 2016, de acordo com um estudo citado pela revista "Sports Illustrated". Os adolescentes começaram a incluir o futebol em sua lista de esportes favoritos.

    Agora, a ascensão foi interrompida.

    Editoria de Arte/Folhapress
    Chamada classificados Copa 2018

    Ficar fora da Copa do Mundo, o maior evento do esporte internacional, representa "derrota, atraso e interrupção maiores" para os Estados Unidos, no que tange a construir o esporte, do que seria o caso em países nos quais o futebol é o esporte dominante, argumenta Markovits.

    Isso provavelmente não influenciará negativamente a candidatura conjunta dos Estados Unidos, México e Canadá a sediar a copa de 2026. E a MLS (Major League Soccer), ainda que as comparações não sejam precisas, está a caminho de continuar superando a NBA (basquete) e a NHL (hóquei sobre o gelo) em termos de média de público.

    Os admiradores mais engajados do futebol assistirão à Copa do Mundo da Rússia pela TV, no ano que vem. Mas a promoção do futebol nos Estados Unidos deve sofrer. Agora, parece menos provável que torcedores casuais decidam assistir a um jogo deste torneio. Mesmo que o façam, não encontrarão a mesma sensação de libertação e êxtase despertada pelo gol tardio de Landon Donovan contra a Argélia, na Copa de 2010.

    "Não quer dizer que o futebol vá voltar à idade das trevas, quando ele era apenas um esporte menor jogado só por imigrantes húngaros", disse Markovits. "Mas sua ascensão será retardada. Não há dúvida."

    No entanto, países com muito mais tradição no futebol que os Estados Unidos também ficarão de fora da Copa do Mundo de 2018, ou terão de encarar um par de nervosas partidas de repescagem para determinar se terão vaga.

    O Chile está fora. A Holanda, três vezes vice-campeã, também. A Itália, tetracampeã, terá de esperar o resultado de seus jogos de repescagem.

    Só o Brasil participou de todas as 20 Copas do Mundo disputadas desde que o torneio foi criado, em 1930 –a Alemanha também conquistou vaga no torneio nas 18 vezes que participou da classificatória.

    A arquitetura do futebol –seus placares baixos, a possibilidade de gols estranhos, a fase de classificação que determina a participação de um time em apenas 10 partidas– facilita resultados altamente aleatórios, que não costumam surgir no futebol americano, beisebol ou basquete, disse Stefan Szymanski, professor da Universidade de Michigan e autor de "Money and Soccer" ("Dinheiro e Futebol").

    Para Szymanski, não faz sentido dizer que ficar fora da Copa do Mundo "sinaliza que tudo está errado". "As derrotas "fazem parte da natureza do esporte", afirmou.

    De certa forma, em sua avaliação, os Estados Unidos estão enfim estão sentindo oficialmente o tormento do futebol internacional.

    "Ser torcedor de futebol é assim", disse Szymanski, que cresceu acompanhando os percalços do futebol inglês. "Há uma propensão a eventos extremos o tempo todo. Não há caminho sem obstáculos, a não ser para o Brasil e a Alemanha".

    Luis Acosta/AFP
    Trinidad and Tobago's Daneil Cyrus (L) and USA's Christian Pulisic vie during their 2018 World Cup qualifier football match in Couva, Trinidad and Tobago, on October 10, 2017. / AFP PHOTO / Luis ACOSTA
    Tobaguiano Daneil Cyrus (esq) e Christian Pulisic disputam bola em partida desta terça

    Mesmo assim, o Brasil, pentacampeão do mundo, sofreu uma humilhante derrota por 7 a 1 contra a Alemanha jogando em casa, na semifinal da Copa do Mundo de 2014.

    No final da noite de terça, surgiram apelos imediatos, ainda que não muito intensos, por uma mudança no futebol dos Estados Unidos. O técnico Bruce Arena não continuará por muito mais tempo sua segunda passagem pelo comando da seleção norte-americana. O time deve se rejuvenescer e ser construído em torno do excepcional futebolista Christian Pulisic, jovem meia-atacante do Borussia Dortmund, ainda adolescente, aos 19 anos. Talvez a decepção influencie a eleição para a presidência da Federação de Futebol dos Estados Unidos, em fevereiro, quando Sunil Gulati deve buscar um quarto mandato.

    Mas nunca é fácil mudar um processo de desenvolvimento. As pesquisas de Szymanski sobre seleções internacionais, com dados a partir de 1950, revelaram uma verdade incômoda: embora os países menos desenvolvidos no esporte estejam se aproximando dos mais desenvolvidos, as seleções que ocupam posição intermediária, como a dos Estados Unidos, enfrentam problemas em sua busca de um lugar no topo.

    Os norte-americanos continuam estagnados, em 28º lugar no ranking da Fifa, e jamais conseguiram ir além das oitavas de final de uma Copa desde que chegaram às quartas em 2002, e enquanto isso seleções de elite como as da Alemanha e Espanha encontraram novas formas de jogar.

    A Alemanha, que defenderá seu título no ano que vem, suplementou sua precisão com um ritmo de jogo mais rápido, tomado de empréstimo à Premier League inglesa. A Espanha, campeã em 2010, passou a combater o tamanho dos jogadores europeus por meio de um estilo elegante de passes e deslocamento, genericamente conhecido como tiki-taka.

    Desta forma, restará aos Estados Unidos, cronicamente incapazes de converter em gols as oportunidades claras que criam, tentar melhorar sua abordagem por meio de inovação, liberdade de expressão e abertura quanto a esquemas de jogos diferentes, disse Szymanski. "As seleções que dominam as Copas são as mesmas a cada edição", ele disse. "Isso é um problema para muitos países que, como os Estados Unidos, aspiram a um lugar nesse grupo de elite. É muito difícil chegar lá."

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