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    Literatura juvenil ganha subdivisões e alimenta discussão sobre perfis dos leitores

    RAQUEL COZER
    COLUNISTA DA FOLHA

    14/12/2013 03h06

    A ambicionada fórmula da juventude ainda é um mistério. Enquanto ninguém dá um jeito nisso, o público adulto vem se permitindo estender o período de leitura de romances voltados a jovens.

    Exemplo disso está há meses nas listas de mais vendidos. Os romances do americano John Green, autor de "A Culpa É das Estrelas" (Intrínseca), que diz nunca ter pensado em escrever algo que não fosse para jovens, aparecem tanto nas listas juvenis quanto nas de ficção adulta.

    Segmento juvenil lidera crescimento nas vendas de livros em 2013

    A dupla aparição decorre do modo como as editoras nacionais publicam os livros de Green. A Intrínseca os considera próprios a todas as idades; já WMF Martins Fontes e Rocco catalogaram "Quem É Você, Alasca?" e "Deixe a Neve Cair", respectivamente, como infantojuvenis.

    Lydia Megumi/Editoria de Arte/Folhapress

    Mas, mais que isso, o fenômeno é sintomático de um segmento, o juvenil, que cresceu tanto nos últimos anos que mal cabe nos rótulos que o mercado tenta lhe pregar, como "young adult" e "new adult" (veja quadro acima).

    "As pessoas entram na adolescência mais cedo e demoram mais a sair. A área juvenil passou de grande a imensa", diz Vivian Wyler, diretora editorial da Rocco, casa que tem desde 2000 o selo Jovens Leitores e prepara agora um selo de "new adult".

    FAIXAS ETÁRIAS

    Para o mercado, o "infantojuvenil" engloba a faixa dos 8 aos 12 anos. Entra aí, por exemplo, "Diário de um Banana" (V&R), de Jeff Kinney.

    Em seguida vem o "young adult" (jovem adulto), para leitores de 13 a 18 anos, com obras como "As Vantagens de Ser Invisível" (Rocco), de Stephen Chbosky, sobre um adolescente descobrindo a vida.

    Essa faixa costuma atrair leitores já na faixa dos 40 anos --como mostra o sucesso do próprio "A Culpa É das Estrelas", livro sobre adolescentes num grupo de apoio a vítimas de câncer que passou todo o ano de 2013 na lista dos mais vendidos no Brasil.

    Em seguida vem o segmento mais controverso, o "new adult" (adulto novo), para leitores de 18 a 25 anos --muitos editores o veem como novo rótulo para velha fórmula.

    O diferencial aqui seria trazer personagens que estão entrando na faculdade e lidam com sexo e violência. Um exemplo é "Belo Desastre" (Verus), de Jamie McGuire, um "50 Tons" recatado.

    Jorge Oakim, editor da Intrínseca, prefere definir grande parte das obras para jovens e adultos como "crossover" (cruzamento). "Desde 'A Menina que Roubava Livros' [de Marcus Zusak, 2007] existe essa discussão. Ele saiu nos EUA como livro jovem, o que irritou o autor. É injusto classificá-lo assim, porque tem leitores de até 70 anos", diz.

    PRECURSOR

    O professor da Unesp João Luís Ceccantini, especialista em literatura infantojuvenil, afirma que, apesar de um precursor no século 18, "Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister", de Goethe (1749-1832), o gênero juvenil ganhou força nos anos 1950.

    Foi nessa época que saiu "O Apanhador no Campo de Centeio" (1951), de J.D. Salinger. O Brasil esperaria outros 20 anos por essa mudança -antes, passava-se dos infantis para os clássicos adultos.

    A persistência do leitor adulto no que se define como literatura juvenil é pouco estudada no país. Editores creditam o novo público à ascensão da classe C, mas o fenômeno ocorre no mundo todo.

    A referência incontornável é "Harry Potter", lançado nos anos 1990. "Surgiu com ele um leitor que se formou na literatura transmidiática, que chega aos cinemas e aos games", diz Ceccantini.

    Essa percepção leva ao entendimento de que houve certa infantilização do público. "Com 'Harry Potter', percebeu-se esse público que tem uma leitura mais simples, algo que lá fora chamam de 'leitor relutante'", diz Wyler.

    Ceccantini diz, no entanto, que "nunca se leu como hoje". "Um grande grupo que não tinha acesso ao mundo letrado ingressou nele, enquanto o pequeno grupo que consumia a chamada 'alta literatura' ainda faz isso", diz.

    Dias atrás, o americano Chuck Wendig, autor de juvenis, resumiu assim a questão no Twitter: "Talvez adultos leiam 'young adult' porque bons livros são bons livros e eles podem ler coisas que não podiam na adolescência porque elas não existiam."

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