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    Após 43 anos, Belas Artes vai fechar as portas em São Paulo

    ANA PAULA SOUSA
    DE SÃO PAULO

    06/01/2011 07h26

    O Belas Artes, um dos mais antigos cinemas de São Paulo, se prepara para as últimas sessões. No dia 30 de dezembro, uma notificação judicial avisou: o imóvel, na esquina da avenida Paulista com a rua da Consolação, tem de ser entregue até fevereiro.

    Veja fotos do cinema ao longo dos anos

    Terminará, assim, uma história iniciada em 1967. Terminarão assim os "Noitões" que, nos últimos anos, chegaram a reunir, madrugada adentro, mil pessoas.

    A ameaça de fechamento do cinema veio a público em março de 2010, quando o HSBC pôs fim ao patrocínio. André Sturm, o proprietário, começou então a bater à porta de algumas empresas, atrás de nova parceria.

    Conversa daqui, conversa dali e, em novembro passado, foi acertado novo apoio. A minuta do contrato estava sendo finalizada quando veio a surpresa. "O proprietário disse que queria o imóvel de volta porque ia abrir uma loja lá", diz Sturm.

    Sturm conta que havia se comprometido a pagar um novo valor de aluguel, de R$ 65 mil, assim que fechasse o patrocínio. "Tínhamos um acordo, mas ele não cumpriu", diz o dono do cinema.

    Procurado, o proprietário do imóvel, Flávio Maluf (que não é filho de Paulo Maluf), não precisou sequer ouvir uma pergunta. A identificação da reportagem da Folha foi suficiente para que dissesse não ter nada a declarar.

    "Ligue para o meu advogado", recomendou. Enquanto ditava nome e telefone, interrompeu a fala e perguntou: "Mas é a respeito do quê?". Informado, ensaiou uma explicação: "Perderam o prazo... Não tenho nada a declarar". O advogado não retornou as ligações.

    Maluf passou a responder pelo imóvel há dois anos, quando seu pai morreu. "Venceu a visão mesquinha", diz Sturm.

    Ontem, os 32 funcionários receberam o aviso prévio.

    Rodrigo Capote/Folhapress
    Letreiro do Belas Artes diz 'desde 1952' e é um mistério até para André Sturm; "Quando assumi, estava lá", diz
    Letreiro do Belas Artes diz 'desde 1952' e é um mistério até para André Sturm; "Quando assumi, estava lá", diz

    ÚLTIMA FASE

    Sturm assumiu o cinema em 2002, quando os antigos proprietários decretaram o negócio inviável. O espaço, de fato, estava com as instalações decadentes e a programação descaracterizada.

    Vieram a seguir a sociedade com a O2, produtora do cineasta Fernando Meirelles e, em 2003, o apoio do HSBC.

    A ameaça do fim, em 2010, fez com que, no ano passado, a cidade se mobilizasse para salvar o Belas Artes. A campanha tanto deu resultado que o patrocínio chegou.

    Dentre as marcas que esta última fase deixará estão o "Noitão" e a longa permanência de alguns filmes.

    Pelo menos quatro títulos ficaram mais de um ano em cartaz: "O Filho da Noiva", "Bicicletas de Belleville", "2046 - os Segredos do Amor" e "Medos Privados em Lugares Públicos".

    Editoria de Arte/Folhapress
    Editoria de Arte/Folhapress

    CINEFILIA

    A tradição cinéfila do espaço firmou-se na década de 70. O cinema pertencia ao grupo francês Gaumont que, além de exibidor e distribuidor, era produtor de cineastas autorais, como Fellini e Antonioni.

    Na década de 80, foram muitos os cineastas brasileiros a escolher o Belas Artes como tela preferencial para suas estreias e foram muitos os espectadores a formar filas na Paulista, para conseguir um lugar nas sessões de "Daunbailó", de Jim Jarmusch, e "Terra dos Bravos", de Laurie Anderson.

    Para evitar que toda essa memória se esvaia do dia para a noite, Sturm fará, a partir do dia 14, duas retrospectivas. Uma trará clássicos do cinema. Outra, clássicos do Belas Artes. E não é só: "Meu compromisso é abrir outro cinema do mesmo tipo. Já tenho lugares em vista."

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    Ana Paula Sousa

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