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    J. M. Coetzee lança o romance 'A Infância de Jesus' e vem ao Brasil para palestras

    CASSIANO ELEK MACHADO
    DE SÃO PAULO

    13/04/2013 03h02

    No mundo ideal do escritor J. M. Coetzee, a capa do livro viria em branco. Mais em branco do que o álbum branco dos Beatles: sem ilustrações, nome do autor, título.

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    "Gostaria que só depois da última página viesse o nome da obra", disse Coetzee, 73, com a voz mansa de quem se desculpa, num pequeno auditório universitário na África do Sul, antes de leitura de trechos de seu novo livro, no final do ano passado.

    Após o ponto final, o leitor encontraria, surpreso, o título "A Infância de Jesus", nome do romance em questão, que chega às livrarias brasileiras neste final de semana.

    Mauricio Dueas Castaeda/Efe
    O autor J. M. Coetzee, na semana passada, em Bogotá
    O autor J. M. Coetzee, na semana passada, em Bogotá

    Um dos principais autores contemporâneos, incontestável vencedor do Prêmio Nobel de Literatura (em 2003), o próprio Coetzee também aterrissa estes dias no Brasil.

    Vem ao país para duas conferências na semana que vem, em Curitiba e em Porto Alegre. Não falará sobre o novo livro (no mundo ideal de Coetzee, e neste caso também no real, escritores não falam sobre seus romances).

    O tema das duas palestras do sul-africano no Brasil será "censura".

    "Lerei um texto sobre as minhas recentes descobertas sobre como a censura funcionou na África do Sul", expressa ele à Folha, numa rara entrevista (por e-mail e com a condição de que não se tratasse do novo livro).

    Coetzee, que viveu muitos anos sob o regime do Apartheid, diz que trabalhar sob censura é como "ser íntimo de alguém que não lhe ama, com quem você não quer intimidade e que se insinua o tempo todo para você".

    Embora viva há mais de uma década na Austrália --onde, já declarou, quer passar o resto da vida--, parte importante de sua ficção é ambientada na África do Sul.

    É o caso de seus dois romances mais premiados, "Desonra" e "Vida e Época de Michael K", obras que fizeram dele o primeiro autor a ganhar duas vezes o importante Booker Prize.

    "A Infância de Jesus", que, como as obras anteriores, sai pela editora Companhia das Letras, vai para terrenos bem distintos.

    TRINDADE

    Situado na fictícia terra de Novilla, onde se fala espanhol, o livro é protagonizado por um curioso trio (homem, mulher e menino) que, ao sabor do acaso, tornam-se uma espécie de família.

    O centro desta "trindade" é claramente o garoto, como --para dissabor de Coetzee-- a capa do livro já indica.

    Este "evangelho segundo Coetzee" pouco tem a ver com outras reinterpretações ficcionais da vida de Cristo, como "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", de seu colega de Prêmio Nobel José Saramago.

    Num tom alegórico que, por sinal, faz lembrar outras obras do mesmo escritor português, Coetzee é muito pouco explícito, e faz alusões pontuais e cifradas a episódios bíblicos.

    O escritor sul-africano conhece bem a palavra. "Ainda que eu não seja frequentador de nenhuma igreja, estudei numa escola católica e sou familiarizado com a história e os ensinamentos da Igreja Católica", afirma à Folha.

    Sobre Cristo tratado como um personagem literário, Coetzee limita-se a dizer: "Jesus é uma figura importante. Se ele deve ser visto como uma figura histórica ou como um mito isso é assunto para uma longa discussão".

    E de que forma uma sociedade como a nossa trataria um novo profeta, tal como pistas muito esparsas dão a entender que seria o personagem mirim de seu romance?

    "Se uma figura comparável a Jesus nascesse numa sociedade de tradição cristã, eu acho que seria tratada com mais tolerância", escreve. "Se aparecesse num país como a Arábia Saudita, não tenho dúvidas de que seria uma história bem diferente."

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