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    Biografia detalha a participação de Mário de Andrade na Revolução de 1932

    FABIO VICTOR
    DE SÃO PAULO

    07/07/2012 03h02

    Referência na valorização da cultura nacional, o paulista Mário de Andrade teve também, como é conhecido, instantes de bairrismo com arroubos separatistas durante a Revolução Constitucionalista de 1932.

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    Agora, nos 80 anos do levante paulista contra a Revolução de 30, que se completam depois de amanhã, uma biografia do autor modernista nascido em 1893 e morto em 1945 agrega detalhes sobre sua participação efetiva no movimento.

    Durante as pesquisas para o livro, cuja primeira versão acaba de ser concluída, o jornalista Jason Tercio diz ter identificado texto escrito por Mário para o "Jornal das Trincheiras", órgão oficial dos revolucionários, distribuído no front e cujo redator-chefe era Guilherme de Almeida.

    Sabia-se que o escritor colaborara com o panfleto --criado pela Liga de Defesa Paulista, por orientação do Comando Supremo do Exército Constitucionalista--, mas, como os artigos não eram assinados, sempre houve dificuldade em identificar quem escrevera o quê.

    Reprodução
    O escritor Mário de Andrade
    O escritor Mário de Andrade

    Segundo Tercio, Mário escreveu na coluna "Notícias Militares", seção das mais lidas, "com notícias sobre batalhas nas principais frentes (Vale do Paraíba, fronteira de Minas e sul do Estado), informações sobre adesões, promoções de soldados e alistamento de voluntários".

    "Embora sem assinatura, pelo menos um texto dessa coluna pode ser atribuído a Mário, por um motivo simples: a grafia. Ele foi o único escritor brasileiro a escrever 'milhor', em vez de 'melhor'. E adotou essa grafia num texto publicado no nº 2 do boletim", escreve Tercio no capítulo "Inverno Sangrento", a que a reportagem teve acesso em primeira mão (leia trecho ao lado).

    Triunfalista, o texto reporta, sobre o dia 12 de agosto, que "milhora imediatamente a situação estratégica das nossas forças". Os paulistas se renderiam às tropas federais no início de outubro.

    SEPARATISMO

    Embora, em cartas a Drummond e a Paulo Duarte, Mário tenha escrito que "minha pátria é São Paulo" e "daria tudo pra São Paulo se separar do Brasil" ou que "somos diferentes mesmo", Tercio refuta que o autor tenha sido separatista.

    "Isso foi logo após a derrota na guerra civil, num estado emocional de frustração. Os separatistas eram minoria. Mário não embarcou nessa. Ao contrário, teve problemas com amigos intelectuais que propunham isso."

    Mário não pegou em armas. Contribuiu nos debates e na propaganda. "Sua participação foi motivada mais por influência de amigos e familiares do que por convicção. Foi uma típica ironia do destino, ele não se interessava por política e era um intransigente pacifista."

    Autor de uma elogiada biografia do jornalista e escritor José Carlos de Oliveira ("Órfão da Tempestade", Objetiva, esgotado) e de "Segredo de Estado" (pela mesma editora), sobre o desaparecimento de Rubens Paiva, Tercio negocia os direitos de publicação do livro, que planeja concluir no fim do ano.

    Ele recorreu principalmente a fontes documentais, bibliográficas, manuscritos, correspondência e iconografia. Consultou o acervo do autor no Instituto de Estudos Brasileiros da USP.
    Ele afirma ter conversado com o crítico Antonio Candido, que foi amigo de Mário, mas argumenta que o método de depoimentos orais é difícil, neste caso. "Praticamente todos [os conhecidos do autor] já morreram".

    Tercio pretende, com o livro, reparar o que define como "uma das maiores injustiças culturais existentes no Brasil", a do "silêncio biográfico" em torno de Mário.

    "Vou comentar a obra, mas sem analisar muito, porque já foi e continua sendo estudada por centenas de brilhantes teóricos de literatura. Meu objetivo é que ele seja mais lido pelo público comum, não apenas discutido pelos acadêmicos."

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